Por Luiz Carlos Prestes Filho

Natural de São Gabriel da Cachoeira, na Amazônia, Carlos Tucano é o Cacique da Tribo Maracanã, que reúne 22 famílias, cerca de 70 pessoas. Para ele o momento é muito difícil: “Primeiro, por ter que viver numa aldeia vertical, em apartamentos de 40 m² no bairro do Estácio. Estamos aqui longe da natureza, dos rios, dos peixes, das montanhas, das caças, das nossas ocas. Em segundo lugar, pela indefinição das políticas públicas estaduais e federais para com nossas outras tribos localizadas em Paraty, Sapucaia, Maricá e Itaipuaçú. Falta tudo para meus irmãos. Desde água, energia elétrica, até escolas.”

A pandemia colocou todas as tribos em estado de alerta. Pois, o nível de imunidade dos indígenas é muito baixo: “Em outras épocas, através de campanhas de saúde vencemos o sarampo e a coqueluche. Mas a Covid 19 criou um ambiente de risco alto. Em Angra dos Reis o Cacique Domingos Benites foi infectado, passou pela UTI e hoje ainda continua hospitalizado. Na sua tribo são mais de 30 infectados! Isso acontece por que índio nunca usou qualquer tipo de máscara ou proteção. Nossa tradição diz que devemos ficar livres, quanto menos fechar o corpo melhor.”

No Estado do Rio de Janeiro são seis aldeias guaranis e uma pataxó. Com a criação do Conselho Estadual dos Direitos Indígenas (CEDIND), presidido por Carlos Tucano, no âmbito da Secretaria de Estado de Direitos Humanos e Políticas para Mulheres e Idosos (SEDHMI), as comunidades indígenas passaram a ser visualizadas. Constituído por representantes indígenas indicados por aldeias localizadas no Estado e por associações e organizações indígenas em contexto urbano, o CEDIND trouxe uma esperança para solução de problemas existentes faz 500 anos: “Desejamos de volta o logradouro do antigo Museu do Índio, junto ao Estádio do Maracanã. Aquele espaço era nosso e deve continuar conosco. Quero deixar claro que não sentimos revolta por tudo que os povos indígenas sofreram e sofrem, sentimos amor por nossa terra. Quem sabe existe a possibilidade de sanear o rio Maracanã, organizar uma ampla campanha para o plantio de árvores nativas junto aquele local histórico e simbólico. Claro que é difícil imaginar a volta dos peixes e dos animais selvagens. Mas reverenciar a Mãe Natureza nunca é tarde. Veja como a Mãe Natureza está nos chamando nesses últimos quatro meses de isolamento social.

O Cacique entende que seria muito importante que a sociedade, através das lideranças empresariais e governamentais desenvolvessem projetos voltados para o empreendedorismo indígena: “Nossos povos não tem mais como sobreviver do artesanato. Um arco e flecha vendemos por R$15,00, um apito por R$10,00 e um chocalho original pode chegar a R$20,00. Esses são os preços básicos de nosso artesanato. Isso nunca vai permitir estruturar a vida de uma família, mesmo reunida num projeto coletivo de uma aldeia. Temos que pensar grande. Buscar a independência econômica de nossas comunidades.”

Em janeiro de 2013 o editor Daniel Mazola (então Secretário da Comissão de Defesa da Liberdade de Imprensa e DH da ABI) esteve juntamente com o incansável Dr. Modesto da Silveira por duas vezes na Secretaria de Assistência Social e DH do Estado do RJ em apoio ao Cacique da Tribo Maracanã, Carlos Tucano, para negociar uma alternativa em relação à demolição do antigo prédio do Museu do Índio no Complexo do Maracanã e a realocação dos habitantes, que flutuavam entre 50 e 100 indígenas de 17 etnias. Infelizmente não houve acordo com o Governo. Na foto, durante a coletiva de imprensa, Mazola está de pé, é o segundo da esquerda, Modesto está de óculos no centro e Carlos Tucano na direita (Reprodução/Google)

No Rio de Janeiro os indígenas reivindicam a necessidade de valorização do nome do Cacique Aimberê, líder da Confederação dos Tamoios, que morreu lutando contra o invasor colonial: “Ao Aimberê todas as nossas homenagens. Entendemos este guerreiro ser o primeiro Herói Nacional. Temos que erguer um monumento a ele na Praça 15 de Novembro. Local de onde ele comandou a resistência contra os portugueses, dirigidos pelo cruel Estácio de Sá. Seria importante, neste contexto de resgate do passado, valorizar as toponímias indígenas do Rio de Janeiro. Explicar sempre que Seryjipe era a denominação da Ilha de Vilegagnon; Macarajás, a Ilha do Governador; Paranaruã, a Lagoa Rodrigo de Freitas e Pau-nd-Açu-qua o nosso querido Pão de Açúcar. Por trás das toponímias histórias e lendas de nossos ancestrais que não podem ser esquecidas.”

Este ano todos os eventos indígenas no Rio de Janeiro foram cancelados. Nem a Semana do Índio que acontece em abril pôde ser comemorada. Pelo visto 9 de agosto, o Dia Mundial dos Povos Indígenas, também será silenciado: “Nossa OCA no Parque Lage continua em pé. Para nós foi uma grande vitória manter ela protegida para a realização de grandes eventos relacionados com a nossa cultura. Faz alguns anos que reunimos dentro dela e no entorno, representantes de mais de 200 tribos do Brasil inteiro. Momento de valorização e de celebração da diversidade étnica brasileira. Tenho certeza que no ano que vem voltaremos para aquele local com a bondade que carregamos no coração. Quem sabe poderei trazer da minha terra um tucurané e servir aquele ensopado inesquecível de minha mãe?


LUIZ CARLOS PRESTES FILHO – Cineasta, formado na antiga União Soviética. Especialista em Economia da Cultura e Desenvolvimento Econômico Local, colunista do jornal Tribuna da Imprensa Livre. Coordenou estudos sobre a contribuição da Cultura para o PIB do Estado do Rio de Janeiro (2002) e sobre as cadeias produtivas da Economia da Música (2005) e do Carnaval (2009). É autor do livro “O Maior Espetáculo da Terra – 30 anos do Sambódromo” (2015).