Por José Macedo

Artigo 5° da CF/1988 – “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no país a inviolabilidade de direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:…”.

Desde criança, ouvia falar da palavra democracia. Aos oito anos, meu pai levava-me a reuniões, sempre, semanais, na residência de amigos. No caminho de casa, a seu modo, eliminava minhas primeiras curiosidades.

Certamente, esses fatos motivaram-me à leitura, semente para minha formação, visão político-jurídica de democracia e de cidadania. São 02 horas, madrugada, de 07 a 08 de abril, estou escrevendo, lembro-me da figura do presidente, “democraticamente”, eleito com mais de 57 milhões de brasileiros. Nesse dia, morreram mais de 4.000 brasileiros, em função dessa peste (pandemia). O presidente ri, faz caretas para o regozijo de seus acólitos bajuladores e, ao final, imita uma pessoa morrendo sufocada. Certamente, saem dali para o final de sua macabra e mórbida “festa”. Então, concluo: esses brasileiros elegeram um psicopata, um genocida, sim! O pior: a maioria de seus apoiadores não sentem remorso e são incapazes de enxergarem seus erros. Resta-nos a lutar pela reconquista dos direitos perdidos. Sei de que, muitos escreveram sobre esse assunto, sinto-me bem, porque estou contribuindo para o debate e, quem sabe, para uma positiva reflexão. Nunca, discutiu-se tanto sobre democracia e direito. Essa observação é um indicador, o de que inexiste democracia. O titulo, objeto do presente texto, é uma provocação para a reflexão e para o debate. O artigo 5° da CF/1988, os direitos individuais e coletivos são ponto de partida para a compreensão das questões ou interrogações, ora suscitadas.

Existe democracia ? É um sonho? Em seu milenar conscrito cabe adjetivação? As respostas, que tentarei responder, estão no corpo do deste artigo, contidas no título, objeto do deste texto. A antiga Grécia foi o berço da democracia e seu embrião, precisamente, na Cidade-Estado, Atenas, no século VI, a.C. Em Atenas, o ponto de partida, a “democracia”, direta, onde, os cidadãos reuniam-se em Praça Pública, deliberavam suas decisões sobre a administração da “Polis” (urbis). Na prática, a democracia ateniense era limitada, excluía da fruição de direitos escravos, estrangeiros e as mulheres. A democracia e a cidadania nasciam, padecendo desses de vícios, distanciada de seu objetivo, de governo do povo. As contradições existiram em seu nascedouro. As mulheres, mesmo nascidas na polis não participavam da assembleia geral, não detinham direitos políticos, tampouco propriedades. Assim, foi na Grécia, do século VII, a.C. os ideais de Aristóteles que definiram o que seria “cidadania” foram subvertidos: O conjunto de direitos e deveres exercidos pelo indivíduo. Assim é que, na Idade Média e no Renascimento, a cidadania encontrou obstáculos para seu exercício. Os Reis eram considerados representantes divinos, eram incontestáveis, a “cidadania” deixou de existir, o poder era dividido de modo arbitrário. Nesse tempo, mudaram-se os métodos, os efeitos permanecem. Então, a partir do século XVII e sobretudo do século XVIII, com a Revolução Francesa, deu-se a transição para o capitalismo, a industrialização, ressurgiram a luta por direitos. Os indivíduos reiniciaram suas lutas pelo exercício e conquistas de direitos. As lutas que se seguiram não foram eficazes, foram fragmentadas e não ocorreram a homogeinização e unificação de plenos direitos, as exclusões persistem. A chamada democracia, sempre, esteve dependente e sob a influência do poder econômico, desde sua milenar e remota origem. As bandeiras definidoras da cidadania, o exercício pleno de direitos, à vida, à liberdade, à participação política, à saúde, à igualdade, à propriedade etc continuam.

Porém, democracia continua sendo um sonho, desejo inatingível, impossível, dada a natureza humana.

Com o sistema capitalista, que se retroalimenta da natureza humana materialista e competidora, os beneficiários são, numericamente, reduzidos, ficam no cume da pirâmide populacional. Assim é assistirmos a produção do apartheid social e econômico, a negação de cidadania. Nessa fragmentação de direitos, a democracia é objeto de adjetivação, enfim é a enganação, a farsa. O atual governo brasileiro distancia-se do povo e de seus diretos mais elementares. Os direitos primários, elencados no artigo 5° da CF/1988, não são contemplados. O relatório da Anistia Internacional, publicado, neste dia 07/04/2021, assusta-me, quando trata do Brasil e do governo Bolsonaro. As desigualdades sociais e econômicas, a violência, a saúde, o desemprego, a perda de direitos, estes conquistados com a luta e sangue de gerações confirmam minhas preocupações. Por isso escolhi o título deste texto. Há pouco tempo, o ministro da economia, Paulo Guedes, invocou o AI-5, como remédio para “conter as manifestações populares. O ministro não demonstrou vergonha, ao contrário escancarou sua face, deixou cair sua máscara, seu histórico de servidor da tenebrosa ditadura de Augusto Pinochet, falou em seu discurso de “democracia responsável”. Então, ouvimos as palavras de um diligente aluno do ditador Augusto Pinochet.

Quando faço minhas declarações sobre democracia, lembro-me do saudoso e exemplar, advogado de presos políticos, Sobral Pinto, dizia: “Não existe democracia relativa, não existe democracia à brasileira, a democracia é universal”. Entendo que, democracia com adjetivo pode ser tudo, menos democracia. A Anistia Internacional divulgou um preciso e assustador diagnóstico do Brasil atual. Somamos 17 milhões de brasileiros com insegurança alimentar e 19 milhões na miséria, os direitos humanos agravaram-se, nesses 2 anos, em cada 24 horas, a polícia mata, em média,17 pessoas, a sua maioria das vítimas é de negros e favelados. O Bolsonaro incentiva a violência, com gestos de uso de armas, libera e subsidia a compra de armas de fogo. A violência verbal e agressão contra profissionais da imprensa e contra mídia demonstram e confirmam seus métodos autoritários de defensor da ditadura, cuja intenção é a de impor o medo, com suas ações e gestos, cassando a liberdade de expressão. Não tem qualquer sentido falar-se na existência de democracia. Prefiro falar da intensificação e perda de direitos e de menos direito para os brasileiros. Para esse governo, quem se coloca na posição de seu adversário é bandido. Assim, adota a velha crença de que “bandido bom é bandido morto”.

Aconselho, para quem queira aprofundar seus conhecimentos sobre a situação do Brasil atual, leia o relatório da Anistia Internacional. Para todos, que falamos ou escrevemos sobre os desmandos e criminosas ações, omissões e hostilidades do governo, Corremos o risco de represálias, tornamo-nos, tornamo-nos potenciais vítimas. A Constituição Federal está sendo rasgada e ameaçada, como são ameaçados os Poderes da República, Legislativo e Judiciário (STF). O Relatório da Anistia Internacional afirma ainda que, a Covid 19, para o governo Bolsonaro, serviu de “instrumento para intensificar a repressão aos direitos humanos” dos brasileiros. Por último, questiono: vale a pena falar de democracia, diante do governo Bolsonaro? Finalmente, rendo-me ao direito de sonhar, ao direito de ver a democracia como uma bússola, sabendo, enquanto houver fome, houver desigualdades, mortes por falta de cuidados e proteção do Estado, enquanto houver violência, contra a mulher, contra os favelados, negros e negras, enquanto houver agressão a direitos, todos recepcionados na Constituição Federal, não haverá democracia.

Ainda, a imprensa inspirou-se no Relatório da Anistia Internacional, deste dia 07/04/2021, informa: “A fome cresce e, pela 1a. vez, em 17 anos, mais da metade da população brasileira não tem garantia de comida na mesa”.

De outro lado, o Brasil ganha 11 novos bilionários”; segundo a lista da Forbes. Esse quadro é de horror, sem dúvida, agudo, num contexto de governo incompetente e nefasto, que atuou para o aprofundamento da crise, acelerando a destruição do Estado, das empresas, dos direitos humanos e de nossa soberania. A desgraça não é o fim da história, como não foi, na década de “80”, com a derrocada dos países, ditos comunistas, desenhado e afirmado por Francis Fukuyama, em seu livro o “O Fim da história e o Último Homem”. Com a crise de 2008, a bolha financeira, a quebra da bolsa de Nova York, o escritor teve de rever seus conceitos. O Sistema Capitalista, apesar de cambaleante, ostenta sua vocação: acumular riqueza, fazer novos bilionários, não importa se esteja matando legiões de fome, não importando a destruição da natureza, não importa milhões de mortes, quer seja pela crise sanitária ou pela fome.

Assim, resta-me sonhar com a democracia, mesmo não acreditando em sua efetividade no Sistema Capitalista. Prefiro sonhar! Quem está mais próximo da verdade: Hobbes ou Marx?


JOSÉ MACEDO – Advogado, economista, jornalista e colunista do jornal Tribuna da Imprensa Livre.