Por José Carlos Assis –
A agenda de Javier Milei, o candidato presidencial que venceu as primárias, está exatamente na mesma linha de Carlos Menem.
O povo argentino não aprende as lições da História. Segue novamente para uma experiência neoliberal. Mais de três décadas atrás, com a eleição de Carlos Menem para a Presidência da República, o país embarcou na aventura das privatizações exacerbadas, da paridade cambial e das políticas fiscal-monetárias restritivas, tornando-se objeto de aplauso do FMI, do Fórum de Davos e do Consenso de Washington. Seguiu-se uma tragédia econômica e social que perdura ainda hoje.
A agenda de Javier Milei, o candidato presidencial que venceu as primárias, está exatamente na mesma linha de Menem, embora com retórica neoliberal ainda mais radicalizada. É muito fácil prever o que acontecerá. Com a profunda crise econômica herdada justamente do menismo fracassado, os argentinos vão para as eleições enfurecidos com os políticos, mobilizados pela ideia de votar contra eles, e não por um projeto nacional. A perspectiva é de uma revolução social e política.
Eleições geram expectativas positivas, mesmo quando não há propostas racionais por parte dos candidatos, mas apenas demagogia e paixão. E os argentinos são apaixonados por natureza. No caso do legado de Menem, décadas atrás, eles votaram no que lhes parecia a proposta oposta ao governo neoliberal, representada por De La Rúa. Era o voto do contra. Na metade do mandato, De La Rúa foi derrubado por uma rebelião popular e teve de fugir da Casa Rosada de helicóptero.
Não foi surpresa. Dezenas de milhares de pessoas mobilizaram-se para grandes protestos de rua, a polícia foi acionada, matou 35 e feriu centenas. Eram os eleitores frustrados pelas promessas eleitorais do Partido Radical. Não se pense, agora, que um candidato de extrema direita, na Argentina enfurecida pela crise econômica e social, terá melhor sorte que De La Rúa, caso ele ganhe as eleições. Terá o mesmo destino dele, e nossos vizinhos confirmarão o ciclo terrível de revoluções e crises.
Não há paralelo com o Brasil recente. Não obstante a experiência neoliberal “leve” do período de Fernando Henrique, os dois primeiros governos de Lula colocaram o país em relativa ordem, só anarquizado pelo golpe contra Dilma. Daí em diante, o radicalismo neoliberal de Temer/Bolsonaro/Guedes foi amenizado pela expectativa da volta de Lula ao poder. E o presidente reeleito está conseguindo superar as travas que seus antecessores colocaram para sabotar seu governo.
A vitória de Milei não significa sua entronização eventual no poder. Tendo 30% dos votos, há ainda cerca de 70% a serem disputados, considerando-se direita (não a extrema), centro e esquerda. Entretanto, o susto das primárias se justifica, dadas as condições sociais e econômicas do país. A Argentina está com 116% de inflação e com terríveis problemas sociais, derivados do menismo e de mais de três anos de seca, que deterioraram fortemente as safras agrícolas. Isso tem óbvias consequências eleitorais.
Sergio Massa, candidato do peronismo tradicional, está em segundo lugar nas primárias pelos votos individuais, e em terceiro no total (27%). Ele amarga um pesado ônus por ser o atual ministro da Economia num país dominado pela inflação. O segundo lugar fica com Patrícia Bullrich e Horário Larreta, juntos, com 28%, sendo que dificilmente essa coligação se aliará aos peronistas. Com isso, as perspectivas de Milei são indiscutivelmente mais favoráveis a uma vitória.
Esse aliado de Bolsonaro propõe-se a levar o neoliberalismo a extremos. Promete privatizar a educação, a saúde, a Previdência e liberar o transplante de órgãos entre seres humanos vivos, ao lado de outras barbaridades. Nada disso ajuda a melhorar a situação objetiva do povo. Não é difícil prever, portanto, que num país de tradição de rebeliões populares e eleitores enfurecidos, como a Argentina, Milei terá na presidência uma vida ainda mais curta que a de De La Rúa.
Quem viver verá!
JOSÉ CARLOS DE ASSIS – Jornalista, economista, doutor em Engenharia da Produção, autor de mais de 25 livros de Economia Política e introdutor do jornalismo econômico investigativo no Brasil com denúncias de escândalos sob o regime militar que contribuíram de forma decisiva para o desgaste da ditadura nos anos 80. Em função das boas práticas profissionais recebeu em 2019 o Prêmio em Defesa da Liberdade de Imprensa, Movimento Sindical e Terceiro Setor, parceria do jornal Tribuna da Imprensa Livre com a OAB-RJ.
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