Por Luiz Carlos Prestes Filho

N.30 – ESPECIAL REGULAMENTAÇÃO DE JOGOS.

Desejo que os jornalistas e editores brasileiros consigam ter um sono tranquilo. Que não vivam o terror do jornalista Chico Otavio do “O Globo”, que deve interromper o sono, acordar toda madrugada, para ver se não tem um bicheiro ou um crupiê debaixo da cama.

Luiz Carlos Prestes Filho

Entre os meses de fevereiro e março deste ano publiquei 30 matérias sobre a necessidade da regulamentação dos jogos de apostas em dinheiro administrados pela iniciativa privada no Brasil: cassinos, bingos e jogo do bicho. Deputados federais e estaduais, vereadores e empresários, engenheiros e artistas, advogados e tributaristas debateram um tema que recentemente seria difícil emplacar abertamente na mídia. Infelizmente, por razões óbvias, não pude dar a palavra para os responsáveis por jogos clandestinos no Brasil. Pessoas que vivem à margem da lei por conta do entulho autoritário que ainda rege o país criado pela ditadura do Estado Novo (1937/1945) e fortalecido pela Ditadura Militar (1964/1989). Dispositivos legais que desempregaram milhares de trabalhadores dos cassinos brasileiros, em 1946; outros milhares em 2007, quando fecharam os bingos, que tinham sido autorizados pelas leis Pelé e Zico; e que mantêm há 120 anos milhares de apontadores do jogo do bicho na ilegalidade.

Newton Cardoso Jr.: “O Brasil está perdendo o bonde da história por não legalizar jogos”

Realizei as matérias durante a pandemia da COVID 19, enfrentando a TV Globo que lançou um filme tendencioso e covarde sobre o histórico bicheiro Castor de Andrade. Grande incentivador do carnaval brasileiro, amigo dos patronos Anísio Abrão David, GRES Beija-Flor de Nilópolis, e Ailton Guimarães Jorge, GRES Vila Isabel, a quem os realizadores não deram voz. Produto audiovisual inventado para criar pânico e um ambiente contrário a todos patronos das escolas de samba do Rio de Janeiro. Ficou bem evidente este direcionamento editorial após a publicação da matéria do repórter Chico Otavio, do jornal O Globo, com o título: “Novos chefes do bicho apostam em aliança com milícia”, em 21/02/2021. Na qual, sem nenhuma prova envolve instituições e pessoas com o crime organizado. Na matéria somente alegações.

Ronaldo Gomlevsky: “Não posso falar por outros judeus, falo por mim – sou absolutamente favorável à abertura dos cassinos, dos bingos e do jogo do bicho”

No ano de 2018, o mesmo jornal O Globo publicou o editorial “O Melhor é Legalizar o Jogo para Regulá-lo”. Um texto oficial favorável à regulamentação dos jogos no Brasil. No qual reconhece que foi um erro as Organizações Globo, ao longo de décadas, serem contrárias à livre decisão de um cidadão, de um país onde vigora a democracia – sistema político universal que está acima das religiões e ideologias – em jogar ou não jogar: “O tempo passou, o jogo explorado em cassinos caiu na clandestinidade, e assim tem sido até hoje. Este jornal (O Globo) apoiou o presidente Dutra naquela decisão, e sempre foi crítico da possibilidade de sua volta, devido ao aspecto do vício e do risco de se constituir mais uma brecha a ser explorada pelo crime organizado, em especial para lavagem de dinheiro. Os mesmos motivos que levaram Dutra a baixar o decreto de 1946. Nesses 72 anos, porém, o avanço da tecnologia digital tornou inócua uma proibição formal que não consegue impedir que o jogo seja feito de forma eletrônica, fora do alcance do Estado brasileiro. É o suficiente instalar servidores em países em que há um tratamento tributário amigável para cassinos e de lá receber apostas dos brasileiros”.

Será que o repórter investigativo do O Globo, Chico Otavio, não investiga os editoriais do jornal onde trabalha? Pelos artigos que escreve, desde 2018, contrário à regulamentação de jogos deduzo que não!

 João Roberto Kelly: “Eu sou um defensor do jogo, até mais pelo viés artístico. Porque os cassinos, fizeram muito pela artes, deram empregos a tantos músicos, maestros, coreógrafos, cenógrafos… meu Deus do céu!” – Foto: Luiz Carlos Prestes Filho gravando o samba em homenagem ao cantor Ciro Monteiro que compôs com o parceiro João Roberto Kelly

Porque será que Chico Otavio não denuncia, com a mesma coragem que denuncia cassinos, bingos e o jogo do bicho, como estruturas de lavagem de dinheiro e do crime, o sistema bancário nacional e internacional. De acordo com o ministro russo, Viktor Ivanov, que comanda uma estrutura poderosa para o combate à lavagem de dinheiro no mundo: “Os fabricantes de droga ficam só com 5% do lucro. Os responsáveis pelo transporte, com 30% ou 40%. O resto vai para o crime organizado, que lava o dinheiro. E não há dúvidas que o sistema bancário mundial é um dos grandes beneficiados. Na falta de liquidez crônica que vemos hoje em dia, os bancos precisam de recursos para gerar crédito, e a tolerância é grande. Em russo, dizemos: para os bancos, dinheiro não tem cheiro”. A constatação acima, desta importante autoridade russa é interessante porque em seus relatórios não existem denuncias contra cassinos, bingos ou jogo do bicho. Os bancos que lavam dinheiro!

Carlos Di Giorgio: “Sou absolutamente a favor da regulamentação das casas de apostas, que muitos chamam de jogos de azar. Sou a favor da atividade legalizada, exercida dentro da lei e fiscalizada pelos órgãos competentes. A atividade legal dos jogos gera empregos, oportunidades para empreendimentos, impostos e oferece à população diversão”

A entrevista com o ministro Viktor Ivanov foi publicada no “O Globo”, mas, pelo visto, o repórter Chico Otavio, além de não ler os editoriais, não lê as matérias publicadas no jornal onde trabalha. Desejo que ele tenha lido a seguinte nota na coluna do Ancelmo Góis, em 04/03/2021: “Os presidente da Câmara, Arthur Lira, e do Senado, Rodrigo Pacheco, reuniram-se com CEOs das 50 maiores empresas do país, no último dia 1º. Os dois disseram que uma das pautas prioritárias para aprovação é a liberação dos cassinos no Brasil.”

Luiz Carlos Prestes Filho com sua mãe Maria e filha Melinda durante a cerimônia da sua condecoração com a Medalha Tiradentes do Governo do Estado de Minas Gerais

Mas, sinceramente, penso que Chico Otavio, que junto com Aloy Jupiara escreveu o livro “Os Porões da Contravenção”, onde afirma existir chifres em cabeça de cobra, esta desconectado com a realidade do Brasil e do mundo.

Dr. Bernardo Fridman, profissional da área da saúde: “A pessoa que é viciada em jogos, vai jogar com o jogo estando proibido ou liberado. O fato do jogo não estar regulamentado é muito prejudicial nesse sentido, pois o Estado se isenta de criar políticas públicas para tratar essas pessoas”

Dedico uma especial atenção a estas contradições acima porque, como disse o coordenador da Frente Parlamentar Mista em Defesa da criação do Marco Regulatório dos Jogos no Brasil, João Carlos Bacelar: “Há, hoje, uma minoria que defende uma lei que é chamada na Câmara de ‘Lei Sheldon Adelson‘ (em homenagem ao empresário americano, recentemente falecido), que só permite a legalização de Cassinos Integrados a Resorts. Nós somos terminantemente contra isso. Tenho percebido que a movimentação, no Congresso, é regulamentar apenas três cassinos e entregar o monopólio do jogo no Brasil para investidores dos Estados Unidos. Querem empurrar o mercado não regulado para estruturas criminosas, o que seria um absurdo.” Para o deputado: “É inaceitável abrir as portas do Brasil para empresários internacionais sem legalizar o empresário brasileiro, que está aí como contraventor.”

Luiz Carlos Prestes Filho e Capitão Guimarães

Na opinião do jornalista Gildo Mazza, do portal de notícias Games Magazine Brasil, lamentavelmente os jornais “Folha de São Paulo”, “O Estado de São Paulo” e a revista “Veja” ainda preservam o ranço dos tempos de 1946, quando, por decreto foram fechados os cassinos no Brasil: “São veículos de comunicação que abertamente mantêm um posicionamento antiliberal, estatizante e centralizador. Desejam que o Estado brasileiro continue com o monopólio tutelando o cidadão. Podemos ir ao cinema, teatro e ao museu mas não podemos jogar. Para uma imprensa que se diz livre isso é pernicioso. Nas televisões temos que a somente a Rede Bandeirantes à favor da regulamentação. Inclusive, dando cobertura para seminários e congressos sobre o tema.”

Em outubro de 1995 foi fundada a Nova Zen Editora, responsável pela revista Games Magazine e pelo portal de notícias online GMB (Reprodução/Games Magazine Brasil)

Hoje, com a mídia social e as publicações eletrônicas, surgiu uma rede com noticiário mas amplo a respeito da regulamentação dos jogos, destaca Gildo Mazza: “Por conta da promulgação da Lei das Apostas Esportivas, nº13.756, em 2018, no governo Michel Temer, o setor foi incrementado. Apesar de ainda não está regulamentada foi um avanço e a imprensa não pode esconder este fato. Tanto que tenho a certeza de que, caso o jogo seja regulamentado, os mesmos jornais e revistas, redes de TV e e de rádio, que hoje são contra vão criar cadernos especiais sobre o tema com visão positiva. Vão querer faturar. Até porque o movimento financeiro já é uma realidade. Por exemplo, mais da metade dos times das séria “A” e “B” do Campeonato Brasileiro de Futebol tem patrocínios de casas de apostas esportivas.”

Trajano Ribeiro: “A atividade turística aciona uma gigantesca cadeia produtiva, envolvendo transporte, indústria têxtil, automotiva óleo e gás, energia elétrica, construção civil, artes em geral, música, show, gerando milhões de empregos indiretos. Talvez nenhum outro setor da economia tenha um tal reflexo na economia como um todo”

O jornalista do portal de notícias Games Magazine Brasil lembra também que: “Os grandes veículos de comunicação no mundo inteiro participam direta e indiretamente das estruturas empresariais montadas para apostas voltadas para o esporte e a cultura. O melhor exemplo é o Cassino MGM Resorts. Muitos empresários da comunicação do Brasil já perceberam que, ao não ter estruturas similares no Brasil, estão perdendo milhões e milhões dólares. Assim como perderam milhões durante os Jogos Olímpicos (2016) e a Copa do Mundo de Futebol (2014).”

Luiz Carlos Prestes Filho com Luizinho Drummond, à esquerda, e Anísio Abraão David à direita

Termino a publicação dessa série de matérias dedicadas a regulamentação de jogos administrados pela iniciativa privada, com o sentimento de missão cumprida. Ampliamos as fronteiras do debate, antigos defensores da causa conheceram novos atores, temas do passado foram revisitados e os novos foram apresentados.

Agnaldo Timóteo: “Nos meus depoimentos para a imprensa, sempre fui à favor da regulamentação. Nunca fui hipócrita, defendi e defendo a regulamentação dos jogos”

Vamos torcer para que os atuais e os futuros editores do “O Globo”, “Folha de São Paulo”, “O Estadão”, revista “Veja”, TV Globo, TV Record, Rede TV e SBT, entre outros importantes veículos da imprensa brasileira, consigam abordar o tema dando voz a todos atores do setor democraticamente. Desejo que os jornalistas e editores brasileiros consigam ter um sono tranquilo.

Que não vivam o terror do jornalista Chico Otavio do “O Globo” que deve interromper o sono, acordar toda madrugada, para ver se não tem um bicheiro ou um crupiê debaixo da cama.


LUIZ CARLOS PRESTES FILHO – Diretor Executivo do jornal Tribuna da Imprensa Livre; Cineasta, formado em Direção de Filmes Documentários para Televisão e Cinema pelo Instituto Estatal de Cinema da União Soviética; Especialista em Economia da Cultura e Desenvolvimento Econômico Local; Coordenou estudos sobre a contribuição da Cultura para o PIB do Estado do Rio de Janeiro (2002) e sobre as cadeias produtivas da Economia da Música (2005) e do Carnaval (2009); É autor do livro “O Maior Espetáculo da Terra – 30 anos do Sambódromo” (2015).