Redação –
No apagar das luzes de 2019, a corregedoria nacional do Ministério Público arquivou 6 dos 23 processos contra o procurador da República Deltan Dallagnol. Chama atenção a proximidade dos horários em que as decisões foram publicadas no dia 19 de dezembro de 2019, último dia antes do recesso forense.
Os arquivamentos, assinados pelo corregedor Rinaldo Reis Lima, ocorreram com alguns segundos de diferença.
A maioria das reclamações são baseadas conversas entre procuradores e autoridades que foram divulgadas pelo site The Intercept Brasil. Duas delas foram ajuizadas pelo senador Renan Calheiros (MDB) e pela Associação Brasileira de Juristas pela Democracia (ABJD), que pediam a apuração de investigações informais pelos procuradores contra ministros do Supremo Tribunal Federal.
De acordo com as conversas, Deltan tentou conectar o ministro Dias Toffoli aos casos de corrupção alvo da operação e a procuradora Thaméa Danelon, do MPF em São Paulo, colaborou com a redação de um pedido de impeachment do ministro Gilmar Mendes.
Ao analisar os pedidos, o corregedor considerou incerta a existência das conversas e não descartou a possibilidade de adulteração das mensagens. Neste contexto, disse, a prova é estéril para apuração disciplinar.
O corregedor também levou em conta que não houve autorização judicial para a interceptar os celulares dos procuradores e, por isso, as mensagens são “ilícita e criminosa, o que a torna inútil para a deflagração de investigação preliminar. Reconhecimento, no caso, da imprestabilidade da prova ilícita por derivação (Teoria dos ‘frutos da árvore envenenada’).”
Palestras e fundo bilionário
Outra reclamação tratava de atuação irregular. Deltan fez uma palestra remunerada no valor de R$ 33 mil para uma empresa citada em acordo de delação na “lava jato”. Neste caso, o corregedor entendeu que não havia comprovação de conflito de interesses. Além disso, afirmou que o ato de dar palestras remuneradas “não se configura em ilícito disciplinar”, conforme julgado do CNMP.
Outro alvo de reclamação foi o acordo da Petrobras que previa a criação de uma fundação bilionária que seria gerida pelos integrantes do consórcio formado em torno da 13ª Vara Criminal Federal de Curitiba.
Apresentada por deputados do PT, a reclamação também questionava a parceria com o advogado Modesto Carvalhosa que, como mostrou a ConJur, era sócio da “lava jato” no fundo.
De acordo com o corregedor, porém, a questão já foi analisada e arquivada pela Corregedoria-Geral do MPF. “Múltiplos elementos suportam a boa-fé na condução dos atos que levaram ao Acordo questionado, mesmo que equivocada a fixação da destinação dos valores a serem revertidos ao Brasil”, entendeu o corregedor.
O acordo foi problemático desde que anunciado. Após tantos questionamentos, a própria força-tarefa deu um passo para trás e decidiu suspendê-lo.
Os efeitos foram realmente suspensos por decisão do ministro Alexandre de Moraes, do STF, que entendeu que tratava-se de “medida precária implementada por órgão incompetente”. Há ainda quatro processos no Tribunal de Contas da União que pedem esclarecimentos sobre fundo.
Procurada, a assessoria de imprensa do CNMP não se manifestou sobre as decisões.
Efeito dos vazamentos
As reclamações apresentadas ao CNMP contra Deltan ganharam coro depois que o site The Intercept Brasil publicou conversas dos procuradores de Curitiba com autoridades, como Sergio Moro, à época juiz e hoje ministro da Justiça.
Em números, enquanto 2016 e 2017 foram abertos quatro processos contra ele (dois em cada ano), em 2018 foram sete. Mas o salto aconteceu mesmo em 2019, quando foram registrados 23 processos, três deles correndo em sigilo, sob os números: 1.00214/2019-85, 1.00579/2019-37 e 1.00589/2019-81. Dois desses questionam o fundo bilionário com dinheiro da Petrobras. O terceiro aponta violação de sigilo funcional.
Até hoje o procurador foi punido em um processo. Nele, o CNMP decidiu aplicar uma advertência por críticas feitas ao Supremo Tribunal Federal. Os conselheiros seguiram o voto do relator, que afirmou que ocupantes de cargo público tem direito à honra, “mas tal proteção deve levar em conta um limite mais largo de tolerância à crítica para a garantia de uma democracia pluralista”.
Nas redes sociais, o procurador afirmou que a advertência “não reflete o apreço que tenho pelas instituições”. Ele defendeu que as críticas às decisões do STF fazem parte do exercício da liberdade de expressão e crítica.
Clique aqui, aqui, aqui, aqui, aqui e aqui para ler as decisões.
Fonte: ConJur, por Fernanda Valente
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