Por Jorge Folena

No programa Soberania em Debate (realização do Movimento SOS Brasil Soberano, do Senge/RJ) de 27/11/2020, cujo tema eram os militares, o ex-deputado federal José Genoíno formulou a seguinte frase:

“Está sendo construído um Estado autoritário, por dentro da ordem, no Brasil”!

Na verdade, o surgimento desse estado autoritário não é responsabilidade apenas do atual governo, como procuram inculcar os que agora se autodenominam de “centro”, mas que sempre foram da direita mais atrasada e cruel e são tão responsáveis quanto o atual ocupante da presidência.

A culpa é principalmente da classe dominante brasileira, que jamais soube conviver nem aceitar um estado verdadeiramente republicano e efetivamente democrático, cuja sociedade saiba viver na frugalidade (nas palavras de Montesquieu para se alcançar a igualdade) e permita que a riqueza seja distribuída entre todos.

Sem dúvida, depois do golpe do impeachment de 2016, ficaram nítidas as constantes violações ao Estado Democrático de Direito no Brasil; sendo que o indevido impedimento da presidenta Dilma Rousseff foi o maior ataque contra a democracia e desnudou a fragilidade institucional no país.

Entre as consequências imediatas deste quadro de destruição, temos agora a ampliação do estado de exploração da força de trabalho, o aumento da violência contra os considerados subalternos (negros, mulheres, crianças, idosos e indígenas) e o retorno impiedoso da pobreza sobre estes, os mais vulneráveis.

Na verdade, a destruição recaiu sobre tudo o que a Constituição de 1988 programou impedir, em seus fundamentos e objetivos, que visavam garantir: a cidadania; a dignidade da pessoa humana; os valores sociais do trabalho; o pluralismo político; a construção de uma sociedade livre, justa e solidária; a garantia do desenvolvimento nacional; a erradicação da pobreza e da marginalização; a redução das desigualdades sociais e regionais; e a promoção do bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.

A Constituição de 1988 está sendo reconfigurada (para dizer o mínimo) sem a autorização de um poder constituinte. O STF tem colaborado, e muito, para que isto ocorra, mediante interpretações simplistas e sob alegações de “escutar as vozes das ruas”.

Ocorre que estas “vozes das ruas” não são as dos excluídos e dos explorados, que constituem a maioria do povo brasileiro; algumas vezes, são as vozes de setores também subalternos, mas que se acham melhores diante dos mais pobres das favelas, das periferias e do campo, ou seja, da classe média constituída pelos que Ortega y Gasset denomina de “homem massa”, significando aquele indivíduo que não dispõe da compreensão completa do que se passa mas que se deixa levar pelo ódio que alimenta a sua própria destruição.

Assim, o país está mergulhado no caos, sem perspectiva de desenvolvimento e incapaz de assegurar a soberania efetiva para seu povo. Os direitos fundamentais não são observados, pois a classe dominante, sob o comando de financistas, rentistas e ruralistas, impõe derrotas duríssimas ao conjunto dos trabalhadores, por meio de “reformas” trabalhista, previdenciária, administrativa e com a imposição de um “teto de gastos” que impede a distribuição de verbas públicas aos setores sociais e fundamentais (educação, saúde, ciência e tecnologia).

Tudo isto contribui para aumentar a concentração de capital em favor dos muito ricos, ao custo de que nada seja distribuído para os grupos subalternos (os mais pobres: negros, mulheres, crianças, anciãos, indígenas), que perdem a cada dia a sua dignidade e estão sendo assassinados, nas cidades e no campo, pelas forças de segurança pública, diante da mais completa indiferença por parte das autoridades institucionais.

Por acreditar na verdadeira dialética, tenho a convicção que tal estado de destruição não pode durar para a vida toda e em algum momento será revertido; quando isto acontecer, que todos os que hoje entregam o país à submissão internacional, à destruição política, econômica e social, ao custo da vida de seu próprio povo, sejam condenados pela História e submetidos à Justiça de transição, que virá!

Ps1. Aproveito para desejar, na medida do possível, diante de tudo estamos passando, boas festas.

Ps2. Estarei tirando uns dias de recesso neste final de ano e retorno a partir do meado de janeiro de 2021. Até lá!


JORGE FOLENA – Advogado; Doutor em Ciência Política, com Pós-Doutorado, Mestre em Direito; Diretor e Vice-Presidente da Comissão de Direito Constitucional do Instituto dos Advogados Brasileiros. É colunista e membro do Conselho Consultivo do jornal Tribuna da Imprensa Livre e dedica-se à análise das relações político-institucionais entre os Poderes Legislativo e Judiciário no Brasil.