Por José Carlos de Assis

É infinita a capacidade da grande mídia brasileira de naturalizar o absurdo. As entrevistas que Paulo Guedes está concedendo nesses dias de crise generalizada estão na fronteira da idiotice mais absoluta. Nada tendo para dizer em termos concretos para enfrentar a situação, decidiu agarrar-se à imbecilidade pura e simples de uma teoria fantasmagórica, segundo a qual a saída da crise seria a união dos poderes, não se sabe exatamente para quê. O grande cacique neoliberal, em outros tempos tão arrogante, revela-se totalmente perdido.

Sem saber o que fazer, Guedes apela para as “reformas”. Não há nenhuma contribuição possível que a reforma tributária e a reforma administrativa venham a dar no sentido de reverter a crise. Tudo é pura empulhação. Mesmo que fosse possível aplicar as reformas para reduzir a crise, isso não seria possível porque não há tempo em termos de tramitação das medidas no Congresso, aonde os projetos sequer chegaram. Entretanto, a mídia insiste em levar Guedes a sério, enquanto os mercados desabam.

Outro mistificador é o secretário do Tesouro Nacional, Mansueto Almeida. Este fala em ajuste fiscal num ambiente de extrema recessão. O pobre Keynes deve estar dando voltas no túmulo. Numa recessão, segundo o gênio de Keynes, a única saída para a crise é o aumento do gasto público, inclusive do gasto deficitário. Ajuste fiscal é veneno para uma economia em depressão, como é o caso de uma economia para a qual estamos caminhando. A mídia estúpida não consegue entender isso. Naturaliza a estupidez do ministro e seu secretário.

Mansueto é drasticamente contrário ao pagamento de 20 bilhões aos aposentados aprovado pelo Congresso. Guedes anunciou que vai ao Supremo para derrubar a medida. Os dois adoram ajuste fiscal. Como são a nata dos economistas brasileiros imbecis, recorrem a outra imbecilidade, a Lei de Responsabilidade Fiscal, para impedir o pagamento. Se não tiverem apoio do Supremo, Mansueto descobriu o pulo do gato: vai antecipar os pagamentos do próximo ano para o ano atual, fazendo uma pequena ginástica fiscal.

Ouviram bem? Não seria isto uma pedalada fiscal? Lembram-se, pedaladas fiscais não seria o crime com que Mansueto carimbou Dilma Rousseff para justificar seu impeachment? Então pedalada fiscal vale para Bolsonaro mas não vale para Dilma. No caso dela, vale um impeachment. Lamento tudo isso porque, tanto no caso da Presidente e no caso de Bolsonaro, o que chamaram de pedalada fiscal é uma boçalidade. O que me incomoda é a hipocrisia. Sobretudo a hipocrisia que, no caso de Dilma, esteve a serviço dos ricos contra os pobres.


JOSÉ CARLOS DE ASSIS  é jornalista, economista, escritor e doutor em Engenharia de Produção pela Coppe/UFRJ, autor de mais de 20 livros sobre economia política. Colunista do jornal Tribuna da Imprensa Livre. Foi professor de Economia Internacional na Universidade Estadual da Paraíba (UEPB), é pioneiro no jornalismo investigativo brasileiro no período da ditadura militar de 1964. Autor do livro “A Chave do Tesouro, anatomia dos escândalos financeiros no Brasil: 1974/1983”, onde se revela diversos casos de corrupção. Caso Halles, Caso BUC (Banco União Comercial), Caso Econômico, Caso Eletrobrás, Caso UEB/Rio-Sul, Caso Lume, Caso Ipiranga, Caso Aurea, Caso Lutfalla (família de Paulo Maluf, marido de Sylvia Lutfalla Maluf), Caso Abdalla, Caso Atalla, Caso Delfin (Ronald Levinsohn), Caso TAA. Cada caso é um capítulo do livro. Em 1983 o Prêmio Esso de Jornalismo contemplou as reportagens sobre o caso Delfin (BNH favorece a Delfin), do jornalista José Carlos de Assis, na categoria Reportagem, e sobre a Agropecuária Capemi (O Escândalo da Capemi), do jornalista Ayrton Baffa, na categoria Informação Econômica.