Por Miranda Sá –
“O primeiro pecado da humanidade foi a fé; e a primeira virtude foi a dúvida” (Carl Sagan)
Joseph Ernest Renan, escritor, filósofo, teólogo, filólogo e historiador francês, escreveu “A vida de Jesus”, livro dedicado à historicidade do Cristo, em que se considera ter trazido a criação de uma “ciência irreligiosa”. O grande Machado de Assis chama esta interpretação de “verificação racional do cristianismo”.
Renan visitou a Holanda nos meados do século 19 e em Haia, diante do monumento erguido em homenagem a Baruch Spinoza, escreveu: “Maldição sobre o passante que insultar essa suave cabeça pensativa. Será punido como todas as almas vulgares são punidas — pela sua própria vulgaridade e pela incapacidade de conceber o que é divino”.
Baruch Spinoza teve a audácia de no século 17 quebrar os grilhões dogmáticos que obrigavam (e ainda obrigam) os cristãos a obedecer aos cânones adotados em concílios e/ou escritos por ‘doutores da Igreja’, sem qualquer intervenção divina.
Aceitando isto, me permito a questionar os chamados “pecados capitais”, que são sete, onde a Mentira não é encontrada… O papa Gregório Magno oficializou-os no século 6, com o cuidado de partir do mais brando para o mais ofensivo; são Luxúria, Gula, Avareza, Preguiça, Raiva, Inveja e Soberba.
Esta lista rendeu outras tantas, mas nenhum incluiu a mentira. Talvez como autodefesa dos seus autores… Mahatma Gandhi fez a sua, a dos Sete Pecados Sociais: política sem princípios; riqueza sem trabalho; comércio sem moralidade; ciência sem humanidade, colaboração sem sacrifício; prazer sem consciência e conhecimento sem caráter.
Os teólogos antolhados, tanto católicos como evangélicos, seguem aberta ou disfarçadamente a tese crítica de Tomás de Aquino, considerando a Luxúria como a subordinação fanática pelo dinheiro, pela distinção e pelo poder. E para justificar a não condenação da Mentira, dizem que por Inveja, alguém pode mentir….
Nos Provérbios (6.16-19), lê-se: “Seis coisas aborrecem Deus, e a sétima a sua alma abomina: olhos altivos, língua mentirosa, mãos que derramam sangue inocente, coração que trama projetos iníquos, pés que se apressam a correr para o mal, testemunha falsa que profere mentiras e o que semeia contendas entre irmãos”.
Será que tal consideração abrirá os olhos dos tolos algemados das convicções impostas politicamente e fervor aos seus líderes colocando-se a serviço deles? (E no caso brasileiro, tristemente, isto se estende até aos familiares do Chefe).
Como a pergunta traz em si a resposta, entenda-se que há quem prefira ter fé em vez de ter dúvida… para estes, lembro Oscar Wilde que pôs na boca do personagem de uma das suas peças que “não há outro pecado além da estupidez”.
Se mentir não é pecado, é mais do que censurável, é um crime por contagiar muitos como um vírus, e não há vacinas imunizadoras para quem não ousa pensar por si, pois as ideias próprias são os únicos anticorpos contra os mentirosos.
E uma coisa é certa: aonde haja um mentiroso os que estão à sua volta mentem pelo contágio, porque o bacilo da mentira é epidêmico…
Isto fica comprovado quando o ministro Paulo Guedes afirma que no ano que entra o Brasil se nivelará com as nações mais desenvolvidas e que a indústria brasileira pode esperar câmbio alto, juro baixo e impostos menores para 2021…
Dá para conferir, também, depois de pausada a pesquisa da vacina da Oxford, o que disse o ministro interino da Saúde, general Eduardo Pazuello, que ’em janeiro, a gente começa a vacinar todo mundo’…
A propagação das mentiras do governo federal tem a sua Wuhan no Palácio do Planalto; ali se encontra o pecado da mentira, que é a essência da familiocracia populista ali instalada.
Os brasileiros conscientes não podem ficar desatentos e impassíveis diante disto; acordem com Dante, que alertou: “no inferno os lugares mais quentes são reservados àqueles que escolheram a neutralidade em tempo de crise.”
MIRANDA SÁ – Jornalista, blogueiro e colunista do jornal Tribuna da Imprensa Livre. Trabalhou em alguns dos principais veículos de comunicação do país como a Editora Abril, as Organizações Globo e o Jornal Correio da Manhã. Recebeu dezenas de prêmios em função da sua atividade na imprensa, como o Esso e o Profissionais do Ano, da Rede Globo.
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