Por Chico Alencar –
O bufão bolsonarista preferiu não entrar na História e ficar mesmo “na vida”. Medíocre, como sempre.
O escritor argentino Ernesto Sábato conta, em uma de suas obras, que um cidadão obcecado por um amor doentio a uma mulher resolve se suicidar. Mas queria fazê-la sofrer. Para tal, escreve uma carta informando seu gesto e a posta no correio.
Nela, adverte que, quando a amada a recebesse, já estaria morto. E por culpa exclusiva dela.
Chegando em casa, pensa melhor e se arrepende.
Volta, depressa, à agência de correios, vai ao mesmo guichê em que havia despachado a carta e pede a sua devolução.
A funcionária lembrava-se perfeitamente dele e a própria carta estava ali, à altura da vista dos dois.
Mas, irredutível, a mulher informa que não poderia devolvê-la, pois, uma vez tendo ingressado no sistema, a carta passava a ser do destinatário.
Só este poderia reavê-la.
Depois de muito insistir, sem ter muito mais o que fazer, o cidadão se resigna.
Tempos depois, ao reencontrar a amada, envergonhado, faz referência à carta.
Para sua surpresa – e suprema humilhação – a moça responde que, sim, a tinha recebido e lido, mas não lhe deu a menor bola.
E disse algo como: “Você acha mesmo que acreditei que você ia se matar? Ora, você é um merda, não teria coragem para isso”.
Eu me lembrei dessa história ao ver a palhaçada perigosa armada por Roberto Jefferson neste fim de semana.
Depois de agredir de forma cafajeste a ministra Carmen Lúcia e descumprir determinações judiciais, perdeu o direito à prisão domiciliar.
Entrincheirou-se em casa e recebeu com mais de 50 tiros de fuzil e três granadas o carro de Polícia Federal em que chegaram os quatro agentes que foram prendê-lo. Dois dos agentes ficaram feridos.
Disse ser “um líder”, ameaçou só sair dali morto e insinuou, inclusive, que poderia se suicidar.
O circo tornou-se ainda maior com a chegada daquela figura caricata do padre de festa junina, amiguinho de Bolsonaro, chamado não se sabe por quem para participar das negociações. E do envio do ministro da Justiça, que ficou num local próximo, por determinação do presidente.
Foi uma comédia pastelão.
Em certo momento houve quem pensasse que Jefferson – muito doente, rompido com o seu partido e com parte de sua família – poderia mesmo tentar conduzir as coisas para a sua morte. Seria uma forma de tentar sair como herói da história, atingir o Judiciário, responsabilizando-o pelo desfecho trágico, e criar de um fato novo que talvez virasse o quadro eleitoral, desfavorável para Bolsonaro.
Isso poderia causar um impacto parecido com o da facada de 2018, só que em escala muito maior.
Deu ruim (para os golpistas). Tal como o personagem de Sábato, Jefferson ficou apenas nas ameaças.
Há quem, de fato, já tenha saído da vida para entrar na História.
Como se viu, não foi o caso de Roberto Jefferson.
No caso, o bufão bolsonarista preferiu não entrar na História e ficar mesmo “na vida”. Medíocre, como sempre.
CHICO ALENCAR é professor, historiador, vereador e deputado federal (PSOL) eleito pelo Rio de Janeiro.
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