Redação

São falsas as alegações de que o cacique Raoni Metuktire tenha dado um golpe na empresa The Body Shop e de que não more mais no Brasil. Intitulado “A farsa chamada Raoni”, um texto de autoria desconhecida ganhou visibilidade nas redes sociais ao ser compartilhado em três perfis diferentes no Facebook entre os dias 27 e 28 de setembro. A publicação sugere que o líder indígena usou US$ 10 milhões que teriam sido doados pela empresa de cosméticos inglesa para comprar carros de luxo e máquinas de garimpo. Tudo falso.

Para checar as informações, o Estadão Verifica entrou em contato com o coordenador-geral do Instituto Raoni, Edson Santini, que desde 2009 é responsável pela contabilidade da organização e nega qualquer repasse dos valores mencionados. Também procurada, a The Body Shop no Brasil divulgou nota na qual afirma desconhecer “as informações recentemente expostas em grupos de WhatsApp”.

THE BODY SHOP – O texto afirma que Anita Roddick, fundadora da The Body Shop, determinou que a empresa não abrisse nenhuma loja no Brasil “por conta da maior decepção da sua vida”, e acrescenta que a marca só chegou ao Brasil após a morte da empresária, em 2017.

Anita, porém, faleceu dez anos antes, em 2007, e a marca chegou ao país em 2014, após uma parceria com a rede brasileira Empório Body Store. Em setembro de 2017, foi comprada pela Natura Cosméticos.

A publicação cita ainda que a “desoladora experiência” está descrita em um dos livros publicados pela empresária. Em Business as Unusual — The Triumph of Ann Roddick (disponível na Open Library), Raoni nem sequer é mencionado. O livro cita, sim, a experiência da empresária no Brasil, mas relata apenas o encontro com dois líderes caiapós: Paulinho Paiakan e Pykative Pykatire.

FAKE NEWS – Os dois eram líderes de uma região ao sul do Pará, enquanto Raoni é de uma aldeia na terra indígena no norte de Mato Grosso. Outra informação equivocada é a de que Raoni seria da “tribo yanomami”  – presente nos Estados de Roraima e Amazonas –, quando na verdade, ele é caiapó, grupo indígena dos Estados de Mato Grosso e Pará.

Há informações erradas também no seguinte trecho: “Encantada com toda aquela natureza e após tomar banho pelada no rio Negro em companhia das índias (imagina isso na cabeça de uma inglesa), ela determinou que a sua empresa realizasse doações de 10 milhões de dólares através da ONG Cobra Coral para comprar remédios e instalar ambulatórios e escolas nas comunidades indígenas”. A tribo de Raoni está localizada na bacia do Xingu, e não no rio Negro.

MAIS ERROS – Já a “ONG Cobra Coral” parece ser referência à Fundação Cacique Cobra Coral, instituição fundada por Ângelo Scritori, já falecido, que se apresentava como médium. Procurada pela reportagem, a fundação não se posicionou sobre o assunto.

A única organização diretamente ligada ao cacique é o Instituto Raoni, fundado em 2001, com sede no município de Peixoto Azevedo (MT). A instituição é responsável por gerenciar projetos nas áreas de monitoramento, fiscalização e vigilância de terras indígenas, geração de renda e sustentabilidade na cadeia produtiva. Edson Santini, coordenador-geral do instituto, afirma que o financiamento se dá por editais e pelo Fundo Amazônia.

ATAQUES AO CACIQUE – Desde o discurso na Assembleia-Geral da Organização das Nações Unidas, os ataques do presidente Jair Bolsonaro ao cacique Raoni têm ganhado repercussão. Mais recentemente, ele afirmou que o líder indígena “não fala por todos os índios“. Em outra ocasião, Bolsonaro disse que Raoni foi “cooptado” por chefes de Estado.

Em nota oficial a empresa The Body Shop diz que desconhece as informações recentemente expostas em grupos de WhatsApp e esclarece que Dame Anita Roddick, fundadora da companhia, foi pioneira no segmento de beleza sustentável no mundo. A The Body Shop já comprou óleo de castanha de uma etnia na Amazônia brasileira, assim como já o fez em outros países.

Hoje a The Body Shop conta com diversas comunidades produtoras de ingredientes no mundo todo, incluindo o Brasil com a comunidade de óleo de babaçu na região do Lago do Junco, no Maranhão, relação essa que existe há mais de 20 anos. (fonte: Estadão, por Marina Cardoso)