Redação

O ex-ministro da Saúde Luiz Henrique Mandetta afirmou que o governo federal pretendia alterar a bula da cloroquina na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), sugerindo que o medicamento fosse indicado para casos de Covid-19. Em entrevista ao canal Globonews, Mandetta afirmou que a inclusão seria via decreto assinado pelo presidente Jair Bolsonaro.

“O presidente se assessorava ou se cercava de outros profissionais médicos. E eu me lembro de quando, no final de um dia de reunião de conselho ministerial, me pediram para entrar numa sala e estavam lá um médico anestesista e uma médica imunologista, que estavam com a redação de um provável ou futuro, ou alguma coisa do gênero, um decreto presidencial. E a ideia que eles tinham era de alterar a bula do medicamento na Anvisa, colocando na bula indicação para Covid”, afirmou Mandetta.

SURPRESA – Segundo ele, vários ministros estavam presentes. Mandetta afirmou que o presidente da Anvisa, Antonio Barra Torres, se surpreendeu com a proposta.  “O próprio presidente da Anvisa se assustou com aquele caminho, disse que não poderia concordar. Eu simplesmente disse que aquilo não era uma coisa séria e que eu não iria continuar naquilo dali; que o palco daquela discussão tem que ser no Conselho Federal de Medicina. Então é lá que esse debate tem que se dar. Não adianta fazer um debate de uma pessoa, que seja especialista na área que for, com um presidente da República, que não é médico. A disparidade de armas, já que a frase está em voga, é muito difícil”, completou.

Mandetta destacou que, durante sua gestão, o Ministério da Saúde manteve a sugestão do uso da cloroquina para pacientes considerados graves. “Nós optamos pela ciência, e essa droga iniciou um certo conflito quando o presidente norte-americano (Donald Trump) noticiou que tinha descoberto um medicamento que solucionava o problema. Na sequência, o nosso presidente aderiu também. Mas nos EUA, o CDC, que é o órgão regulador de lá, retirou a cloroquina dos tratamentos, por conta das complicações”, disse o ex-ministro. Aqui, autorizamos para os pacientes graves e os gravíssimos, que são os que estão com intubação”, explicou.

IRONIA – Na mesma entrevista, o ex-ministro da Saúde ironizou a fala de Bolsonaro (sem partido) sobre cloroquina. O médico afirmou que “quem é de direita usa cloroquina. Quem é de esquerda, tubaína. E quem é de juízo, escuta a medicina”

A fala de Mandetta se deu após Bolsonaro, na última terça-feira, ter comentado sobre o uso da medicação para os pacientes que apresentarem sintomas leves de coronavírus. Ele afirmou em entrevista ao Blog do Magno que  “pode ser que lá na frente digam que foi placebo. Mas pode ser que digam que curava. Na minha consciência, não vai ter isso. Toma quem quiser. Quem não quiser, não toma.” Bolsonaro ainda acrescentou, “quem for de direita toma cloroquina, quem for de esquerda toma tubaína”.

DIFICULDADE DE ASSINAR – Mandetta falou também sobre a implantação do medicamento no Sistema Único de Saúde (SUS). De acordo com Mandetta, é muito mais confortável para Bolsonaro ter um ministro que não é médico. “Qualquer um que se sentou nas cadeiras das universidades de medicina tem dificuldade em assinar”. O médico estava se referindo ao ministro interino da Saúde, Eduardo Pazuello.

O ex-ministro ainda alertou para os riscos da automedicação. “Meu maior medo é que as pessoas comecem realmente a se automedicar. Para jovens, não vejo problemas. Mas, por ter muitos efeitos colaterais, os idosos correm risco”, afirmou.

Quando questionado se havia alguma possibilidade de ex-ministros e médicos acionarem alguma medida judicial para atrasar Bolsonaro, Mandetta foi bem enfático ao dizer que não tinha conhecimento desse movimento. Ele lembrou que há uma Associação de Médicos e de Infectologia que pode ser acionada por qualquer um que se sinta em perigo.


Fonte: O Tempo