Redação

O ministro Sérgio Moro (Justiça e Segurança Pública) disse nesta segunda, dia 14, que não teme a anulação em série de julgamentos e condenações na Operação Lava Jato. Na próxima quinta-feira, dia 17, o Supremo Tribunal Federal coloca em pauta três ações que questionam a prisão em segunda instância. Em entrevista ao Estado, Moro disse que ‘respeita’ qualquer decisão que o Supremo tomar, mas defendeu enfaticamente a jurisprudência da própria Corte que, em julgamento de casos anteriores, decidiu que condenado em segundo grau judicial já pode ser aprisionado – caso do ex-presidente Lula.

Moro rebateu a ofensiva de adversários que lhe atribuem parcialidade na Lava Jato. Rechaçou a afirmação de que atuou como uma espécie de coaching (treinador) da acusação e reagiu à recorrente queixa de advogados sobre supostos abusos que teriam ocorrido sob sua tutela nos processos de corrupção e lavagem de dinheiro no esquema instalado na Petrobrás entre 2004 e 2014.

O Supremo marcou para quinta-feira, 17, o julgamento das ações sobre prisão em 2ª instância. O senhor está preocupado com isso?
Qualquer decisão do Supremo tem que ser respeitada. A instituição tem que ser respeitada. Foi um grande avanço institucional os precedentes do Supremo desde 2016 na lavra do ministro Teori Zavascki (primeiro relator da Lava Jato, morto em acidente aéreo) admitindo execução em 2.ª instância. Afinal de contas o processo tem que ter começo, meio e fim. Minha posição é favorável à atual jurisprudência. Vamos esperar para ver o que o Supremo vai decidir.

O senhor teme que possa haver anulações em série de julgamentos e condenações da Lava Jato?
Não vejo isso no horizonte. Não vejo a possibilidade de isso acontecer, anulações….

As alegações de quebra de imparcialidade de sua parte não podem levar a essa consequência?
Existe uma invasão criminosa de aparelhos celulares dos procuradores (da força-tarefa da Lava Jato), supostas mensagens cuja autenticidade não foi verificada. Tirando todo o sensacionalismo, no que eu vejo que foi divulgado não existe nada que justifique a afirmação de afetação da imparcialidade da minha parte. O que existe é uma grande distorção do conteúdo dessas supostas mensagens e na divulgação delas com absoluto sensacionalismo.

Como o senhor avaliou a decisão do ex-presidente Lula de rejeitar a progressão de pena e o regime semi aberto por se dizer um preso politico?
 Todos os julgamentos da Operação Lava Jato que eu proferi foram objeto de recursos julgados pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região. Grande parte foi julgada pelo Superior Tribunal de Justiça. Todos os julgamentos foram baseados em provas e evidências. Esse álibi que havia perseguição política é muito comum e foi usado por vários, inclusive pelo Eduardo Cunha (ex-presidente da Câmara). O ex-presidente faz parte do meu passado. O que existe são condenações em mais de uma instância. O foco no meu trabalho é uma forma de distorcer o que já aconteceu. O julgamento do TRF-4 substituiu o meu. O julgamento do STJ substituiu o da 2ª Instância. É puro diversionismo focar na minha atuação.

Qual a sua expectativa sobre a votação do pacote anti-crime no Congresso?
 Temos que discutir juntamente com o Congresso e vencer eventuais resistências. Faz parte da democracia buscar o diálogo.

O ministro Gilmar Mendes disse que o senhor atuou como uma espécie de coaching da acusação na Lava Jato…
Não existe nada disso. Não existe nenhuma daquelas supostas mensagens que autorize essa interpretação. O que existe é uma grande distorção. Consta lá uma suposta mensagem em que eu teria criticado a performance de uma procuradora. Não tenho mais essas mensagens. Pode ser que eventualmente isso tenha acontecido. Mas depois já se afirma algo que não existe, nem sequer nas mensagens, que eu teria um envolvimento na escalação dos procuradores para as audiências. Isso é totalmente falso e não amparado sequer pelo texto que foi divulgado. O que existe é uma distorção.

O Lula pode ser solto? O que nós temos que nos preocupar, na verdade, é que o Brasil passou, desde a época da Ação Penal 470, depois da Operação Lava Jato, por um avanço institucional muito significativo em relação ao enfrentamento da grande corrupção. Pessoas poderosas cometiam crimes e nunca eram responsabilizadas por esse tipo de delito. O Brasil avançou muito e até exportou não só provas relativas a crimes de corrupção como esse modelo, que foi admirado por países vizinhos e distantes. O enfrentamento da corrupção fortalece a economia. A corrupção é disfuncional para economia porque gera distorções na alocação de recursos. Uma democracia menos corrupta é uma democracia de maior qualidade. Isso é uma tarefa de todos.

A OAB e outras entidades se mobilizam em defesa da Lei de Abuso de Autoridade e dizem que há cerceamento do direito de defesa. Como o senhor recebe essas críticas?
O que existe é muita retórica. Falam em excessos da operação Lava Jato. Quais foram os excessos? Quem foi acusado injustamente? A mesma coisa é essa questão dos abusos contra o direito de defesa. Quais foram esses abusos? Quais foram os advogados que tiveram seu trabalho cerceado? Temos que sair do plano abstrato e da retórica e discutir situações concretas.

Como está a sua relação com a Polícia Federal?
Esse assunto está mais que ultrapassado.

Advogados reclamam que há um desequilíbrio nos julgamentos da Lava Jato…
Para além do sensacionalismo, é importante ver os dados objetivos. Existe um índice razoável de absolvições, em torno de 21%. É um porcentual comum em toda vara criminal. Poderíamos ir além: prisões preventivas e cautelares que foram indeferidas. Sem falar casos que o próprio Tribunal Regional Federal elevou as penas, caso do ex-presidente.

Fonte: Estadão, por Pedro Venceslau e Fausto Macedo