Por Siro Darlan

No Brasil, a presença de pessoas negras no judiciário ainda é muito baixa.

O atual Presidente do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro tomou posse prometendo não perseguir ninguém e buscar a paz entre os seus pares. Tive a ideia de convidar para a posse um grupo de advogados e advogadas negras da Comissão da Verdade sobre a Escravidão no Brasil. A ideia foi concretizada quando quase cem advogados, advogadas e membros da CEVENB compareceu para prestigiar a posse, antes restrita à fidalguia branca e colonial.

A presença de um número tão elevado de negros e negras causou o mesmo rebuliço que causam quando a polícia deles se aproximam. Não foi diferente com os “seguranças” do Tribunal. Acostumados a olhar para o outro com o histórico preconceito, reservaram para eles um lugar separado do espaço onde se realizada a posse. Colocados em um gueto para assistir a solenidade pelo telão, vários deles tinham vindo de quilômetros de distância e não se conformaram. Como membro da Corte procurei corrigir o erro trazendo-os para o salão principal. Logo depois o próprio cerimonial vendo tantas cadeiras vazias convidou os poucos que ainda estavam no Órgão Especial assistindo pelo telão foram convidados a entrar e assistir a posse ao vivo.

Mas a força do preconceito foi maior e os seguranças agrediram duas idosas senhoras causando um tumulto que incomodou os nobres. Dirigi-me ao local e logo restabelecemos a ordem e a cerimônia teve continuidade. Enquanto as senhoras eram atendidas no Departamento Médico do Tribunal. Terminada a posse, a confraternização foi geral e irrestrita, como mostram as fotos e filmagens.

Mas o mesmo presidente que discursara dizendo buscar a paz e o entendimento enviou para o CNJ um relatório, onde sou acusado “de que o desembargador informou aos agentes da SGSEI que não tocassem nas manifestantes, pois elas tinham o pleno direito à livre expressão”. E que “as manifestantes eram convidadas do desembargador Siro Darlan e por ele teriam sido autorizadas a acessar o interior do pleno”. Ora a lei não autoriza que ninguém seja agredida, muito menos senhoras que prestigiaram a posse, e quem diz que “é livre a manifestação do pensamento e a procura, o recebimento e a difusão de informações ou ideias, por qualquer meio, e sem dependência de censura” é o texto da própria Constituição que juramos cumprir e fazer cumprir.

Infelizmente, o racismo estrutural ainda é uma realidade no sistema judiciário em muitos países, inclusive no Brasil. Dados mostram que a população negra está sub-representada em cargos de poder no judiciário e também é mais frequentemente alvo de discriminação e injustiças no sistema.

Um estudo realizado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) em 2020 mostrou que, apesar de representarem mais de 56% da população brasileira, os negros ocupam apenas 30,2% dos cargos no Judiciário. Além disso, o estudo apontou que a desigualdade racial é maior em cargos de chefia, onde apenas 19,3% dos ocupantes são negros.x

Outro dado preocupante é que os negros são maioria entre os presos no sistema carcerário brasileiro. Segundo o Ministério da Justiça e Segurança Pública, em 2020, a população carcerária do Brasil era de cerca de 750 mil pessoas, das quais 61% eram negras.

Esses dados mostram a necessidade de políticas de ação afirmativa e medidas de combate ao racismo no sistema judiciário, a fim de garantir a representatividade e a justiça para a população negra.

Em muitos países, incluindo o Brasil, existe uma preocupação com a falta de diversidade e representatividade no judiciário. Estudos indicam que pessoas negras são sub-representadas nesse setor em muitos países, e que isso pode ter um impacto significativo na justiça e nas decisões judiciais.

No Brasil, a presença de pessoas negras no judiciário ainda é muito baixa. De acordo com o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), em 2020, apenas 22,3% dos magistrados brasileiros se declararam negros ou pardos. Isso significa que a maioria dos juízes e desembargadores brasileiros é composta por pessoas brancas. A situação é ainda pior em cargos de liderança, como presidências de tribunais e corregedorias, onde a presença de pessoas negras é ainda menor.

A falta de diversidade no judiciário pode ter várias consequências negativas, incluindo a perpetuação de estereótipos e preconceitos, a falta de compreensão das experiências e necessidades de grupos minoritários, e uma falta de confiança da população no sistema judiciário.

É importante que as instituições jurídicas trabalhem para aumentar a diversidade e a representatividade no setor, de modo a garantir uma justiça mais justa e equitativa para todos.

SIRO DARLAN – Editor e Diretor do Jornal Tribuna da imprensa Livre; Juiz de Segundo Grau do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ); Especialista em Direito Penal Contemporâneo e Sistema Penitenciário pela ENFAM – Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados; Mestre em Saúde Pública, Justiça e Direitos Humanos na ENSP; Pós-graduado em Direito da Comunicação Social na Universidade de Coimbra (FDUC), Portugal; Coordenador Rio da Associação Juízes para a Democracia; Conselheiro Efetivo da Associação Brasileira de Imprensa; Conselheiro Benemérito do Clube de Regatas do Flamengo; Membro da Comissão da Verdade sobre a Escravidão da OAB-RJ; Membro da Comissão de Criminologia do IAB. Em função das boas práticas profissionais recebeu em 2019 o Prêmio em Defesa da Liberdade de Imprensa, Movimento Sindical e Terceiro Setor, parceria do Jornal Tribuna da Imprensa Livre com a OAB-RJ.

Envie seu texto para mazola@tribunadaimprensalivre.com ou siro.darlan@tribunadaimprensalivre.com


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