Por Sérgio Ricardo

A Comissão Estadual de Controle Ambiental (CECA) foi notificada na tarde desta terça-feira  (19/10/2021) pelo Movimento Baía Viva para determinar a imediata proibição das operações SHIP TO SHIP no interior das baías de Sepetiba e da Ilha Grande, atividade de carga e descarga de óleo, combustíveis e produtos químicos no interior das baías o que é considerada extremamente perigosa e insegura e que já é proibida desde 2016, através da assinatura de um TAC-Termo de Ajustamento de Conduta Conduta nº 02/2016, datado de 08/04/2016 publicado pelo próprio Instituto Estadual do Ambiente (INEA), órgão da Secretaria de Estado do Ambiente Sustentabilidade (SEAS).

Confira o documento:

Ofício 051/2021

Rio de Janeiro, 19 de outubro de 2021.

À

CECA – Comissão Estadual de Controle Ambiental

Presidente da CECA – Maurício Couto Cesar Junior com solicitação que seja transmitida este Ofício aos Conselheiros que compõem o plenário da CECA.

Assunto: Proibição imediata das operações SHIP TO SHIP no interior das baías de Sepetiba e da Ilha Grande).

O MOVIMENTO BAÍA VIVA, coletivo socioambiental com mais de 20 anos de atuação na proteção e salvaguarda dos ecossistemas das baías, rios e lagoas fluminenses e pelo reconhecimento dos direitos dos povos e comunidades tradicionais, com CNPJ 41.931.182/0001-00, e sede no Rio de Janeiro;

Durante todo este tempo nunca vivenciamos um fato tão escandaloso.

O INEA-RJ, e a Secretaria Estadual de Meio Ambiente, exigiram, em 2016, a assinatura de um TAC-Termo de Ajustamento de Conduta Conduta nº 02/2016, datado de 08/04/2016 com a TRANSPETRO/PETROBRAS, devido a dois (2) sérios acidentes com derramamento de petróleo ocorrido no TEBIG em 2015. No TAC assinado, ficou expressamente proibida a prática de transferência de óleo entre embarcações (operações ship-to-ship) nas áreas situadas no interior das Baías de Sepetiba e da Ilha Grande.

Enviamos o TAC em anexo, para que o Presidente da CECA e seus conselheiros tenham conhecimento do mesmo.

O mais incrível é que o próprio INEA vem desrespeitando continuamente o TAC por ele determinado. Além de continuar permitindo as operações ship-to-ship no TEBIG, operado pela TRANSPETRO, que fica na Baía da Ilha Grande, o INEA aprovou uma averbação na LO (Licença de Operação) do Porto Sudeste, que fica na Baía de Sepetiba, para a ampliação de seu terminal para realizar operações ship-to-ship. Todas as licenças emitidas para o TEBIG e Porto Sudeste sem a devida exigência da apresentação de EIA-RIMA. Mais grave ainda que o INEA não é o órgão competente para emitir estas licenças, cuja competência é do IBAMA.

Entendemos que a CECA foi induzida e erro, pois o setor jurídico do INEA deveria informar aos conselheiros e existência do TAC firmado.

A PETROBRAS/TRANSPETRO VEM INUNDANDO A BAÍA DA ILHA GRANDE COM PETRÓLEO!!!! TODOS OS MESES TEM SIDO FEITO OPERAÇÕES SHIP-TO-SHIP NO TEBIG SUPERANDO 20.000.000 (20 MILHÕES) DE BARRIS/MÊS. ESSAS OPERAÇÕES NUNCA FIGURARAM NA LICENÇA ORIGINAL DO TEBIG!!!!

Tudo isso parece “fake news”, mas é fato real, como V.Sa. e demais conselheiros da CECA poderão averiguar pela leitura integral do TAC firmado em 2016, já as movimentações de petróleo no TEBIG podem ser facilmente apuradas nos registros do terminal. Enviamos cópia do TAC em anexo, para que o Presidente da CECA e seus conselheiros fiquem corretamente informados.

Todo acidente com derramamento com Petróleo do Mar traz grandes danos ao meio ambiente e impactos socioeconômicos. Se o acidente ocorrer em áreas marítimas dentro de baías, torna-se catastrófico. O dano é exponencialmente maior. Nas baías a renovação das águas é muito mais lenta, e abrigam os manguezais que são berçários da vida marinha. Derrame de petróleo em áreas de Baías Marinhas deve ser totalmente evitado. Os citados vazamentos ocorridos no TEBIG em 2015 também provocaram prejuízos econômicos às economias da pesca e do turismo dos municípios costeiros ou litorâneos: por ex., o 1º vazamento de óleo ocorrido na madrugada de 16/03/2015 atingiu uma área de 459 quilômetros, o que provocou grande impacto poluidor nas baías de Sepetiba e Ilha Grande com contaminação e praias, manguezais e de tradicionais territórios pesqueiros.

Não tem nenhuma lógica ambiental que se traga petróleo, produzido a quilômetros de distância, para ser transferido de um navio para outro dentro das Baías de Sepetiba e da Ilha Grande, ecossistemas e territórios protegidos pelas seguintes leis e normas ambientais e acordos internacional dos quais o Brasil é signatário:

– Artigo 225, §4º, ambos da CF de 1988, que considerada a Zona Costeira como Patrimônio Nacional;

– Constituição do Estado do Rio de Janeiro (1988), em seu Capítulo do Meio Ambiente, assegurou o status legal de proteção das baías fluminenses como Áreas de Preservação Permanente (APP) e como Áreas de Relevante Interesse Ecológico (ARIE).

– Violação dos princípios da Convenção 169 da OIT (Organização Internacional do Trabalho) que determina a obrigatoriedade de realização de Consulta Prévia, livre e informada da população tradicional, como os Pescadores Artesanais, e que este processo deve ocorrer de forma prévia ao licenciamento de grandes empreendimentos (como os industriais/petroleiros) como é o caso do TEBIG/TAAR, sendo que, na prática, este está ocorrendo sem qualquer publicidade e/ou transparência pública: portanto, está se dando de forma acelerada, às escondidas da sociedade e ao arrepio da Lei já que este fraudulento processo de licenciamento ambiental é de amplo desconhecimento das comunidades pesqueiras das baías de Sepetiba e da Ilha Grande, apesar de em caso de um desastre ambiental por vazamento de óleo no mar estes serem diretamente impactados/atingidos.

Em relação à violação de acordos e tratados dos quais o Brasil é signatário além de descumprir a OIT 169, afirma a Ação Civil Pública assinada por 8 (oito) Promotores/as de Justiça do Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro (MPRJ) e procuradores do Ministério Público Federal (MPF) que:

“Além disso, os danos ambientais apontados afetaram a baía de Ilha Grande, local que, recentemente, junto com Paraty, recebeu o título de Patrimônio Cultural e Natural Mundial da Unesco.”

Os licenciamentos fraudulentos dos citados empreendimentos encontram-se em completo desacordo e na contramão, mais uma vez, das agendas internacionais no âmbito da Organização das Nações Unidas (ONU) dos quais nosso país é signatário, tais como as metas de sustentabilidade ambiental previstas no Acordo de Paris no âmbito da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima (COP 21, 2015) e na Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar aprovada em dezembro de 1973, pela Resolução no. 3067 (XXVIII) da Assembleia Geral da ONU que foi ratificada pelo Brasil em dezembro de 1988.

A ACP Ambiental do MPRJ e MPF ressaltam que na Informação Técnica nº 14/2014, da Estação Ecológica de Tamoios (ESEC Tamoios), consta que: “as operações Ship-to-Ship no mar estão sendo executadas pela TRANSPETRO na Área de Influência da ESEC de Tamoios, inserida em sua Zona de Amortecimento, onde as atividades humanas estão sujeitas a normas e restrições especificas, com o propósito de minimizar os impactos negativos sobre a Unidade (Lei n° 9.985, de 18/07/2000)”55.”

(…)

“A Instrução Normativa nº 16/2013 proíbe, como regra geral, as operações ship to ship em áreas costeiras a menos de 50 km (cinquenta quilômetros) do litoral e áreas situadas a menos de 50 km (cinquenta quilômetros) de Unidades de Conservação marinhas (federais, estaduais ou municipais):

Art. 8º São consideradas Áreas de Restrição às operações STS:

I – Áreas costeiras a menos de 50 km do litoral;

II – Áreas a menos de 50 km de Unidades de Conservação marinhas (federais, estaduais ou municipais);

III – Áreas de Montes Submarinos em profundidades inferiores a 500 metros de lâmina d’água; Parágrafo único. Áreas que se enquadrem nos incisos I, II e III deste artigo poderão ser submetidas a análise do IBAMA mediante justificativa técnica, visando processo de autorização.

Verificou-se, no entanto, que desde 2009 as operações ship to ship ocorrem na Baía de Ilha Grande e têm licenças ambientais simplificadas emitidas pelo INEA, órgão ambiental estadual, conforme se vê, por exemplo, de matéria extraída da revista “ICMBio em foco”, edição 307, de 15 de agosto de 201453, o que já demonstra violação da normativa acima mencionada, levando-se em conta as distâncias das operações em relação ao litoral e à unidade de conservação federal ESEC Tamoios.

É de se questionar, portanto, os motivos que levaram o INEA a autorizar operações ship to ship em área a menos de 50km de unidade de conservação marinha, em violação à Instrução Normativa nº 16/2013 do IBAMA, optando por ignorar a proximidade com a Estação Ecológica de Tamoios, unidade de conservação federal de proteção integral.

A IN 16/2013 regulamenta os processos de licenciamento ambiental relacionados às manobras ship to ship. Ainda que não trate especificamente da operação de transbordo a contrabordo, há incidência da Instrução Normativa, por interpretação extensiva, também para esta atividade, que nada mais é do que uma espécie de ship to ship (double banking), não havendo fundamentos técnicos ou jurídicos para distinção das modalidades no que toca ao licenciamento da atividade.

Conforme Informação Técnica nº 014/2014, elaborada pela equipe técnica da ESEC Tamoios/ICMBio, as operações ship to ship autorizadas pelo INEA ocorreram em áreas consideradas de restrição às operações STS, de acordo com a Instrução Normativa IBAMA nº 16/2013, sendo imprescindível justificativa técnica para seu processo de autorização, o que não ocorreu.”

(…)

Conforme documentação da Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Desenvolvimento Urbano de Angra dos Reis, firmado pela bióloga Rita de Cassia S. de Souza, então Coordenadora do CEA:

Diante dos dados obtidos, ficou claro que as operações não têm sido licenciadas com o devido rigor exigido no rol de convenções internacionais e demais instrumentos normativos listados no item 3 do presente relatório. Ademais, vale ressaltar que todo o processo de licenciamento vem tendo como base apenas um processo de renovação de autorizações, desconsiderando possíveis mudanças operacionais das atividades, características do navio ou estabelecimento de limites para operações com base em um respaldo técnico, que considere o Princípio da Preservação do dano ambiental, ainda mais considerando a fragilidade dos ecossistemas da Baía da Ilha Grande.

Não é possível que os produtores de Petróleo, em especial a Petrobras, não disponham de tecnologia e outros locais de menor risco para realizar estas operações fora de qualquer baía.

Enfim, o Movimento Baía Viva apresentou denúncia sobre este fato aos Ministérios Públicos Federal e Estadual e as Defensoria Pública da União (DPU) e Defensoria Púbica estadual (DPRJ) e esperamos dos conselheiros da CECA que cumpram seus papéis de fiscais da lei, notadamente em relação à clara ocorrência de ilícitos claramente tipificados na Lei Federal no. 9605/1997 que trata dos Crimes Ambientais e na Lei Estadual no. 3467/2000 que “dispõe sobre as sanções administrativas derivadas de condutas lesivas ao meio ambiente no Estado do Rio de Janeiro”, bem como fortes indícios de Crime de Improbidade Administrativa (Lei Federal no. 8429/1992), exigindo a imediata suspensão das operações ship-to-ship nos interiores das Baías de Sepetiba e da Ilha Grande, exigindo que seja respeitado o TAC que foi definido pelo próprio INEA-RJ.

O mais grave é que a TRANSPETRO está solicitando ao INEA-RJ a ampliação do TEBIG para aumentar sua capacidade de realizar operações SHIP-TO-SHIP.

E NOVAMENTE FAZENDO PRESSÃO POLÍTICA PARA QUE O INEA APROVE ESTA AMPLIAÇÃO SEM EXIGIR QUE SEJA APRESENTADO O EIA-RIMA.

O INEA NÃO PODE AUTORIZAR A ATIVIDADE POIS NÃO É O ÓRGÃO AMBIENTAL COMPETENTE

O INEA não pode licenciar a ampliação da atividade Ship to Ship, pois não é órgão competente para tanto. Sequer o licenciamento do terminal como um todo pode seguir no âmbito do órgão ambiental estadual.

Veja-se que a questão da competência para fins de licenciamento já foi fixada há muito tempo e a sua inobservância é injustificável.

Explica-se. A Lei Complementar n. 140 de 2011 fixou as normas para cooperação entre a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, nas ações relacionadas à competência comum relativa à proteção do meio ambiente. Sobre a competência federal, a lei deixou em aberto a necessidade de regulamento das tipologias que, a partir do critério de porte, potencial polidor e natureza da atividade, seriam licenciadas pelo órgão ambiental federal.

Em 2015, o regulamento foi editado e previu estas tipologias. O Decreto 6.514/2008, assim, destacou que “serão licenciados pelo órgão ambiental federal competente os seguintes empreendimentos ou atividades: (…) V – terminais de uso privado e instalações portuárias que movimentem carga em volume superior a 15.000.000 ton/ano”.

O TEBIG extrapolou há muito essa capacidade. Somente em 2019, o terminal movimentou 51,90 milhões de toneladas (fonte: https://webportos.labtrans.ufsc.br/Tup/Index/37). A visualização da imagem abaixo ajuda a compreender o que a requerente quer dizer:

Descrição: Gráfico, Gráfico de linhas

Descrição gerada automaticamente

Por outro lado, o Decreto também regulamentou os casos de licenciamento ambiental iniciados antes da sua publicação. A disposição final previu que:

Art. 4 º Os processos de licenciamento e autorização ambiental das atividades e empreendimentos de que trata o art. 3 º iniciados em data anterior à publicação deste Decreto terão sua tramitação mantida perante os órgãos originários até o término da vigência da licença de operação, cuja renovação caberá ao ente federativo competente, nos termos deste Decreto.

Em consulta ao sistema do INEA, percebe-se que os pedidos de renovação da licença de operação do terminal continuam sendo analisados pelo órgão ambiental estadual, em séria afronta ao texto do decreto federal (vide movimentação do processo n. E-07/002.5410/2014, com parecer favorável à renovação da LO datado de 02/07/2020).

Sequer esse pedido poderia ter sido analisado pelo INEA, cuja competência foi esgotada a partir do marco temporal previsto pela normativa federal. A ampliação pretendida pela Transpetro não pode seguir o mesmo caminho.

O procedimento deve, portanto, ser analisado pelo IBAMA – órgão ambiental competente para o licenciamento ambiental do terminal. Qualquer ato emitido pelo INEA em inobservância à normativa federal será nulo e a operação do terminal deverá ser considerada como ilegal.

Fazemos um apelo aos técnicos do INEA-RJ e servidores públicos concursados pra servir ao interesse público e coletivo, que tem plena consciência dos danos e riscos destas operações de ship-to-ship no interior das Baías de Sepetiba e da Ilha Grande, que não aceitem as pressões políticas para darem pareceres contra a legislação, pois os políticos passam e vocês técnicos é que serão criminalmente responsabilizados por seus atos, nas pessoas físicas. Fica aqui a recomendação que atuem dentro dos preceitos legais para evitarem problemas futuros em suas pessoas físicas por violação dos preceitos da CF 1988 e dos princípios da Precaução e da Prevenção que são os pilares do Direito Ambiental brasileiro e internacional.

Fazemos um apelo em especial ao Presidente da CECA e aos seus conselheiros que compõem o plenário, que não se sujeitem a pressões políticas, arriscando suas reputações e pessoalmente pois agora estando bem informados, a responsabilidade será de cada um de vocês.

DO PEDIDO

Por todo o exposto, o MOVIMENTO BAÍA VIVA, requer ao Conselho Diretor da CECA em face de todos os fundamentos trazidos pela requerente, que seja declarada a NULIDADE das licenças ambientais e das averbações de licença que visem autorizar ilegalmente a continuidade das perigosas e inseguras operações SHIP TO SHIP no interior das baías de Sepetiba e da Ilha Grande ou quaisquer pedido de ampliação de suas instalações para este fim de responsabilidade das empresas TRANSPETRO (TAAR/TEBIG) e PORTO SUDESTE do Brasil S.A.

Contando com a Vossa pronta atuação com a urgência que o assunto requer, renovam-se os votos de estima e consideração.

Atenciosamente,

Pede Deferimento,

MOVIMENTO BAÍA VIVA

SÉRGIO RICARDO VERDE – Ecologista, membro fundador do movimento BAÍA VIVA; Gestor e planejador ambiental, produtor cultural, engajado nas causas ecológicas e sociais, colunista do jornal Tribuna da Imprensa Livre; Membro do Conselho Estadual de Direitos Indígenas (CEDIND-RJ) pela organização GRUMIN presidida pela escritora Eliane Potiguara e mestrando do Programa de Pós-Graduação em Práticas em Desenvolvimento Sustentável (PPGPDS) da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ). www.baiaviva.com


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