Por Pedro do Coutto –
Pesquisa do Ipec, O Globo de ontem, domingo, focalizada em reportagem de Nicolas Iori e Bianca Gomes, revela que 41% da população do país situam o governo Lula na escala de bom e ótimo, enquanto 24% o colocam no plano inverso, ruim ou péssimo. Uma parcela expressiva de 30% classifica a gestão atual como regular, o que significa uma indiferença nítida e também uma falta de vontade de firmar um posicionamento.
A pesquisa destaca outros detalhes do panorama atual, mas na minha opinião o confronto entre o positivo e o negativo é essencial para sentir o pulso da opinião pública. Aliás, como a própria matéria classifica a percepção dos resultados. Não importa que nos mandatos que exerceu anteriormente, o primeiro e o segundo, a avaliação de Lula tenha sido melhor do que a atual no início de seus governos.
CONCENTRAÇÃO DE RENDA – O importante é traduzir o que os números estão refletidos na realidade de hoje, inclusive porque os problemas são outros, a exemplo da concentração de renda que cresceu muito no país. A prova disso é a maior inadimplência que se registra no Minha Casa, Minha Vida. O fato predominante, que inclui a governabilidade, é que a opinião pública sobre Lula é mais positiva.
É preciso também se levar em conta que a polarização dele contra Bolsonaro, como aconteceu nas urnas de 2022, poderia conter um reflexo da invasão e das depredações de Brasília. Principalmente porque, como outra parte da pesquisa assinala, há um temor ao comunismo, o temor tem que se estender à tentativa de subversão em larga escala que culminou com o fato assinalado pela invasão de Brasília e as depredações contra o patrimônio público.
A sociedade brasileira fica com um pé atrás diante das polarizações intensas, pois sempre acarretam graves problemas, como o resultado do Ipec deixa claro. Enquanto isso, na Folha de S. Paulo, também na edição de domingo, o senador Hamilton Mourão, ex-vice-presidente da República, numa entrevista à Thaísa Oliveira e Cézar Feitosa, assumiu uma ofensiva contra o governo Lula ao dizer que o atual presidente deseja transformar o militar num cidadão de segunda categoria.
POSICIONAMENTO – Como é evidente, não existe qualquer propósito nesse sentido. Mas, Mourão utilizou o tema para claramente assumir uma posição de destaque nas correntes oposicionistas que ficaram sem a liderança de Bolsonaro, também em consequência da questão aberta pelas jóias presenteadas pela Arábia Saudita.
Tenho a impressão que, sentido um vazio progressivo nas áreas bolsonaristas, o senador eleito pelo Rio Grande do Sul partiu para tentar ocupá-las e com isso se colocar num plano de destaque para uma possível candidatura à Presidência da República em 2026. A entrevista é longa, e Mourão com ela dá o primeiro passo num projeto que lhe veio à mente e que até significa uma consequência natural do quadro político brasileiro.
COMUNISMO – Além do radicalismo político, a extrema-direita do país costuma usar – isso ocorre há muitos anos – o fantasma do comunismo como uma ameaça ao Brasil. A tática dá certo numa escala bem sensível. Tanto assim que a pesquisa do Ipec nesta parte comentada por Nicolas Iori e Bianca Gomes assinala 44% da opinião pública brasileira se preocupa com uma onda comunista no país, apesar de a União Soviética ter se desmantelado em 1999 e, portanto, afastando-se do internacionalismo do qual se alimentava, usando como instrumento de motivação a luta de classes.
Na realidade, a concentração de renda é uma coisa e a luta de classes é outra. Lutar pela desconcentração tornou-se, principalmente no século XXI, como uma consequência natural do pensamento amadurecido pela realidade. Inclusive, as elites que comandam a China e a Rússia estão repletas de capitalistas que adquirem obras famosas por cifras milionárias que passam de US$ 100 milhões.
Na minha opinião, o comunismo preocupa não pelo sentido de atentado à propriedade, mas como sinônimo de um processo que pode se tornar violento. A linguagem da direita, entretanto, colide com a verdade da política brasileira. É que a violência foi marcada pela invasão de Brasília por extremistas da direita contando com a omissão de setores da Segurança. Dizer que o comunismo é uma ameaça de violência desfaz-se como uma nuvem diante da verdade em que se percebe que a violência desencadeada no país foi desencadeada pela extrema-direita.
INADIMPLÊNCIA – Lucas Marchesini em matéria publicada na Folha de S. Paulo de ontem, destaca que a inadimplência no programa de habitação popular atingiu 45% no exercício de 2022, o mais alto índice de uma série que começou a ser medida em 2013. O programa, como era previsto, sofre oscilações negativas pelo fato de os salários perderem sempre a corrida contra a inflação, o que deixa os incluídos no programa sem condições de cumprirem os seus compromissos.
Quarenta e cinco por cento dos beneficiados pelo programa encontram-se com as prestações atrasadas há 12 meses. A professora Cristiane Guinancio da Unb sustenta que o que está acontecendo com o benefício é reflexo da perda do trabalho e renda. Numa situação de emergência, as pessoas não vão deixar de comer, mas vão deixar de pagar as prestações. Portanto, como sempre acentuo, o problema está na renda do trabalho.
PEDRO DO COUTTO é jornalista.
Enviado por André Cardoso – Rio de Janeiro (RJ). Envie seu texto para mazola@tribunadaimprensalivre.com ou siro.darlan@tribunadaimprensalivre.com
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