Redação –
Os quatro decretos editados pelo presidente Jair Bolsonaro para flexibilizar as regras para aquisição de armas de fogo e munições no país que entraram em vigor nesta segunda-feira (12/4), ao inovarem na ordem jurídica, fragilizaram o programa normativo estabelecido pelo Estatuto do Desarmamento, que inaugurou uma política de controle responsável sobre o tema no território nacional.
Com esse entendimento, a ministra Rosa Weber, do Supremo Tribunal Federal, concedeu parcialmente liminar para suspender os trechos das normas que descomplicam a posse e porte de armas. A decisão passará por referendo pelo Plenário da corte.
A liminar foi concedida no âmbito de uma das três ações diretas de inconstitucionalidades ajuizadas contra os Decretos 10.627, 10.628, 10.629 e 10.630, que foram editados em 12 de fevereiro com previsão de entrada em vigor após 60 dias. A autoria da ADI é do Partido Socialista Brasileiro.
Com a decisão da relatora, estão suspensos os trechos que afastam o controle exercido pelo Comando do Exército sobre munição até calibre máximo de 12,7 mm; autorização para a prática de tiro recreativo em entidades e clubes de tiro, independentemente de prévio registro dos praticantes.
Também suspende a possibilidade de aquisição de até seis armas por civil e oito armas por agente estatal com simples declaração de necessidade, revestida de presunção de veracidade; a aquisição de munições por entidades e escolas de tiro em quantidade ilimitada; e a prática de tiro desportivo por adolescentes a partir dos 14 anos.
Por fim, a ministra impede que entre em vigor os trechos que desburocratizam as exigências de laudo de capacidade técnica para o manuseio de armas de fogo, aptidão psicológica para aquisição de arma de fogo, e prévia autorização do Comando do Exército.
“A medida privilegia a prudência, ao evitar que os decretos produzam seus efeitos mais nefastos e imediatos antes que o STF possa analisar sua constitucionalidade”, afirmou Rafael Carneiros, do Carneiros e Dipp Advogados, que representa o PSB na ação.
“Como já foi amplamente demonstrado, flexibilizar a compra e o uso de armas de fogo e munições no Brasil resultará no aumento de crimes violentos como assassinatos e feminicídios, além de representar uma ameaça à estabilidade institucional. A sociedade não tem nada a ganhar com isso”, acrescentou.
Atribuição presidencial
Além da ADI ajuizada pelo PSB, há outras ações contra os mesmos decretos presidenciais. Pela amplitude da discussão, a ministra decidiu adotar o primeiro caso como leading case. E só não analisou o inteiro teor do decreto porque, na petição inicial, a insurgência focou em apenas alguns dispositivos.
As ações foram ajuizadas pouco após a publicação dos decretos. Há uma semana, o PSB peticionou reforçando o pedido de liminar diante da entrada em vigor das normas, nesta segunda-feira. Citou clima de “ameaça institucional” que ronda o país, “sobretudo diante das reiteradas manifestações proferidas pelo Presidente da República conclamando sua base de apoio à defesa armada de seus ideais políticos”.
A ministra Rosa Weber ainda aponta a importância da atuação da presidência da República na função de editar decreto para bem cumprir a lei, como unção normativa secundária e subordinada à lei — no caso, o Estatuto do Desarmamento (Lei 10.826/2003). Em suma, não lhe cabe formular regras específicas.
“Esses atos estatais, ao inovarem na ordem jurídica, fragilizaram o programa normativo estabelecido na Lei 10.826/2003, que inaugurou uma política de controle responsável de armas de fogo e munições no território nacional”, concluiu a relatora.
Como os decretos de fevereiro de 2021 alteram de maneira inequívoca a Política Nacional de Armas, configuram “atividade regulamentar excedente do seu espaço secundário normativo”.
Defesa contra a criminalidade?
Ao analisar o caso, a ministra levou em consideração o resultado da CPI das Organizações Criminosas do Tráfico de Armas, que tramitou no Congresso em 2005 e 2006 e cujas conclusões vão ao encontro da ideia de que flexibilizar o controle de armas vai ajudar a combater a criminalidade. O relatório final apontou, por exemplo, que a maioria das armas usadas em crime foram desviadas de pessoas que as adquiriram legalmente.
“Todos os elementos informativos disponíveis aos Poderes Públicos para orientar a formulação de políticas públicas de controle de armas indicam a existência de uma inequívoca correlação entre a facilitação do acesso da população às armas de fogo e o desvio desses produtos para as organizações criminosas, milícias e criminosos em geral, através de furtos, roubos ou comércio clandestino, aumentando ainda mais os índices gerais de delitos patrimoniais, de crimes violentos e de homicídios”, disse.
Clique aqui para ler a decisão
ADI 6.675
Fonte: ConJur
MAZOLA
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