Por Lincoln Penna

Chego, piso em terras e logo o tédio do mundo se põe a nublar-me. Encontro o Brasil desvairado, sem sentido, num tumulto que não entendo. Que tristeza, ter pátria! E eu que, malgrado todos os intuitos estoicos, tinha chegado a sentir uma ternura saudosa por esta terra. (Cecília Meireles)

O dia 6 de junho de 1944 ficou conhecido como o Dia D. Foi neste dia que houve o desembarque das tropas Aliadas na Normandia (França), operação das mais importantes senão decisiva durante o final da Segunda Grande Guerra Mundial. Começava na parte ocidental europeia a derrota da Alemanha nazista, finalmente consumada pelos soviéticos com a ocupação de Berlim.

No Brasil nós podemos identificar datas importantes no curso de nossa história, mas para as gerações que irão as urnas no dia 30 de outubro deste ano de 2022, não há data mais significativa do que esta. Sem menosprezar tantas outras desde a implantação do regime republicano que alteraram os rumos do país, a data do segundo turno das eleições presidenciais deste ano tem um significado que extrapola todas as outras possíveis referências, isto porque está em jogo muito mais do que uma simples escolha entre as candidaturas que disputam a presidência.

Para não me estender demasiadamente prefiro listar alguns argumentos que fortalecem essa convicção expressa nessas linhas. Senão vejamos:

1. A questão da soberania nacional e popular da nação brasileira está em jogo. Ou bem ela se afirma ou será objeto da eterna subserviência, uma vez que a Independência alcançada em 1822 resultou mais na autonomia do que em um efetivo rompimento com a metrópole, e a nossa República fundada em 1889 ainda não se consolidou como esperávamos, se quisermos colocar em prática o ideário de um regime da coisa pública;

2. As Políticas Públicas podem ser reestruturadas e ampliadas de acordo com as velhas e novas necessidades do povo brasileiro ou poderão simplesmente desaparecer por conta do total desprezo hoje em dia representado pelo atual presidente; razão pela qual é indispensável que o voto seja acompanhado de um mínimo de consciência cidadã, sem a qual poderá configurar um desvio de objetivo para quem espera a resolução de seus interesses individuais e coletivos;

3. A defesa dos povos originários é outra questão a merecer ampla divulgação junto às consciências do eleitor, porquanto ou adotamos uma firme disposição de preservarmos a vida, a cultura e as terras das inúmeras comunidades indígenas ou podem nossos irmãos desaparecer diante de um processo de verdadeiro extermínio das nações que resistiram e resistem aos predadores de ontem e de hoje;

4. A Educação, a Cultura, e a Ciência são áreas que se encontram atualmente sob um processo de abandono sistemático fruto de uma visão ideologicamente arraigada na convicção de que são atividades que abrigam esquerdistas. Essa política devastadora e regressista impõe que nos unamos para retomar a expansão e o apoio a essas indispensáveis chaves para o nosso desenvolvimento autônomo. Ou bem seguimos o desastroso caminho da dependência e da subordinação aos mais variados preconceitos, ou trilhamos a rota da esperança e da reconstrução junto com o nosso povo sedento de justiça e de acesso aos bens da civilização até aqui sonegados;

5. A Política Externa que o governo Bolsonaro fez retroceder aos tempos mais obscuros de uma dependência neocolonial precisa ser retomada na perspectiva de uma ação coordenada ao nível internacional e a partir do entendimento que priorize o multilateralismo sem o qual estaremos permanentemente submetidos a influências de estados que se apresentam como modelos a serem seguidos. Torna-se imprescindível reatarmos os compromissos com os nossos parceiros e coirmãos da América Latina, da qual somos parte e temos um destino comum;

6. Os valores civilizatórios. Dentre eles a democracia como o acatamento e respeito à diversidade, ao contraditório, e à busca de uma disputa que eleve o nível de compreensão do próprio regime republicano, cuja essência está assentada no interesse da coisa pública, devidamente partilhada por todos sem exceção. O candidato Bolsonaro despreza os que não se identificam com ele e costuma ofender os que optam por outros caminhos que não os dele. Agride e assume atitudes de tirano na contramão dos preceitos mínimos de uma ordenação democrática.

7. Pela democracia do Poder Popular, eis a consigna que deve orientar o sentido de nosso regime democrático, pois ele só acontecerá se o povo estiver no exercício pleno de seus direitos e deveres de cidadão. Por sinal, a nossa Constituição, alvo de ataques bolsonaristas, deixa clara no Artigo 1º Dos Princípios Fundamentais e em seu parágrafo único, que se “todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição”.

8. Se Bolsonaro venera tanto a bandeira nacional republicana, mesmo que nela tenha sido retirada a expressão Amor por princípio do lema clássico do Positivismo, pelo menos que entenda que a Ordem por meio e o Progresso por fim, significam a capacidade de um povo integrar-se em um sentido de pertencimento comum junto a todos os seus concidadãos, única maneira para que todos possam atingir a plenitude do bem comum, para a qual clamavam os fundadores da República. Cultivar as diferenças de todo tipo e lutar tenazmente contra as desigualdades sociais

Esta deve ser a trajetória a ser percorrida por quem deseja uma nação próspera e feliz.

LINCOLN DE ABREU PENNA – Doutor em História Social pela Universidade de São Paulo (USP); Conferencista Honorário do Real Gabinete Português de Leitura; Professor Aposentado da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ); Presidente do Movimento em Defesa da Economia Nacional (MODECON);  Vice-presidente do IBEP (Instituto Brasileiro de Estudos Políticos); Colunista e Membro do Conselho Consultivo do jornal Tribuna da Imprensa Livre.

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