Por Lincoln Penna

Em meados de 1961 eu me alistei no serviço militar. Apresentei-me no quartel de São Cristovão e nele cumpri a minha formação de soldado durante alguns meses sendo em seguida destacado para o Departamento Geral de Pessoal (DGP), no então ministério da Guerra, Palácio Duque de Caxias. Prédio quadrilátero, essa unidade para a qual fui destacado ficava na parte de trás, se não estou enganado no quinto andar.

O DGP era constituído de três salas. A mais ampla com banheiro privativo era ocupada pelo general chefe desse órgão. Na época quem se encontrava à frente era o general Américo Braga. Em outra sala bem espaçosa ficava o coronel adjunto da chefia, na minha época ocupada pelo coronel Crisanto Figueiredo; e uma terceira sala não tão grande era destinada aos ajudantes de ordens, geralmente dois capitães. Lembro-me bem dos dois ocupantes, o capitão Chuhay e o capitão Nelson. Vou me ocupar do primeiro neste depoimento.

Como fui relacionado como integrante do contingente para servir na condição de estafeta e de serviços gerais, era frequentemente designado para o apoio a necessidades desses oficiais do DGP. Com isso, conheci praticamente todas as unidades que compunham o complexo do exército distribuído no quartel-general, uma vez que o órgão em que estava à disposição interagia com todos os demais.

Foi assim prestando serviço que tive contato com o então capitão Chuhay, que constantemente me encarregava das tarefas daquele gabinete.

Sua relação comigo e com todos os que compunham os contingenciados, que desempenhavam trabalho, era diferente dos demais oficiais. Tratava-me não como um subalterno que eu era, mas como alguém que ao seu lado cumpria a rotina daquele dia a dia marcado pela renúncia do presidente Jânio Quadros e nos primeiros momentos do governo de João Goulart, depois das tratativas para a sua posse no sistema parlamentarista.

Levava-me ao reservado dos oficiais, basicamente composto por tenentes e capitães, local em que no final do expediente se lavavam e trocavam de roupa, sem me deixar de lado, como se integrasse aquele grupo. Era sempre apresentado a todos e jamais usou sua patente para demonstrar alguma condição de mando. Pedia que fizesse o que era funcional em meus encargos. Brincava com todos e demonstrava ser querido por todos. Mas, o que mais me impressionava era a sua liderança junto aos seus camaradas. Sua chegada – e eu a testemunhei várias vezes – era saudada com naturalidade de quem saúda a chegada de alguém a quem se quer bem.

E foi assim, em pleno término de minha baixa que tive a sensação de perda daqueles encontros com o capitão Chuhay, que só o reencontrei nos tempos de Brizola e de sua participação em seu governo. Nunca tive a oportunidade de dizer a ele o quanto o admirava e o respeitava assim como, com certeza, os que com ele conviveram. Nunca é tarde para dizer e deixar registrado no tempo histórico à grande liderança que assisti desabrochar em seu tempo de jovem oficial do Exército brasileiro. Era um democrata no trato com as pessoas e um patriota que despontava para a vida pública.

Até, bravo guerreiro, sempre presente em nossas lembranças.

Lincoln de Abreu Penna
Soldado 651 lotado no DGP.


LINCOLN DE ABREU PENNA – Doutor em História Social pela Universidade de São Paulo (USP); Conferencista Honorário do Real Gabinete Português de Leitura; Professor Aposentado da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ); Presidente do Movimento em Defesa da Economia Nacional (Modecon); Colunista e Membro do Conselho Consultivo do jornal Tribuna da Imprensa Livre.