Por Lincoln Penna –
Segundo dados da Central Nacional de Denúncias da Safernet houve um aumento de 67,5% de denúncias de crime de ódio na internet.
Grande parte deles referentes à misoginia, xenofobia, racismo, lgbtfobia e neonazismo; o que demonstra uma estarrecedora manifestação de intolerância a alimentar tais atitudes que vêm se tornando cada vez mais frequentes em nosso cotidiano.
E esse crescimento vem desde o término do processo eleitoral marcado por sua vez por inúmeros comportamentos agressivos nas redes sociais de modo a fomentar a ira contra opiniões divergentes daqueles instigadores e fomentadores dessas atitudes. Mas, com o fim do último pleito esse quadro não arrefeceu. Parece até que ao contrário ele não só se manteve ativo como incorporou-se de vez nas relações sociais. Isso não acontece por acaso, o que nos convida a examinar os seus fatores desencadeantes.
Essa situação, porém, não se limita ao Brasil e tampouco à América Latina em geral, também às voltas de processos eleitorais em curso. Existe uma forte tendência em todo o mundo a se trocar os procedimentos usuais das disputas políticas e ideológicas pelas ações truculentas, quase sempre movidas por atos violentos com vistas a intimidar quem pensa diferentemente.
E esse quadro universalizado tem sido igualmente praticado ao nível das relações internacionais a envolver velhas e novas querelas e contenciosos que até então eram tratados pelos canais diplomáticos, mais recentemente enfrentados por meios de confrontação armada, seja no plano coletivo dos Estados nacionais ou nas disputas individuais. Dessa forma, as mediações político-diplomáticas de negociações foram substituídas pela agressão pura e simples na resolução dos conflitos.
O que vem acontecendo na Ucrânia e Rússia, quando esta desencadeou a operação intervencionista militar naquele país, e agora mais recentemente com Israel respondendo muito além de uma eventual defesa ao agir de forma genocida contra as populações palestinas em Gaza só nos conduz a crer que estamos sendo monitorados por uma política de ódio generalizado.
Mesmo no que se passa nas grandes e médias metrópoles não há dúvida de que se assiste a uma escalada dessa prática política centrada no ódio por parte das forças militares, no desprezo pelo ser humano, na fuga das responsabilidades ao justificarem tais ações como indispensáveis à “segurança pública” em face das organizações criminosas, de tal modo como se essas ações repressores não diferissem dos atos semelhantes àqueles cometidos pelos próprios criminosos. Logo, se igualam aqueles a quem reprimem a cometerem crimes de porte similar. Já tive ocasião de comentar essa comparação com o que se passa no mundo, mas nunca é demais ressaltar a existência de uma clara analogia tendo em vista a presença de uma lógica a governar essas ações. E ela se respalda, a meu ver, nessa política do ódio.
A aparição dessa política explica os fenômenos do recrudescimento do fascismo, até então tratado ora como uma “nova direita”, ora como uma expressão de um “neoconservadorismo”. Na verdade, trata-se, sem rodeios, de um ressurgimento mesmo dos métodos e práticas políticas típicas do fascismo realimentado pela crise estrutural do capitalismo, pois sua origem e suas mais recentes manifestações muito tem a ver com os problemas decorrentes desse modo de produção.
Da mesma maneira pode-se associar o surgimento de figuras de uma suposta antipolítica representada por Trump nos EUA, Bolsonaro e Viktor Orbán, na Hungria, e agora o candidatíssimo à presidente da Argentina, Javier Milei, como encarnações típicas dessa nova modalidade de reaver os fundamentos do fascismo original, sem que se assumam como tal. Afinal, o apelo à pátria, família e a propriedade mascaram o caráter intolerante que trazem consigo a despertar esperança junto a um eleitorado geralmente cansado e desiludido de tantas promessas não cumpridas.
Mais do que nunca é preciso um movimento mundial a contemplar primeiramente a paz entre os povos, a despeito das diferenças em disputas em torno de estratégias geopolíticas entre os estados de grande influência nas relações internacionais, para em seguida firmarmos o compromisso de erradicar a política do ódio, que só nos conduz à barbárie. Para tanto, indispensável se torna o fortalecimento de uma comunhão de forças sociais e políticas irmanadas em torno da defesa dos valores humanitários e civilizatórios, sem o que apressaremos o nosso fim como sociedade plural e como espécie após tantas omissões cometidas ao longo do tempo.
Por falar em tempo, ele pune na mesma medida em que se desprezam os apelos pela retomada da racionalidade no trato da vida pública. As políticas usurárias, egoístas, personalistas, arrogantes, mesquinhas, e um sem-número de adjetivações não podem continuar à conduzir as nações e seus povos sob pena do tempo a exigir soluções imediatas de harmonização entre o ser humano e a natureza deixar desde já a minar a própria capacidade de nos unir por algo muito mais importante do que as nossas convicções políticas e os nossos interesses por mais justos que sejam.
É o que se passa mais presentemente no caso da tese de autodefesa do estado de Israel, que consiste para os seus adeptos em atacar e reduzir à pó os membros do Hamas. A consequência dessa política movida pelo revanchismo odiento é o genocídio de um povo e de suas parcelas mais vulneráveis constituídas por crianças e idosos, sobrepondo-se a todo bom-senso absolutamente varrido dos que agem tendo como motivação essa política do ódio.
Finalizo lembrando Mahatma Gandhi. Dizia ele: “Não existe um caminho para a paz. A paz é o caminho”. Ao traduzir para a difícil empreitada a nos levar para um mundo bem melhor do que estamos a viver, diria o seguinte: o está em jogo é termos como estímulo uma utopia a ser cultivada permanentemente qual seja a prevalência da paz como instrumento de conquista, que nos possibilite alcançar a justiça social universal, sem esta estaremos enterrando as nossas esperanças de um mundo melhor.
LINCOLN DE ABREU PENNA – Doutor em História Social pela Universidade de São Paulo (USP); Conferencista Honorário do Real Gabinete Português de Leitura; Professor Aposentado da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ); Presidente do Movimento em Defesa da Economia Nacional (MODECON); Vice-presidente do IBEP (Instituto Brasileiro de Estudos Políticos); Colunista e Membro do Conselho Consultivo do jornal Tribuna da Imprensa Livre.
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