Por Luiz Carlos Prestes Filho

ENTREVISTA N.3 – ESPECIAL REGULAMENTAÇÃO DE JOGOS.

O jornalista Magnho José, especializado em loterias, jogos e apostas, é o editor do Portal BNLData e presidente do Instituto Brasileiro Jogo Legal. Em entrevista exclusiva, afirmou que: “Legalizar apenas os cassinos-resorts integrados (IRs) não vai aumentar o número de turistas estrangeiros, não vai gerar tantos postos trabalhos e nem a arrecadação esperada para este setor.” Com a autoridade de quem tem uma histórica experiência na luta pela regulamentação de jogos no Brasil, José Magnho destacou:

Cremos que todas as cidades do país serão beneficiadas com a legalização de todas as modalidades, pois o jogo é considerado prestação de serviços e terá que recolher ISS. Entendemos que o melhor para o Brasil é a aprovação do Marco Regulatório dos Jogos através do substitutivo ao PL 442/91, que contempla a legalização de todas as modalidades de jogos. Vários mercados que experimentaram longos períodos de clandestinidade optaram com sucesso para esta solução.”

Magnho José é jornalista especializado em loterias, jogos e apostas

Luiz Carlos Prestes Filho: O instituto Jogo Legal tem realizado intenso trabalho junto às autoridades para a regulamentação dos jogos de apostas em dinheiro administrados pela iniciativa privada da América Latina. A pandemia da Covid 19 atrapalhou o processo?

Magnho José: A introdução de um Marco Regulatório para os jogos de azar no Brasil será definida e votada pelo Congresso Nacional. A pandemia do novo Coronavírus adiou a tramitação de vários temas importantes com previsão de avanços no ano de 2020 no legislativo, inclusive a legalização dos jogos. A tramitação dos projetos de lei que podem legalizar os jogos no país e a regulamentação das apostas esportivas ficaram para o segundo plano. Além disso, o novo coronavírus causou vários impactos negativos para o setor de jogos e loterias no país, como suspensão de modalidades lotéricas, queda na arrecadação e falta de eventos esportivos para atender a operação das apostas esportivas.

Prestes Filho: O Instituto do Jogo Legal defende a legalização de todas as modalidades de jogos?

Magnho José: O Instituto Brasileiro Jogo Legal (IJL) vem defendendo desde a sua criação a legalização de todas as modalidades como bingo, jogo do bicho, vídeo-slots, jogo online e os cassinos.

Prestes Filho: Na Câmara dos Deputados, nos últimos anos, aconteceu uma valorização do tema Cassino Resort. Este caminho abre perspectivas concretas?

Magnho José: Somos contrários a legalização exclusiva dos resorts integrados, os IRs, por entender que esta solução não é a melhor para o país. A legalização exclusiva dos IRs é defendida por alguns empresários deste setor, liderados pelo Grupo Las Vegas Sands. Legalizar apenas os cassinos-resorts integrados (IRs) não vai aumentar o número de turistas estrangeiros, não vai gerar tantos postos trabalhos e nem a arrecadação esperada para este setor. Esta proposta não é boa para o Brasil, apenas para algumas corporações norte-americanas. As grandes corporações vão priorizar a instalação destes empreendimentos somente em São Paulo e Rio de Janeiro, pois são as cidades que atendem aos protocolos para receber resorts integrados com cassinos. Além disso, a legalização apenas dos IRs poderá gerar uma forte crise na combalida ocupação dos atuais hotéis. Os cassinos-resorts integrados representariam mais milhares de quartos com hospedagens subsidiadas pela arrecadação dos jogos. Ou seja, estão tentando criar o monopólio do jogo no Brasil para as grandes corporações dos Estados Unidos e empurrando o mercado de jogos não regulados para estruturas verdadeiramente criminosas.

Felizmente, uma pesquisa da Paraná Pesquisa indicou que 52,1% dos deputados federais são favoráveis a legalização de todas as modalidades, sendo que apenas 7,2% dos parlamentares preferem cassinos ‘apenas em resorts integrados’.

Prestes Filho: Qual a ordem de prioridades para instalação de infraestrutura de jogos regulamentados no Brasil?

Magnho José: Cremos que todas as cidades do país serão beneficiadas com a legalização de todas as modalidades, pois o jogo é considerado prestação de serviços e terá que recolher ISS. Entendemos que o melhor para o Brasil é a aprovação do Marco Regulatório dos Jogos através do substitutivo ao PL 442/91, que contempla a legalização de todas as modalidades de jogos. Vários mercados que experimentaram longos períodos de clandestinidade optaram com sucesso para esta solução.

Prestes Filho: Quais são os Projetos de Lei que hoje tramitam com força e representação no Congresso Nacional relacionados a jogos?

Magnho José: A criação do Marco Regulatório dos Jogos no Brasil poderá ocorrer através da aprovação do substitutivo ao PL 442/91 (23 PLs apensados) na Câmara dos Deputados e o PLS 186/14 no Senado Federal, as duas propostas estão prontas para votação no Plenário das duas Casas Legislativas.

Prestes Filho: Os Estados e os Municípios brasileiros sofreram grande impacto negativo com a pandemia da Covid 19. A regulamentação de jogos de apostas em dinheiro poderia colaborar com a arrecadação para os cofres públicos?

Magnho José: Devido a urgência de arrecadação de receita tributária e a existência de um ‘fato social’ devido à grande oferta de jogo não regulado, seria oportuno que o Congresso legalizasse todas as modalidades de jogos em três etapas: a curto prazo seriam os jogos de banca (jogo do bicho) e jogo em meio eletrônico (vídeo-slots), a médio prazo o jogo de rateio (bingos e vídeo-bingos) e a longo prazo os jogos de cassino (em centro de lazer vinculado a resort). Estudos indicam que o potencial do mercado de jogo de um país ou Movimento Geral de Apostas (MGA) equivale de 1% a 1,6% do Produto Interno Bruto – PIB, dependendo das características da população e a cultura de apostas dos seus cidadãos. Baseado na média deste registro mundial, o mercado de jogos do Brasil, com a legalização de todas as modalidades: jogo do bicho, bingos, vídeo-slots e jogos online têm potencial de arrecadar R$ 94,9 bilhões bruto (equivalente a 1,3% do PIB de 2019 de R$ 7,3 trilhões) e gerar cerca de R$ 28,4 bilhões em receitas tributárias por ano. Neste valor não estão incluídos os cassinos, pois o cálculo de tributação depende do modelo e da quantidade a ser definida pelo Congresso e pela regulamentação do Executivo.

Além disso, somente em outorgas o governo arrecadaria antecipadamente mais de R$ 7 bilhões, sendo que nestes valores não estão incluídos os investimentos e a geração de empregos para a implantação destas casas de jogos e apostas.

Brasília – DF (Agência Brasil)

Prestes Filho: Qual o impacto da legalização para geração de empregos?

Magnho José: A legalização de todas as modalidades também geraria mais de 650 mil empregos diretos, através da formalização de 450 mil do jogo do bicho e a criação de pelo menos mais 200 mil novos postos de trabalho nas outras modalidades de jogos. Além disso, cerca de 500 mil empregos indiretos seriam computados com a cadeia produtiva do jogo.

Prestes Filho: Qual é a agenda de trabalho do Instituto Jogo Legal para o próximo ano de 2021?

Magnho José: O IJL vai continuar trabalhando incansavelmente pela aprovação do Marco Regulatório para o setor de jogos. Cremos que o início da vacinação poderá retomar os trabalhos legislativos através e as reuniões e sessões presenciais em Brasília. Além disso, Câmara dos Deputados e Senado Federal estarão sob nova direção e a definição dos presidentes destas Casas é muito importante, pois são eles que definem a pauta de votações.

Prestes Filho: O Instituto Jogo Legal planeja continuar sua participação em eventos internacionais sobre o tema? Quais são hoje os mais relevantes eventos?

Magnho José: Os eventos internacionais são fundamentais para o setor de jogos. Enquanto o resto do mundo considera o jogo como uma atividade econômica, parte da sociedade brasileira ainda o trata como uma questão de costume. Ao longo dos últimos anos tivemos a oportunidade de apresentar os estudos do IJL sobre o mercado de jogos brasileiro em seminários e congressos internacionais como o Seminário Internacional de Loterias de Mar del Plata, na Argentina; Brazilian Gaming Congress – BgC, no Brasil, Juegos Miami, em Miami, nos EUA; Feira Americana de Juegos de Azar – FADJA, em Bogotá, na Colômbia; na ICEVOX 2020, em Londres, entre outros.

Prestes Filho: Qual a importância do Brazilian Gaming Congress (BgC) e do Online Gaming Summit (OgS) para a regulamentação dos jogos de aposta em dinheiro no Brasil?

Magnho José: Realizado desde 2013, pela Clarion Events, o Brazilian Gaming Congress – BgC produzidos pela Liliana Costa e Ewa Bakun, foi o divisor de água para visibilidade deste setor sob a ótica de atividade econômica. Os resultados dos eventos ajudaram a reduzir o preconceito contra o setor. Infelizmente, como resultado dos impactos causados pela pandemia da COVID-19, os eventos BgC – Brazilian Gaming Congress, OGS – Online Gaming Summit e SPAC – São Paulo Affiliate Conference, organizados pela Clarion Events, não serão realizados no ano de 2021.

Prestes Filho: O executivo federal, em especial seus ministros, acenam com a possibilidade de regulamentação?

Magnho José: A interpretação equivocada que o jogo faz parte da agenda de ‘costumes’ e não econômica, além do longo período de clandestinidade e a inapetência do Poder Público em legalizar e regular este setor, provocou um aumentou exponencial na oferta de jogo não regulado no país. Nos dois anos do governo Jair Bolsonaro a legalização dos jogos e dos resorts integrados com cassinos vem sendo debatida e divulgada na grande mídia. As propostas vêm sendo discutidas dentro do governo de forma velada e o próprio presidente Jair Bolsonaro é muito cuidadoso quando se refere ao assunto publicamente, sempre se posicionando contrário. Mas sabe-se que o mandatário do Palácio do Planalto é favorável a legalização e não se posiciona devido a proximidade e o apoio da bancada evangélica. Em janeiro de 2020, o presidente da Embratur, Gilson Machado acompanhou os senadores Flávio Bolsonaro (sem partido-RJ) e Irajá (PSD-TO) e o deputado Hélio Lopes (PSL-RJ), o Hélio Negão em viagem a Las Vegas. Durante o lançamento do Programa de Retomada da Atividade Turística no Amazonas – Amazone-se, em Manaus, em setembro de 2020, o ex-presidente da Embratur, Gilson Machado esteve acompanhado dos senadores Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ) e Irajá (PSD-TO) e do deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP). Durante a solenidade, os filhos do presidente Jair Bolsonaro, Flávio Bolsonaro e Eduardo Bolsonaro, abordaram o interesse de players mundiais em investir em resorts com cassinos no estado.

Ou seja, os sinais emitidos pelos filhos do presidente indicam que este tema tem sido discutido na ‘cozinha’ do Palácio do Planalto. Os filhos Eduardo Bolsonaro e Flávio Bolsonaro, além do deputado Hélio Negão e do presidente da Embratur, Gilson Machado frequentam a cozinha do presidente Jair Bolsonaro.

Crédito: Craig Howell / Creative Commons

Prestes Filho: No judiciário o tema tem sido debatido? O judiciário somente julga um enorme número de processos que poderiam ser evitados?

Magnho José: Além das duas propostas legislativas, existe no Supremo Tribunal Federal o julgamento do mérito do Recurso Extraordinário (RE 966.177) sobre a não recepção pela Constituição Federal da Lei de Contravenções Penais, que poderá descriminalizar os jogos de azar no país.

O julgamento do mérito do Recurso Extraordinário, com repercussão geral, foi agendado para o dia 7 de abril.

Prestes Filho: Quantos anos você Magnho José trabalha pela regulamentação dos jogos no Brasil? Quantos anos imagina que ter pela frente para que sua luta chegue a um final feliz?

Magnho José: Trabalhamos junto ao setor de jogos no Brasil há 24 anos, sendo 19 anos editando o site BNLData e sete como presidente do Instituto Brasileiro Jogo Legal – IJL. Entendemos que o debate sobre a legalização do jogo no Brasil não deve ser somente sobre os vastos investimentos nacionais e internacionais ou as receitas de novos impostos, nem os milhares de empregos que criará. Esses argumentos são óbvios e já não estão mais em debate. O verdadeiro desafio do Legislativo é a criação e o estabelecimento de leis e regulamentos, que permitam aos cidadãos exercerem seu desejo de jogar sob os olhos atentos de regras claramente definidas pelo Estado e sua efetiva aplicação.

Não temos elementos para definir uma data precisa, pois existem fatores que não podem ser controlados, mas a única certeza que temos é que o estado avançado de tramitação das propostas que podem legalizar o jogo no país torna o processo irreversível e inadiável.


LUIZ CARLOS PRESTES FILHO – Diretor Executivo do jornal Tribuna da Imprensa Livre; Cineasta, formado em Direção de Filmes Documentários para Televisão e Cinema pelo Instituto Estatal de Cinema da União Soviética; Especialista em Economia da Cultura e Desenvolvimento Econômico Local; Coordenou estudos sobre a contribuição da Cultura para o PIB do Estado do Rio de Janeiro (2002) e sobre as cadeias produtivas da Economia da Música (2005) e do Carnaval (2009); É autor do livro “O Maior Espetáculo da Terra – 30 anos do Sambódromo” (2015).