Redação

A Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) publica seu relatório sobre a situação dos direitos humanos no Brasil e destaca os impactos dos processos históricos de discriminação e desigualdade estrutural no país. CIDH é um órgão principal e autônomo da Organização dos Estados Americanos (OEA).

 A Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) publica o seu relatório sobre Brasil, por meio do qual faz um abrangente diagnóstico  sobre a situação dos direitos humanos no país até dezembro de 2019. O Relatório utilizou a abundante informação recebida durante e após a visita de 5 a 12 de novembro de 2018, bem como aquela recebida em audiências públicas de país e temáticas, entre outras fontes.

Em sua análise, a Comissão observa que, apesar de possuir um Estado de Direito e sistema e instituições democráticas na área de direitos humanos, o Brasil enfrenta desafios estruturais para superar aspectos relacionados à discriminação historicamente negligenciada, que impacta de forma exacerbada grupos específicos como pessoas afrodescendentes, mulheres, comunidades quilombolas, povos indígenas, camponeses e trabalhadores rurais, moradores de rua e moradores de favelas ou periferias.

A CIDH confirma em seu relatório que a discriminação estrutural está intrinsecamente ligada à exclusão social e ao acesso à terra, gerando ciclos de desigualdade e pobreza extrema. Esses ciclos expõem as pessoas em situação de vulnerabilidade à violência perpetrada por organizações criminosas como milícias e grupos de narcotraficantes, bem como aquelas dedicadas ao tráfico de pessoas e outras formas modernas de escravidão.

Da mesma forma, a Comissão considera que esses desafios também têm um impacto negativo na segurança dos cidadãos. Apesar da extrema desigualdade que leva ao aumento da violência a que estão expostas as pessoas em situação de vulnerabilidade, a CIDH nota que o Estado ha optado por formular e implementar políticas de segurança que se baseiam na ação institucional violenta e punitiva da polícia militarizada, resultando em graves violações aos direitos humanos. No relatório, a Comissão também analisa o papel dos órgãos judiciais no que diz respeito ao quadro de impunidade que caracteriza tal violência institucional.

Para a CIDH, as políticas de segurança usam práticas de perfilamento racial que colocam as pessoas afrodescendentes e residentes de bairros periféricos em maior risco de serem detidas e sofrerem tratamentos arbitrários por agentes policiais. Tal política possui  particular reflexo nos espaços de privação de liberdade, que muitas vezes estão superlotados e acabam se tornando ambientes institucionais tolerantes à tortura e a outros tratamentos cruéis, desumanos e degradantes. É o caso de presídios, unidades socioeducativas e comunidades terapêuticas.

A Comissão toma nota do alto nível de impunidade nos casos de violência institucional, os quais, em sua maioria, não têm proporcionado avanços nas investigações, condenações e reparações das vítimas por parte do sistema de justiça. Apesar de suas diferenças, o estado de impunidade que cerca os atuais casos de violência institucional pode ser comparado ao que se observa em relação aos crimes ocorridos durante o período da ditadura cívico-militar no Brasil. A esse respeito, a CIDH reconhece o progresso alcançado pelas diferentes comissões da verdade em nível estadual e federal em relação aos casos de tortura e desaparecimentos forçados. No entanto, sublinha que, na sua maioria, esses crimes permanecem impunes.

A CIDH também observa o aumento das ameaças contra a vida de jornalistas e comunicadores por parte das autoridades, situação que se agravou após as eleições nacionais de 2018. Esse fenômeno também afetou pessoas de orientação sexual, identidade e/ou expressão de gênero diversas, bem como características sexuais distintas, que sofreram com o aumento dos crimes de ódio.

No âmbito institucional, a Comissão realiza um diagnóstico de diversos avanços no sentido de respeitar e garantir os direitos humanos no país, como a instalação de mecanismos de prevenção da tortura e o fortalecimento de promotores e instituições nacionais de direitos humanos. Da mesma forma, toma nota com satisfação de importantes políticas públicas que buscam reduzir a desigualdade estrutural e avançar no combate ao racismo e à discriminação histórica, como os programas de transferência de renda e acesso à moradia e à terra, bem como as políticas destinadas ao acesso ao sistema de ensino universitário por pessoas afrodescendentes e indígenas.

A Comissão Interamericana finaliza o relatório formulando diversas recomendações para consolidar um sistema de promoção e proteção dos direitos humanos, de acordo com os compromissos assumidos pelo Estado nos âmbitos interamericano e internacional. No entanto, também faz um alerta ao Brasil sobre ações que tendem a fragilizar e até extinguir esse sistema, como o enfraquecimento dos espaços de participação democrática.

Finalmente, a CIDH agradece ao Estado todas as informações prestadas durante e após a visita; às organizações da sociedade civil e outros atores relevantes por todas as informações fornecidas; e, em particular, às vítimas e familiares que compareceram perante à Comissão Interamericana para prestar seus testemunhos.

A CIDH é um órgão principal e autônomo da Organização dos Estados Americanos (OEA), cujo mandato decorre da Carta da OEA e da Convenção Americana sobre Direitos Humanos. A Comissão Interamericana tem o mandato de promover a observância dos direitos humanos na região e de atuar como órgão consultivo da OEA nesta matéria. A CIDH é composta por sete membros independentes eleitos pela Assembléia Geral da OEA a título pessoal, e não representam seus países de origem ou residência.


Fonte: OEA