Por Luiz Carlos Prestes Filho

Para o candidato a vereador na cidade do Rio de Janeiro, Sérgio Ricardo, “nossa região viveu uma bolha econômica no último período em função do ciclo dos Mega Empreendimentos industriais e também do ciclo dos Mega Eventos, essa bolha estourou logo após o fim das olimpíadas, o que levou a decretação da falência financeira do Rio”. Em entrevista exclusiva para o jornal Tribuna da Imprensa Livre, ele afirma que:

“É importante que a futura Câmara de Vereadores se debruce sobre um plano econômico para tirar o Rio da crise e pra isso é fundamental investirem habitação popular, no saneamento ambiental, na coleta seletiva e reciclagem, na transformação do Rio de Janeiro num grande polo de ciência, tecnologia e inovação, avançar na implantação desse polo industrial da saúde, juntamente com a Fiocruz e também inserir o Rio de Janeiro num calendário turístico e cultural”.

O ecologista Sérgio Ricardo é membro fundador do movimento Baía Viva (Fotos: Divulgação)

Luiz Carlos Prestes Filho: Como o candidato vê a cidade do Rio de Janeiro no atual contexto do Estado do Rio de Janeiro e do Brasil? Aconteceu uma expansão nacional e internacional nos últimos anos?

Sérgio Ricardo: Há um processo antigo de concentração econômica, exclusivamente da capital. Os trabalhadores da região metropolitana, de São Gonçalo, de toda a Baixada e mesmo da zona norte e da zona oeste, diariamente tem que se deslocar nos engarrafamentos para o centro do Rio para trabalhar e com isso estamos perdendo oportunidades de promover o desenvolvimento regional, desenvolvimento local das cidades, da região metropolitana e também dos diversos bairros do nosso município. A vocação do Rio de Janeiro é para economia da cultura, para a economia criativa, para a economia do mar. O Rio de Janeiro pode, avançando no saneamento básico, investir cerca de 30 bilhões de reais para a universalização do saneamento, despoluição da Baía de Guanabara, da Baía de Sepetiba e das lagoas costeiras. A chamada Imobilidade Urbana, que são os engarrafamentos cotidianos, provocam um prejuízo estimado em 20 bilhões de reais por ano na região metropolitana. Isso é uma produção sacrificada. Para reverter esse quadro nós precisamos avançar no saneamento ambiental e também num programa de mobilidade urbana sustentável por exemplo com a construção de barcas menores, para tirar do papel o plano hidroviário da Baía de Guanabara, que foi elaborado em 1984, há 36 anos atrás, ainda no primeiro governo Brizola e nunca saiu do papel, por causa do poderio econômico da máfia dos transportes, que controla a assembleia legislativa, os governos e também a Câmara de Vereadores do Rio. Esse plano prevê estações de barcas em São Gonçalo, Magé, no futuro em Duque de Caxias, associado a um porto público e também a implantação da estação de barcas na Ilha do Fundão, que é a prioridade da nossa campanha.

Além disso, com barcas menores nós podemos melhorar a qualidade desse serviço para a Ilha do Governador e Paquetá.

Prestes Filho: O que permite o Rio de Janeiro se destacar? Como cidade da indústria? Como cidade de serviços? Como centro da região metropolitana?

Sérgio Ricardo: O Rio de Janeiro viveu uma bolha econômica no último período em função do ciclo dos Mega Empreendimentos industriais e também do ciclo dos Mega Eventos, essa bolha estourou logo após o fim das olimpíadas, o que levou a decretação da falência financeira do Rio de Janeiro. A partir daí, o estado assumiu um plano de austeridade fiscal, o plano plano de recuperação fiscal PRF, que está entregando o principal patrimônio do estado, a CEDAE. A Companhia que no ano de 2019 teve um lucro social de 1,5 bilhão de reais. Isso mostra que esse ciclo que injetou de investimentos públicos e privados cerca de 60 bilhões de reais, era um ciclo completamente insustentável. O resultado disso é que aprofundou a desigualdade no nosso município e no estado e também o desemprego estrutural. Somente em termos de população em situação de rua, segundo a defensoria pública do estado, dormem todas as noites cerca de 17 mil pessoas, embaixo das marquises do Rio de Janeiro. Além disso setores estratégicos da economia fluminense, como a área da engenharia, perdeu 90 mil empregos e um outro setor importante, que é a indústria naval, perdeu 50 mil empregos. Então é necessário, nesse atual contexto de somatório de crise econômica, sanitária e ambiental, a gente tenha uma agenda econômica para tirar o Rio da crise.

Prestes Filho: As políticas de Meio Ambiente deveriam orientar as políticas de Turismo, Cultura e Desenvolvimento Econômico?

Sérgio Ricardo: Num contexto de emergência climática global e também de uma pandemia devastadora, que é a COVID-19, é completamente inviável pensar em desenvolvimento econômico sem levar em conta a questão ambiental e sócia ambiental. O Brasil é um país que tem uma mega biodiversidade, uma diversidade biomas, água doce, um extenso litoral, no entanto nós temos o modelo de desenvolvimento extremamente predatório, que vem queimando as florestas, contaminando a água, agrotóxicos nos alimentos e essa depredação ambiental muita intensa. Ela tem gerado não só problemas ambientais e tem como resultado um agravamento das condições de saúde da população e principalmente fortes prejuízos econômicos e com isso, estamos vendo o maior empobrecimento da população. No caso do município do Rio, nossa vocação é para o ecoturismo, para a economia do mar, para a economia criativa, chamada economia da cultura. O Rio de Janeiro por exemplo, é uma das capitais mais atrasadas em termos de reciclagem do lixo urbano. São 9 mil toneladas de lixo produzidos por dia e apenas 1% disso é reciclado.

Somente no setor do plástico, por não reciclar plástico, nós estamos perdendo 420 milhões de reais por ano, então é fundamental tirar o Rio de Janeiro da crise econômica a partir de uma agenda sócio ambiental.

Prestes Filho: Deveriam ser realizados investimentos para consolidar a vocação do Rio no campo da ciência, da tecnologia e da inovação? O poder municipal poderia colaborar para fortalecer as universidades e os centros de pesquisas científicas?

Sérgio Ricardo: Uma das propostas para avançar no campo da ciência, tecnologia e inovação, que estamos defendendo, é a criação do polo industrial da saúde, através de uma parceria entre a Prefeitura do Rio e a Fundação Oswaldo Cruz e também um conjunto de universidades. Essa proposta inclusive consta no programa da Renata Souza à Prefeitura do Rio. Além disso, defendemos a implantação da Universidade do Mar, na Baía de Guanabara, que terá um campus avançado em terra no Solar Del Rey em Paquetá, um imóvel tombado onde funcionou a biblioteca pública que está fechada há 10 anos e também uma campus avançado no mar, na ilha de Brocoió. Isso é um projeto do movimento Baía Viva, juntamente com a reitoria da UERJ e a Associação de moradores de Paquetá. Essa universidade do mar, na Baía de Guanabara, será voltada a cursos livres, projetos de extensão, monitoramento ambiental, projetos de formação técnica e tecnológica das comunidades pesqueiras e na prática será um consórcio de universidades públicas e privadas para formular políticas públicas e executar políticas públicas, para recuperar a saúde ambiental da Baía de Guanabara. A universidade do mar também atuará sobre a Baía de Sepetiba e também as lagoas costeiras. O Rio de Janeiro tem a maior concentração de universidades públicas do país, na região metropolitana. No entanto, as administrações públicas como a Prefeitura do Rio, tem sido extremamente avessas a parcerias com as universidades, o que é um grande equívoco, já que através dessas parcerias com as universidades, podemos inclusive reduzir os custos da elaboração de projetos e também garantir que a juventude, os estudantes, possam ter oportunidades de trabalho, renda e geração de emprego.

Prestes Filho: As políticas de controle da ocupação do território da cidade estão adequadas e atualizadas? Quais impedimentos ainda existem do seu ponto de vista fundiário?

Sérgio Ricardo: O Rio de Janeiro não tem uma política habitacional voltada às populações de baixa renda e também não avançou na regularização fundiária. O resultado disso é que nós temos hoje um processo intenso de especulação imobiliária, por exemplo: Na zona oeste do Rio, o Parque Estadual da Pedra Branca, sobre outras unidades de conservação e grande parte dessa especulação está nas mãos de milícias que faturam um grande volume de recursos associado com a conivência dos poderes. A cidade tem um enorme déficit habitacional e o setor da construção civil e da habitação de interesse popular é um dos que podem gerar empregos com certa rapidez. Um obstáculo pra isso foi a extinção pelo atual Presidente da República, governo de extrema direita, extinguiu o Ministério das Cidades. Com isso os municípios ficaram sem uma orientação, sem uma diretriz central do governo federal para expandir os projetos habitacionais. Eu defendo também a adoção do IPTU progressivo, só no Rio de Janeiro, são cerca de 3 milhões de imóveis fechados. São lotes, terrenos vazios, apartamentos, que estão fechados para a especulação imobiliária, enquanto isso, o carioca paga o preço do aluguel mais caro do país.

A ideia é apresentar uma legislação, como já existe em outras cidades do Brasil e do mundo, que quanto mais tempo o imóvel ficar vazio, sem uso para a habitação, ele seja progressivamente taxado no IPTU, para obrigar que o mercado imobiliário ofereça essas unidades habitacionais por um preço menor para a população, especialmente num momento de pandemia, associada a grave crise econômica é fundamental que a gente avance na política habitacional, inclusive reconhecendo que é um direito humano essencial.

Prestes Filho: A política municipal apresenta novos desafios para os próximos anos? Quais serão as prioridades do seu mandato? Temos um porto, dois aeroportos e rodovias que nos ligam a todo o país. Essa infraestrutura deveria ser mais potencializada pela prefeitura?

Sérgio Ricardo: A cidade do Rio de Janeiro tem uma grande infraestrutura: dois portos, em Sepetiba e o porto do Rio, temos dois aeroportos, no entanto falta um projeto de desenvolvimento econômico para a nossa cidade, pois a posição do prefeito Marcelo Crivella, assim como foi do ex-prefeito Eduardo Paes, de “desenvolver” a nossa cidade, pelo viés da especulação imobiliária, o resultado disso é que houve um processo intenso de remoções. Só na gestão de Eduardo Paes ocorreram 75 mil remoções e despejos forçados. Já Marcello Crivella, no seu primeiro ano de governo, tentou remover 50 mil famílias. Portanto, esse projeto de especulação imobiliária, não garantiu moradia digna e muito menos trouxe riqueza para a nossa cidade. Além disso, na gestão de Eduardo Paes, a região do porto do Rio, que tinha 2 milhões de metros quadrados de áreas públicas, sofreu uma verdadeira grilagem – o Porto Maravilha é o símbolo dessa especulação, já que a região pode abrigar 50 mil habitações e no entanto, nós vimos que nenhum desses projetos saíram do papel. É importante que a futura Câmara de Vereadores se debruce sobre um plano econômico para tirar o Rio da crise e pra isso é fundamental investirem habitação popular, no saneamento ambiental, na coleta seletiva e reciclagem, na transformação do Rio de Janeiro num grande polo de ciência, tecnologia e inovação, avançar na implantação desse polo industrial da saúde, juntamente com a Fio Cruz e também inserir o Rio de Janeiro num calendário turístico e cultural. Para isso é preciso estruturar as áreas verdes, as unidades de conservação da cidade, pra que elas possam abrigar a visitação da população e até mesmo turistas, já que o ecoturismo é um tipo de atividade econômica não poluente e geradora de empregos.

Outro aspecto importante para desenvolver a economia do Rio de Janeiro é exatamente a economia da cultura e a economia criativa. O Rio detém uma importante rede de equipamentos públicos, no entanto, há uma exclusão cultural. Cerca de 80% desses equipamentos estão no centro e na zona sul. Nós precisamos expandir essa rede de equipamentos culturais para a zona norte e zona oeste. Isso significa reformar as lonas culturais, as arenas cariocas e destina-las para o uso público.

O ecologista Sérgio Ricardo sendo entrevistado por Daniel Mazola, programa TRIBUNA na TV (Arquivo/Tribuna da Imprensa Livre)

Prestes Filho: Quais são as propostas para Saúde Pública? A prefeitura estava preparada para enfrentar a pandemia da Covid 19?

Sérgio Ricardo: O enfrentamento da pandemia no Rio de Janeiro foi uma verdadeira tragédia, em primeiro lugar porque mostrou a fragilidade da rede pública de saúde – hoje a cidade gasta 2 bilhões de reais com a privatização da saúde, as chamadas Organizações Sociais, as OS – muitas delas com ligações políticas. O custo da saúde aumentou a partir dessa privatização, além disso, nós não temos o saneamento básico e o resultado é que 80% dos óbitos provocados pela COVID-19, ocorreram nas favelas e na zona periférica da cidade. É fundamental que sejam resgatadas por exemplo, as equipes do programa Saúde da Família, já que o prefeito Crivella demitiu 250 equipes, com isso tornou mais vulnerável a saúde da população. Também é preciso estimular projetos de agricultura urbana, com ocupação de praças, parques públicos, terrenos baldios, para que com a produção de alimentos saudáveis, sem agrotóxicos, a gente possa prevenir as doenças e ao mesmo tempo garantir o direito a alimentação saudável. Uma proposta importante no campo da saúde, pode gerar empregos e fazer o Rio de Janeiro avançar, é o polo industrial da saúde carioca, uma parceria da Fio Cruz e universidades. É uma proposta que nós apoiamos e que consta no programa de governo da Renata Souza. Também os agentes de saúde ambiental, podem ser formados com participação dos jovens para que eles possam atuar em comunidades da cidade, no campo da saúde preventiva, que é fundamental.

Prestes Filho: No campo da Educação existem resultados positivos nos últimos anos? Quais destacaria?

Sérgio Ricardo: Eu sou defensor da educação em tempo integral, isso significa a valorização de profissionais de ensino, realização de novos concursos públicos e também reformas e melhorias nas escolas, já que muitas tem problemas desde acessibilidade até falta de banheiro. Uma outra questão séria, é que muitas escolas no Rio de Janeiro, não tem como promover o esporte da juventude e das crianças. Eu defendo por exemplo, parcerias entre o município e os clubes de bairro, em que a prefeitura poderia reformar campos de futebol, piscinas e quadras, em contra partida, os clubes receberem as crianças para a prática de esporte. É uma forma de garantir que as novas gerações tenham as atividades esportivas como atividade complementar. Também sou a favor da abertura das escolas nos finais de semana, para atividades de cultura, arte, educação ambiental, recebendo a juventude dos bairros, uma escola aberta e libertária, para que aos finais de semana os jovens tenham opções de lazer.

É preciso que a Câmara de Vereadores avance no debate do projeto político pedagógico. Isso significa que uma escola emancipadora, precisa ter como conteúdo a educação ambiental, educação no trânsito, a educação sexual, para prevenir doenças. Enfim, é preciso que a escola seja um espaço atrativo.

Prestes Filho: Hoje os gestores públicos realizam programas para a Melhor Idade; para a Mulher; para os afrodescendentes, indígenas e outras etnias e LGBTs. Temos que melhorar as políticas públicas nestas áreas?

Sérgio Ricardo: Eu sou uma candidato indígena e posso afirmar que não existe nenhuma política pública pra esse seguimento. Segundo o censo do IBGE, existem cerca de 15 mil indígenas no estado do Rio de Janeiro, mais de 7 mil estão na capital, em contexto urbano, essa população reside nos complexos de favelas da cidade como a Maré, Rocinha, Manguinhos e Dendê, onde não há política habitacional. Sou defensor também da implantação do conselho municipal de direitos indígenas, da educação de matriz africana e indígena na rede pública de ensino, que é a maior da América Latina e também a defesa de projetos de geração de renda e emprego. De um modo geral, podemos perceber que as políticas públicas voltadas a terceira idade, para as mulheres, estão muito fragilizadas na cidade. Temos visto que a atual administração agora no período eleitoral tem anunciado uma série de projetos, porém há 3 anos e meio não fez absolutamente nada, apenas propostas eleitoreiras. A nossa cidade tem um conjunto de políticas públicas na área da educação, esporte, cultura, projetos inclusive voltados à juventude que estão completamente abandonados.

Prestes Filho: O Esporte ocupa um espaço estruturante na prefeitura hoje? A juventude poderia ser mais beneficiada? Os jogos Olímpicos e a Copa de Futebol deixaram um legado que poderia ser melhor usado?

Sérgio Ricardo: Os jogos Olímpicos infelizmente, serviram pra criar uma bolha econômica. O Rio de Janeiro recebeu cerca de 60 bilhões de reais entre investimento público e privado, no entanto logo após as Olimpíadas o estado decretou falência financeira. O ex prefeito Eduardo Paes deixou 195 obras inacabadas, a mais simbólica delas é a Transbrasil, que até hoje não saiu do papel. Identifico que no governo de Saturnino Braga, foi o nascedouro das políticas públicas de esporte para a juventude através da Fundação Rio Esportes. A prefeitura então naquele momento promovia projetos como por exemplo a contratação de professores e estudantes de educação física que levavam esporte para os espaços públicos como por exemplo o Aterro do Cocotá, na Ilha do Governador e atendiam centenas de crianças, a maior parte delas da rede pública de ensino. Além disso esse projeto tinha o lanche – para muitas dessas crianças era a única refeição ou complementação – por isso defendo a retomada desse projeto inclusive associando a Rio Esportes ao uso das instalações das lonas culturais e das arenas cariocas, para que a juventude possa ter acesso ao mesmo tempo a arte, esporte, cultura, tendo oportunidade de se desenvolver enquanto cidadão. Outra coisa fundamental são as parcerias que defendo e quero aprovar uma lei nesse sentido, pois são parcerias com a Prefeitura do Rio e centenas de clubes sociais de bairro. Muitos desse clubes estão fechados, abandonados, mas eles possuem uma infraestrutura importante com quadras, campos, piscinas, que poderiam através de parcerias ser reformados, beneficiando a juventude, a população do bairro e principalmente as crianças da rede pública de ensino, já que grande parte das nossas escolas não dispõem de quadras, campos e muito menos de piscinas. Uma proposta como essa pode ter a colaboração das empresas situadas nos bairros. A economia do esporte é muito importante e significa também que precisamos apoiar clubes, federações, ligas que existem em diversos bairros. Com a participação da Prefeitura, projetos como esse, pode alcançar uma escala maior da juventude – que estamos perdendo cada vez mais pelo genocídio negro, provocado principalmente pela violência urbana e assassinatos praticados pela polícia nas favelas.

Vejo o esporte como uma política inclusiva. Em outros países a política de esportes é política de estado, exatamente para proporcionar à juventude um espaço de convivência, de lazer, de formação e o esporte como fator de saúde.

Prestes Filho: A parceria com a iniciativa privada é prioridade? Como o gestor público pode colaborar para com a valorização das marcas e das empresas do Rio nas áreas: metal mecânico; computação; comércio; química; turismo; produção rural; transporte; serviços culturais; outras?

Sérgio Ricardo: A Prefeitura do Rio é a maior compradora individual de equipamentos, mercadorias, alimentos e suprimentos. Na Câmara, nós proporemos como estratégia para gerar empregos e ajudar na superação da crise econômica, que a gente apoie a vocação econômica dos bairros cariocas. Cada bairro do Rio de Janeiro tem sua vocação, determinadas infraestruturas podem servir para o desenvolvimento regional e evento local. Precisamos evitar a saga que o carioca tem diariamente em que o trabalhador da zona norte e zona oeste, tem que deslocar nos engarrafamentos em direção ao centro da cidade, transformando os bairros em verdadeiros bairros dormitórios. Os setores de turismo, gastronomia, economia criativa, saneamento ambiental, reciclagem, área de ciências e tecnologias, são grandes potencialidades mas para isso precisamos que haja cooperação e parceria do poder público, inclusive com a criação de startups. Para a zona norte do Rio, eu defendo a implantação de um polo de cinema e vídeo, revitalizando equipamentos culturais para uso dos coletivos de cinema, teatro, exposições, oficinas, enfim, é preciso pensar a cidade do Rio de Janeiro para além do período de carnaval e réveillon.

O próprio setor das escolas de samba, poderia estar gerando empregos durante o ano, então é preciso fortalecer os blocos de bairro e a capacitação profissional desses trabalhadores do carnaval, pra que possamos ter a economia criativa em funcionamento o ano todo.

Prestes Filho: Sua família sempre teve tradição na política? Conte sobre seu pai e sua mãe, sobre sua família.

Sérgio Ricardo: Eu sou nordestino, de ancestralidade indígena, descendência Potiguara. Na infância morei em Altamira, no Pará. Meu pai foi agricultor, mas também era músico, compositor, flamenguista. Durante a vida, meu pai teve vários projetos de esportes com crianças de baixa renda, em todos os lugares em que ele morou. Minha mãe, professora primária, atualmente trabalha num projeto de saúde mental da UERJ. O ambiente da minha casa sempre foi com debates políticos, literatura, música e tudo isso acabou me influenciando na trajetória de vida e também na política. Cheguei aqui no Rio de Janeiro em 1986/1987, vindo de Natal RN, tive uma grande estranhamento porque as praias de Natal são limpas e as praias do interior da Baía de Guanabara, na Ilha do Governador onde moro, são poluídas e assim começou minha trajetória no campo ambiental. Sou da geração que em meados dos anos 80, com o fim da ditadura militar, saiu do movimento estudantil para o movimento ecológico, participei da fundação da Associação Metropolitana de Estudantes Secundaristas (AMES), participei da UBES, do processo de reconstrução da UNE e atualmente sou professor convidado da Fundação Oswaldo Cruz no projeto “Pedagogia das águas em movimento”, uma parceria do Movimentos dos atingidos por barragens (MAB) e também convidado do projeto da ouvidoria da Defensoria Pública do estado do Rio de Janeiro, no projeto “Garantias Legais”em territórios invisíveis. Sou gestor ambiental, ecologista e produtor cultural, além de fundador do Movimento Baía Viva e da Rede Brasileira de Justiça ambiental. Tenho mais de 20 anos na administração pública, como coordenador da rede de lonas culturais, secretaria de cultura do Rio, fui subsecretário de meio ambiente e agricultura em Nova Iguaçu, trabalhei na Assembleia Legislativa e também no Congresso Nacional durante o processo de revisão constitucional, na comissão de meio ambiente, direitos humanos e minorias, tenho conhecimento das políticas públicas e temos um plano para tirar do papel esse conjunto de propostas, apresentando a sociedade. É importante que essas propostas sejam construídas com lastro social, pra que não fiquem voando na burocracia da Câmara de Vereadores e não se torne realidade por um ato do prefeito. Trabalhei na Prefeitura do Rio como estagiário no projeto Multidão Reflorestamento, também na área da educação ambiental, coordenei a comissão de meio ambiente da Assembleia Legislativa. Concluí meu segundo grau no Colégio Lemos Cunha, estudei na UERJ, na Estácio na área de comunicação, estudei no IUPERJ da Cândido Mendes, na área de planejamento urbano territorial e gestão de políticas públicas, estudei na COPPE da UFRJ, na área de gestão integrada de recursos hídricos.

Prestes Filho: Como você iniciou na política? Como você vê o seu futuro?

Sérgio Ricardo: Nós vivemos no mundo todo a chamada “crise da democracia representativa”. As políticas públicas no campo institucional, principalmente no Brasil, de um modo geral, historicamente tem ignorado a participação popular, que é um princípio da nossa constituição federal de 1988, chamada Constituição Cidadã. Minha experiência administrativa de mais dez 20 anos e na construção de políticas públicas com os movimentos sociais, sociedade civil e comunidades. Defendo o controle social das políticas públicas com total transparência do orçamento online, pelas redes sociais. Uma das propostas que quero apresentar na Câmara é o “Orçamento Transparente”, que disponibilizará não só apenas no site da Prefeitura do Rio” como também na Câmara de Vereadores todas as compras e licitações, dívidas que diretamente envolvam recursos do orçamento da Prefeitura. Convênios que o cidadão do seu próprio celular ou de um computador em casa, ele possa ter acesso de qual o destino do seu recurso, quais políticas públicas estão sendo priorizadas. Além disso, é fundamental criar uma CPI para tratar da dívida pública, do endividamento público e do esquema das setoritizações, uma vez que a dívida de pessoas físicas e de pessoas jurídicas é de 49 bilhões de reais e esses recursos não são cobrados pela Secretaria Municipal de Fazenda, que não tem uma fiscalização por parte da câmara de vereadores, que tem faltado políticas públicas essenciais à dignidade humana, como na área da saúde, educação, mobilidade urbana, da geração de empregos, além de projetos de inclusão social da juventude. Nós vivemos um momento de crise econômica associada a uma pandemia e é importante que o município do Rio de Janeiro cobre essa dívida bilionária das pessoas físicas e de empresas. Os grandes devedores do rio são bancos, corretoras, planos de saúde privado. Na Câmara de Vereadores faremos um esforço para dar publicidade a essas informações, tudo online, para que esses recursos sejam finalmente pagos integralmente, destinados para a área de saneamento ambiental da Baía de Guanabara, na Baía de Sepetiba, lagoas costeiras e habitação de interesse social, já que o rio é uma das cidades mais caras do mundo, com um dos alugueis mais caros do mundo e grande parte da população mora em condições precárias, insalubres, além das 17 mil pessoas que moram nas ruas do centro do Rio, no vento, na chuva, no frio todas as noites.

Não há como avançar na implantação de políticas públicas, sem a cobrança das dívidas dos grandes devedores da cidade.

Prestes Filho: A reforma tributária pretendida pelo governo federal pode ter um impacto positivo para a prefeitura? Teria o mesmo peso que representaram as reformas da previdência e a trabalhista?

Sérgio Ricardo: As reformas trabalhista e previdenciária, foram reformas neoliberais, reformas que retiraram direitos e acabaram por gerar, aprofundar mais ainda a crise econômica do país e o desemprego estrutural. A reforma tributária em debate no Congresso não nos representa, uma vez que ela não contempla por exemplo, a taxação da grande riqueza e principalmente, precisamos enfrentar o debate do sistema da dívida. O Brasil paga por ano 1 trilhão e 200 milhões de reais para o sistema financeiro internacional, são juros sobre juros, uma dívida que não foi paga há varias décadas. Países como o Equador, a Grécia fizeram auditoria de seus sistemas da dívida e reduziram em cerca de 40% o montante. Enquanto o Brasil não enfrentar esse debate, nós continuaremos vivenciando essa profunda desigualdade social, desemprego estrutural, juventude sem perspectiva de vida, sem oportunidade, sem trabalho. Uma auditoria no sistema da dívida, pode direcionar um grande volume de recursos públicos por ano, para tirar do papel as políticas públicas essenciais, de moradia, habitação, saúde, educação, mobilidade urbana, políticas de geração de empregos. Atualmente, nosso país, nossa cidade foram capturados pelos interesses do sistema financeiro. Essa agiotagem que se dá sobre as finanças públicas tem levado muito sofrimento, muita dor e muita desilusão entre o nosso povo, porque aqueles que mais precisam das políticas públicas tem sido abandonados. O maior exemplo foi a pandemia, em que a partir de 2016, quando se adotou no país políticas de austeridade fiscal seletiva, o SUS perdeu 22 bilhões de reais.

Na hora da pandemia, faltou a contratação de médicos, de enfermeiros, hospital de Campanha, não havia recursos para a aquisição de respiradores, até máscara faltou. Isso demonstra que precisamos romper com essa roleta russa da globalização financeira, do rentismo e com isso garantir a dignidade humana.


LUIZ CARLOS PRESTES FILHO – Cineasta, formado na antiga União Soviética. Especialista em Economia da Cultura e Desenvolvimento Econômico Local, diretor executivo do jornal Tribuna da Imprensa Livre. Coordenou estudos sobre a contribuição da Cultura para o PIB do Estado do Rio de Janeiro (2002) e sobre as cadeias produtivas da Economia da Música (2005) e do Carnaval (2009). É autor do livro “O Maior Espetáculo da Terra – 30 anos do Sambódromo” (2015).