Por Kakay –
“Aquilo que causa a noite dentro de nós também pode deixar estrelas.”
–Victor Hugo
Começam a crescer no país movimentos que pedem a prisão do ex-presidente Bolsonaro e que bradam contra qualquer hipótese de anistia para os golpistas do 8 de Janeiro. Penso ser natural que a discussão sobre a inoportunidade da anistia evolua e ganhe espaço. É uma pauta justa e que merece eco na sociedade.
O Brasil ainda não saiu totalmente do grave risco a que foi submetido. O relatório da Polícia Federal, de 884 páginas, desvendou, com critérios técnicos, a gravidade do movimento golpista coordenado por Bolsonaro e por um poderoso grupo de militares de alta patente.
Impressiona a ousadia do bando que pretendia derrocar a democracia e instalar no país um regime de força.
Falar em anistia é, de certa forma, alimentar o espírito golpista ainda não completamente debelado. Na festa de final de ano do Grupo Prerrogativas, com a presença do presidente Lula e de vários ministros, as pessoas presentes gritaram, a plenos pulmões, brados contra a anistia.
De certa forma, seria um tapa na cara do Supremo Tribunal, que, de maneira técnica, corajosa e responsável, enfrentou a fúria dos que intentaram contra o Estado democrático de Direito. Agora, ainda no meio dos julgamentos, a extrema-direita tenta tumultuar a pauta democrática.
Ainda nesta semana, o plenário da Corte formou maioria para manter o ministro Alexandre de Moraes na relatoria. É necessário ressaltar que a defesa de Bolsonaro tem absoluto direito de fazer uso, na sua plenitude, de todos os recursos constitucionais para garantir a ampla defesa e o devido processo legal. É assim que funciona na democracia. A mesma democracia que os investigados queriam subverter. Falar em suspeição do ministro Alexandre é completamente descabido e injurídico, mas faz parte do jogo.
Outra questão é colocar a prisão de Bolsonaro na pauta da sociedade. Reconheço que a trama urdida para a tentativa de golpe passou de todos os limites e foi chocante constatar o início, felizmente frustrado, do plano de matar o ministro Alexandre, o presidente Lula e o vice Alckmin. Juridicamente, a hipótese de encarceramento passou a ser relevante. Porém, é importante privilegiar e garantir o processo penal democrático.
Durante a investigação, que certamente ainda está em curso, até porque faltam os políticos para fechar o quebra-cabeça, o diretor da Polícia Federal, ao ser cobrado, explicou, acertadamente, que o tempo da apuração não é o mesmo da imprensa e da sociedade. Há que se respeitar o trabalho técnico para que o relatório esteja baseado em provas irrefutáveis.
Da mesma forma, ocorre com o Ministério Público Federal. O procurador-geral é o dominus litis, o dono da ação penal. Só ele pode apresentar uma denúncia, peça formal que, se recebida pelo Poder Judiciário, dá início à ação penal.
O chefe do MPF é um homem culto, sério e responsável. É absolutamente natural que, depois de um trabalho exaustivo e aprofundado da Polícia Federal, que durou meses, o responsável pela análise do inquérito tenha também seu tempo de maturação. Acusar alguém de cometer um ato criminoso é algo de extrema gravidade. É bom que possamos dar crédito e tempo para uma análise rigorosa de fatos tão graves que colocaram em risco a democracia no Brasil.
Cabe a nós, cidadãos, acompanhar e cobrar, acreditando que a normalidade democrática já começa a tomar corpo no horizonte.
Lembrando-nos de Eduardo Galeano:
“A utopia está lá no horizonte. Me aproximo 2 passos, ela se afasta 2 passos. Caminho 10 passos e o horizonte corre 10 passos. Por mais que eu caminhe, jamais alcançarei. Para que serve a utopia? Serve para isso: para que eu não deixe de caminhar.”
ANTÔNIO CARLOS DE ALMEIDA CASTRO, o Kakay, tem 67 anos. Nasceu em Patos de Minas (MG) e cursou direito na UnB, em Brasília. É advogado criminal e já defendeu 4 ex-presidentes da República, 80 governadores, dezenas de congressistas e ministros de Estado. Além de grandes empreiteiras e banqueiros.
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