Por Miranda Sá –
Não acredito em fantasmas. Mas inúmeras testemunhas garantem que eles existem.
Que me lembre, a genialidade de William Shakespeare pôs em cena dois. Um, na celebrada tragédia “Hamlet”, a lenda de um jovem príncipe dinamarquês que vê o fantasma do pai, denunciando ter sido assassinado pelo próprio irmão, que se casou com a sua viúva.
Outro, em “Macbeth”, quando num banquete com a nobreza, o personagem-título vê o fantasma de Banquo, capitão do exército do rei Duncan, sentado à mesa. Alucina-se com isto pois assassinara o Rei da Escócia e ocupara seu lugar; como mandou matar Banquo, cujos desdentes se sentariam no trono, segundo uma profecia.
Das clássicas peças do dramaturgo e ator inglês, incomparável poeta e escritor, vamos como caça-fantasmas ao cinema. Lá encontramos vários filmes baseados nos livros do renomado romancista Charles Dickens, também inglês.
A obra mais vistosa de Dickens é “A Christmas Carol”, traduzida editorialmente para o português como “Um Conto de Natal”. Como filme, teve várias versões em Hollywood e em estúdios ingleses.
Conta a história de um velho avarento, Ebenezer Scrooge, uma criatura egoísta e pouco amistoso, insociável que abomina as festividades natalinas. Numa véspera do Natal, vê o espírito do seu ex-sócio, Jacob Marley, morto há sete anos e sofre o castigo pela sovinice arrastando pesadas correntes de ferro.
O Espectro adverte Scrooge de que ele ainda tem chance de escapar de pesadas penas pelo seu comportamento desumano e antissocial, mas para isto deverá receber a visita de três fantasmas.
E assim se dá: à meia-noite chega o Fantasma dos Natais Passados que leva Scrooge de volta à infância e juventude, quando amava a família e festejava o nascimento de Cristo; a seguir, vem o Fantasma do Natal Presente: este retrata com fortes cenas a sua frieza com relação às outras pessoas e o leva a assistir seu empregado, que explora e maltrata, reunir-se feliz com a família numa humilde mesa arrumada para a comemoração.
Viu que o seu escriturário é pai de quatro filhos, e com eles e a esposa mostram uma atenção carinhosa pelo mais moço, o frágil Pequeno Tim, que tem problemas na perna como sequela da poliomielite.
Por fim, aparece o Fantasma dos Natais Futuros que silencioso aponta a cena da sua morte solitária, sem amigos, e seu enterro tristemente indigente num cenário que emocionou Scrooge. Este, no dia seguinte, acordou completamente modificado, levantando-se sentimental e generoso.
Como um homem novo, o antigo avarento foi tomado pelo Espírito do Natal. Decidiu ajudar o seu empregado Bob Cratchit e torna-se um segundo pai para o Pequeno Tim. Escrito por Dickens entre outubro e novembro de 1843, “Um Conto de Natal” é visto como o criador das atuais celebrações natalinas.
Na literatura, teatro e cinema brasileiros, chega-nos uma versão ingênua da fantasmagoria com “Pluft – O Fantasminha” de Maria Clara Machado, revertendo toda expectativa amedrontadora dos Fantasmas, ao levar à cena um fantasminha tímido que tem medo das pessoas….
A intelectual e respeitada teatróloga patrícia, Maria Clara Machado, deu um mergulho na ficção totalmente distinta do que ocorre na política brasileira, onde dominam os fantasmas do horror, amedrontando o país ao promover a falta de educação, da saúde, da segurança e da corrupção.
Estas sombras espectrais rondaram o Estado de Direito em Brasília, arrastando as correntes antidemocráticas do finado fascismo. Demoníacas, exalaram a catinga de enxofre de um golpe contra as eleições presidenciais. Traziam até a revelação de uma minuta pronta para anunciar o estado de sítio!
Tais quimeras provocam temores entre os médiuns do Congresso Nacional, alguns mortos e insepultos; e traz também um alívio para os sensitivos do 5TF, como cortina de fumaça que esconde a cumplicidade da Corte com a corrupção lulopetista, através das decisões monocráticas de Dias Toffoli.
Contraditoriamente, a manifestação espectral política nos leva a acreditar que os mortos têm muito a nos dizer; e além disto nos diverte com o “Espírito do Carnaval”, fantasiado de Fantasminha Pluft, que canta em dueto com o espírito de Rita Lee:
“A inocência não dura a vida inteira/ Brinque de ser sério/ E leve a sério a brincadeira”.
MIRANDA SÁ – Jornalista profissional, blogueiro, colunista e diretor executivo do jornal Tribuna da Imprensa Livre; Trabalhou em alguns dos principais veículos de comunicação do país como a Editora Abril, as Organizações Globo e o Jornal Correio da Manhã; Recebeu dezenas de prêmios em função da sua atividade na imprensa, como o Esso e o Profissionais do Ano, da Rede Globo. mirandasa@uol.com.br
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