Por Pedro Augusto Pinho –
Já houve um tempo em que o curral ao invés de feitor tinha presidente. Você nem acredita, mas eu provo.
Este imenso, rico e bonito curral é habitado por seres muito estranhos. Não se prezam, têm o menor amor-próprio, a mais baixa autoestima do universo. E acreditam, como as crianças na primeira infância, em bruxas malvadas e fadas madrinhas.
A chave do portão de acesso ao curral tem nome; é chamada consenso de washington. Ela impõe baboseiras do tipo: controlar qualquer despesa exceto financeira, que tem pagamento privilegiado, a isso se denomina: disciplina fiscal. A questão dos nomes é outra das características estranhas do curral.
Alguns intelectuais, pessoas sem moral e dignidade, que “nada produzem e fumam maconha” (!), dizem que no curral se fala ao modo barroco, muitas palavras para pouco significado. Mas estes seres são estranhos e não se deve levá-los em consideração.
Outra imposição para usar a chave é manter o curral permanentemente aberto para entrada e saída de estrangeiros, mas impor restrição para circulação dos índios que lá residem.
Estes índios constituem um caso muito especial. Não se conformam em serem os nativos de um verdadeiro paraíso terrestre, onde em se plantando tudo dá, onde há água doce em abundância, o clima é gentil e o sol brilha o ano inteiro. Por isso usam roupas inadequadas, têm costumes opostos aos que estariam em conformidade com suas necessidades e com os inúmeros recursos existentes no curral.
Vejamos um fenômeno recente, que está ocorrendo há seis anos.
Alguns já descobriram que existem dois pilares de sustentação de qualquer sociedade: a produção de alimentos e a geração de energia. Fora do curral, a avaliação das sociedades se dá pelo consumo de energia por pessoa; quanto mais energia é consumida, mais avançada é a sociedade. Mas há muitos índios que pensam que isso é coisa de comunista.
O que é coisa de comunista não é bem entendido no curral, porque ora diz respeito à família, mesmo quando a pessoa tem várias e não cuida de nenhuma, basta ser rico ou muito pobre, isso é estranho, não é mesmo?
Também comunista é quem acha que é mais importante cuidar da saúde da indiada do que pagar altos juros pela liberalização do setor financeiro ou para incentivar a exploração ou expropriação do curral por quem nem mora nele.
Voltando à energia, o curral também é riquíssimo. Tem energia de origem fóssil, petróleo e gás, que dá para consumir por um século, tem rios que podem produzir energia por toda vida, tem vegetais que produzem energia da biomassa, tem ventos e sol cuja energia é mais cara, mas está disponível 365 dias por ano, o que não acontece em quase nenhum lugar fora do curral.
E apesar de ter toda essa energia dentro do curral e, o que é muitíssimo importante, ter total conhecimento para produzi-la, os índios compram fora do curral a preços caríssimos, porque a chave ordena a liberalização comercial. E quem for contra, já sabe, é comunista.
Mas nem sempre isso foi assim. Já houve um tempo em que o curral ao invés de feitor tinha presidente. Você nem acredita, mas eu provo.
Foi quando um cientista e político chamado José Bonifácio de Andrada e Silva elaborou um projeto para o curral. Mas antes que pudesse colocar em prática, foi preso e exilado. Morreu pobre e esquecido.
Foi também quando um homem baixinho e gordo, com sorriso simpático, conseguiu ser presidente do curral e teve a aprovação e admiração dos índios e até de estrangeiros que souberam o que ele fazia, procurando imitá-lo. Mas os invejosos do êxito dos índios trataram de afastar este presidente que de tristeza foi levado ao suicídio.
Mais recentemente, no fim do século passado, foi elaborada a lei que orientaria a vida no curral, protegendo os aqui nascidos, defendendo a prioridade dos nacionais para o trabalho e para gozar dos benefícios das riquezas existentes. Nem se passaram 10 anos e o feitor em exercício revogou estes direitos, pelo que o linguajar barroco denominou Emendas Constitucionais. Elas foram cinco em 1995, uma em 1996, duas em 1998, uma em 1999 e em 2002. E ainda não pararam de acontecer.
E agora, quando um novo feitor deve ser escolhido, como está o curral? Vai manter a energia com preço do exterior, de importada, mesmo quando produzida no curral? E as empresas que cuidam da energia serão todas transferidas para a propriedade de estrangeiros, como já se está fazendo? Ficará o curral ainda mais pobre, mais doente, mais ignorante do que antes daquela lei de 1988?
Quem se atreve a restabelecê-la? Estes índios tão bobos que acham o máximo se vestir com casacas?
Observação à indiada. O Brasil teve um compositor genial, que provocou admiração e inveja em todo mundo, chamava Heitor Villa-Lobos. Para minimizar sua importância na história da música erudita, foi-lhe atribuída a pecha, a extravagância de ser um índio de casaca. Razão da nomenclatura aqui usada. Como um intelectual lusitano, pois lá também há comunistas, afirmou com sua arrogante firmeza:
“Um homem só deve falar, com impecável segurança e pureza, a língua da sua terra: todas as outras as deve falar mal, orgulhosamente mal, com aquele acento chato e falso que denuncia logo o estrangeiro” (Eça de Queiroz, falecido a 16 de agosto de 1900).
PEDRO AUGUSTO PINHO é presidente da Associação dos Engenheiros da Petrobras (AEPET), avô e administrador aposentado, com 25 anos de trabalho na Petrobrás. Um cidadão nacionalista e patriota, diplomado e ex-professor na Escola Superior de Guerra.
Envie seu texto para mazola@tribunadaimprensalivre.com ou siro.darlan@tribunadaimprensalivre.com
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