Por Ricardo Cravo Albin –
“Os remédios mais amargos são os que curam mais rápido.” (John Locke)
A incorporação de palavras estrangeiras por nosso vernáculo pode ocorrer de duas maneiras, através do aportuguesamento ou da utilização de sua grafia original. A palavra mais ouvida este ano será certamente “lockdown” – cuja origem se localiza no inglês antigo da união das palavras “loc” e “down”, que definia o ato de manter os prisioneiros em suas celas. Hoje, o termo é universalmente empregado para definir protocolos diversos de isolamento de pessoas, cidades e até mesmo países, para evitar a propagação do coronavírus e o colapso do sistema de saúde. A tradução literal para o português é confinamento ou bloqueio, estratégia para interditar vias e todas suas vizinhanças como comércio e demais lugares públicos, além de transportes e viagens não essenciais. É uma das medidas mais extremas, que vem sendo aplicada com êxito por muitos países.
O debate no Brasil se centra nesta semana sobre a ação impetrada no STF por Bolsonaro contra três governos estaduais que a adotaram, Pará, Pernambuco e Rio Grande do Norte.
A ação decorreu da não aceitação do Presidente pelo isolamento social, textualmente explicitada à claque do Palácio da Alvorada dias antes com a frase: “tem alguns idiotas que até hoje ficam em casa.” Na cabeça do Capitão a economia sofre apenas por causa das medidas de restrição decretadas por prefeitos e governadores, também os únicos culpados, segundo ele, pela tragédia de quase meio milhão de vítimas fatais, eles sim, os dirigentes regionais, a serem responsabilizados pela CPI em marcha. O fato é que pesquisas científicas também desprezadas pelo chefe do executivo com desdém atestam o que enumero abaixo:
1- O Imperial College de Londres avaliou medidas restritivas mais radicais em onze países europeus, que reduziram as taxas de contágio, com estimativa de 3,3 milhões de vidas salvas.
2- A revista Nature estudou a pandemia para concluir que os “lockdowns” retardaram 530 milhões de infecções em centenas de localidades.
3- Pesquisa recente em 200 países feita pela Applied Health Economics and Health Policy atenta que “lockdowns” são eficazes em reduzir o número de casos nos países que os aplicaram. E explicam que os divergentes, como Estados Unidos e Suécia, registraram taxas muito mais altas, por muito mais tempo.
4- Outras pesquisas da Revista Science no Brasil, avaliou que estados e municípios que impuseram restrições mais severas de confinamento foram contemplados com 60% de menos vítimas em relação aos lugares com menos distanciamento. Também do FMI chegam informações feitas por seus economistas que recomendam que o relaxamento de medidas e/ou aberturas da economia só devem ocorrer quando as infecções estiverem em queda, com políticas rigorosas de testagem e rastreamento. Tradução para empresários e economistas: enquanto as taxas de infecção e mortes forem altas, o risco provocado pelo empobrecimento continuará em crescendo.
A única solução será a vacinação em massa, o mais rapidamente possível. E os lockdowns não devem ser descartados, muito ao contrário.
A primeira ação do Capitão para impedir os governadores de se utilizarem do rigor do afastamento social já foi negada em março pelo Ministro Marco Aurélio. O pedido foi fundamentado pela AGU no fato de que os lockdowns afrontavam os direitos fundamentais do trabalho, à livre iniciativa e à subsistência da população. A tosca argumentação sequer cita a essência de manter-se o afastamento social, o impedir a propagação do vírus, a preservação da saúde pública e a empecer possíveis aumentos de casos de óbitos, já na estratosfera com meio milhão de vítimas.
Especialmente agora, com indicadores apontando para o recrudescimento da pandemia e até uma já comentada terceira onda, potencializada pela chegada do inverno e de novas cepas, como a indiana. Em meio a esse pandemônio, acaba de chegar a notícia de que o Presidente quer porque quer abrigar a Copa América. Que Argentina e Colômbia se recusaram a receber exatamente para evitar qualquer risco de agravamento de contaminação pandêmica de seus povos. As reações neste início de semana no meio político e na CPI foram imediatas. E muitos governadores já se declaravam contrários a liberar seus estados e estádios. O risco de multidões aglomeradas em estádios é absolutamente criminoso, no mínimo insensato e irresponsável.
Como também fora de quaisquer parâmetros o que acabo de ouvir na televisão do próprio Presidente ao dizer que os protestos do domingo último contra ele eram de uma tropa comunista, que jamais representaria o país.
Dizer que os comunistas não representam o país é verdade. Daí a afirmar que aquelas milhares de pessoas de norte a sul pelas ruas do Brasil são comunistas, vai distância abissal. Menos Presidente, menos…
P.S: Muito em breve o lançamento do livro: “Pandemia e Pandemônio – relatos indignados de um país doente e desgovernado”. Pela Editora Batel.
RICARDO CRAVO ALBIN – Jornalista, Escritor, Radialista, Pesquisador, Musicólogo, Historiador de MPB, Presidente do PEN Clube do Brasil, Presidente do Instituto Cultural Cravo Albin e Membro do Conselho Consultivo do jornal Tribuna da Imprensa Livre. Em função das boas práticas profissionais recebeu em 2019 o Prêmio em Defesa da Liberdade de Imprensa, Movimento Sindical e Terceiro Setor, parceria do Jornal Tribuna da Imprensa Livre com a OAB-RJ.
MAZOLA
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