Por Ricardo Cravo Albin

O ano literário no começo de janeiro se abriu com a consagradora homenagem ao maior estudioso de nossa língua portuguesa, o gramático Evanildo Bechara.

Na sede histórica (lotada) do Pen Clube Internacional do Brasil, Bechara, 95 anos, recebeu o Grande Prêmio Pen Clube de 2023, cerimônia a que se somaram por intensa correspondência as mais altas representações da vida do país.

O acadêmico sempre lotou plateias na Europa e no Brasil, mas vem se afastando gradativamente de suas funções, tanto como conferencista muito requisitado por vários países, quanto da presidência da Comissão de Lexicologia e Lexicografia da ABL que produz o vocabulário ortográfico e o dicionário da língua portuguesa. Agora mesmo, está chegando às livrarias o seu clássico “Lições de Português pela Análise Sintática”, lançado originalmente em 1954.

O filólogo mergulha fundo em um dos assuntos de minha preocupação e sabida Implicância, os estrangeirismos. “-mas Ricardo, eles não são um problema. Veja você, eu no Volp ajudo a decidir quais as novas palavras importadas ou não, que merecem um lugar no dicionário”. “-Língua, meu caro, é o uso. Ela só se concretiza no falar continuado das pessoas”, declarou Bechara com suavidade, mas firmeza. Em 2009, Bechara certamente viveu um grande momento, quando foi lançada a 5ª edição do Volp. E ele o fez em tempo recorde: em apenas três meses adaptou o Dicionário às normas do novo Acordo Ortográfico promulgado em setembro do ano anterior.

Bechara foi saudado no Salão Nobre do Pen Clube por Merval Pereira, que desde o começo deu integral apoio da ABL para o Grande Prêmio ser a ele outorgado. Seu colega, também filólogo da ABL Ricardo Cavaliere, foi escolhido para ser o orador oficial. Ainda presente à mesa de honra, a vencedora do Grande Prêmio anterior, Mary del Priore, que lhe entregou a famosa estatueta “Pena de Ouro”. Como Presidente da mesa, encerrei a sessão transmitindo à enorme plateia o que Bechara me confidenciara aos ouvidos: acabara de revisar e reeditar todos seus livros pela Nova Fronteira. O público aplaudiu de pé. O homenageado ainda permaneceu à mesa por uma hora, a distribuir dezenas de autógrafos: 95 anos de idade que sequer aparentavam 45. Grande e querido Mestre Bechara!

Obs.1 – Livros

Pesquisa indica que brasileiros diminuíram em quase 0,80% a aquisição de livros. Ora, para um país que tradicionalmente lê pouco em relação aos outros países mais desenvolvidos do mundo, isso assusta e constrange. Não de hoje…

Obs.2 – Uma lágrima para a Embaixatriz Carmen Olivia Moscardo de Sousa

Fui ao cemitério para as últimas homenagens à embaixatriz Carmen Olivia Moscardo. Mãe dos filhos de um dos mais saudados embaixadores do Brasil, o também ex-ministro da Cultura Jerônimo Moscardo, Carmen Olivia foi encantadora figura humana. Tive a honra de ser hospedado por ela nas embaixadas de Bucareste e de Bruxelas. Especialmente nesta última, considerada uma das melhores residências diplomáticas do Brasil no exterior, Carmen Olivia e Jerônimo excederam-se em gentileza. E o primeiro convidado a chegar ao coquetel que fizeram em minha homenagem no deslumbrante palacete foi o Barão Toots Thieleman, maior gaitista do mundo, amigo de Tom e Elis Regina, dirigindo ele próprio reluzente Rolls Royce preto, que aparentava ter vários metros de comprimento.

Carmen Olivia se destacava pela refinada economia de palavras e elegância nos gestos. Além de muito bonita e discreta, a embaixatriz brasileira era uma convergência natural nos círculos diplomáticos onde Jerônimo Moscardo agia sempre com muita desenvoltura ao representar o Brasil com criatividade e paixão. Até uma praia na longínqua Bucareste veio a receber o nome de Copacabana por artes de Jerônimo Moscardo. Na Bélgica, então, Moscardo era o mais comentado dos embaixadores credenciados no reino.

Se ele permanecesse por mais dois anos na corte belga, acabaria por ser aquinhoado, pelo tanto que fez, com o titulo de Barão, não duvido. Como também não duvidaria se o embaixador brasileiro não tivesse estimulado o Rei dos belgas a “várias peladinhas de futebol nos jardins do palácio real”.

Ao longo do coquetel na Embaixada do Brasil, Toots me prevenira “Não se assuste se daqui a pouco a Guarda Real adentrar a Embaixada. O Jerônimo é amigo do Rei. Ele pode vir. Eu, prevendo, trouxe minha gaita. E guardei no cofre do meu carro. E me apontou reluzente chave de ouro…”.

RICARDO CRAVO ALBIN – Jornalista, Escritor, Radialista, Pesquisador, Musicólogo, Historiador de MPB, Presidente do PEN Clube do Brasil, Presidente do Instituto Cultural Cravo Albin e Membro do Conselho Consultivo do jornal Tribuna da Imprensa Livre. Em função das boas práticas profissionais recebeu em 2019 o Prêmio em Defesa da Liberdade de Imprensa, Movimento Sindical e Terceiro Setor, parceria do Jornal Tribuna da Imprensa Livre com a OAB-RJ.

Envie seu texto para mazola@tribunadaimprensalivre.com ou siro.darlan@tribunadaimprensalivre.com


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