Por José Macedo

Tenho o privilégio de ter ouvido muitos discursos do líder, governador do Rio Grande do Sul e do Rio de Janeiro por duas vezes, Leonel de Moura Brizola. Os rápidos encontros e cumprimentos foram para mim de muita emoção e significado, representaram meu interesse por política, como mecanismo para a obtenção do bem comum ou fazer as pessoas felizes (Aristóteles). A admiração por suas ideias, consciência de nacionalidade e o privilégio de ouvi-lo fizeram-me um atento seguidor.

A escola e a educação de qualidades foram carros-chefes em suas administrações de governo. Assim, só haverá libertação, desenvolvimento econômico e social, melhora nos índices de desigualdade, com escolas e educação de qualidade. Por muitos anos, permaneci filiado no PDT e membro do diretório, não me desfiliei, afastei-me, em função de divergências e posicionamentos, que não se adequam ao que cultivei na minha militância, estudos e visão de mundo. O PDT, após o falecimento de seu criador, Brizola, foi desfigurado, motivo de afastamento ou desfiliação de muitos companheiros. Muitos brizolistas históricos, que participaram de sua fundação desfiliaram-se do partido. Apesar dos livros, artigos, filmes e escritos diversos, que falam de Brizola, são assuntos, que não foram exauridos. Aqui, resumidamente, diante do que vivi, falo do líder político, trabalhista e humanista, vice-presidente da Internacional Socialista, Leonel Brizola.

Quem melhor conviveu com ele, lembra de sua memória e sensibilidade invejáveis, dos longos e incansáveis discursos, as riquezas de citações, detalhes e conteúdo, que entusiasmavam a todos, até a seus adversários. Assim, suas entrevistas configuravam verdadeiras e eficientes aulas de história política, de nacionalismo e humanismo. O Brizola não esquecia as pessoas, apesar de sua ocupação e das milhares que o procuravam. Era, sim, um líder com vasta influência, não só no Brasil, mas também, mundialmente. Os direitos humanos e ações a favor dos menos favorecidos faziam, sempre, parte de seus discursos e planos de governo. Por isso, era razão para que a elite atrasada, entreguista e egoísta o perseguissem. Sou testemunha dessas afirmações. Desde adolescente, não sei por que, interessava-me ouvi-lo com inteira atenção a seus discursos. Com certeza, era movido por curiosidade e perguntava a mim mesmo: Quem era aquele político, que falava do Brasil com tanto ardor e entusiasmo? Então, fui buscar a explicação em minha família.

Fui habituado a ouvir discursos políticos, desde criança, pois meu pai e um de meus tios foram, na juventude, integralistas militantes. O terreno era fértil para iniciar minhas leituras e questionamentos de toda ordem. Assim, cresci vendo livros de Plínio Salgado e a Bíblia, ouvindo falar de política, da Guerra de Canudos, Lampião, livros de cordel e de Monteiro Lobato. Aos 09 anos, pedi a meu que me levasse a Canudos, no que me atendeu. Muitas vezes, fui obrigado a ouvir falar desses temas, além de meu pai, as demoradas leituras de um tio, quando, esporadicamente, nas férias, ia a sua casa. Numa visita, que seria uma rápida, transformava-se em páginas e páginas de leituras sobre o integralismo e seu “chefe politico”, Plinio Salgado. Ouvia-o por total respeito e, obviamente, admiração a meu pai e ao tio intelectual.

Na Universidade (UFBA), no finalzinho da década de “60”, continuei admirando Brizola, acompanhava suas atividades politicas, seu exílio, seus discursos, seu amor pelo Brasil, suas lutas e quando governador do RGS, seu posicionamento e iniciativa, enfrentando os militares, que quiseram impedir a posse de Jango Goulart. A organização do Movimento da Legalidade é fantástico e um marco de resistência do povo gaúcho. Nunca me interessei pela integralismo, ao contrário, fazia críticas, o que contrariava a meu pai. Ao contrário, o interesse pelo trabalhismo e pelo socialismo não desapareceram de minhas leituras, apesar da ditadura, da repressão, da prisão e expulsão da Universidade Federal da Bahia. As consequentes dificuldades, que enfrentamos no movimento estudantil, no qual atuei sedimentaram ainda mais minhas leituras e conhecimento sobre a história e a realidade brasileira. O adesismo e interesse pelo Trabalhismo eram entendidos e justificavam como passagem para o socialismo.

Na época, sabíamos que Brizola era considerado pelos militares o maior inimigo do Brasil e rotulado de comunista. Já sabíamos: quando entreguistas, reacionários e conservadores querem destruir um político popular e nacionalista, rotulavam e até hoje, rotulam de comunista e corrupto. Socialismo, mesmo o mais suave, é palavrão, dado o nível de ignorância de nosso povo. Assim, ocorreu com Brizola. Nada mudou, nos dias atuais, talvez, tenha havido retrocesso, considerando entre nosso povo a adesão e influência das milhares de igrejas neopentecostais pelo Brasil afora e ainda, o que é deplorável, muitos gritam pela volta dos militares, apoiam a ditadura, perseguições e tortura. No retorno de Brizola do exílio, após anistia, havia compreensível expectativa e euforia, por um Brasil democrático e livre do autoritarismo e pensávamos: DITADURA NUNCA! Nesse interim e clima, fomos às ruas do Rio de Janeiro receber Brizola e outros exilados. Queríamos eleições livres e democráticas em todos níveis.

Lembro-me, do dia 10 de abril de 1984, O COMÍCIO DAS “DIRETAS JÁ”, em frente a Candelária, no Rio de Janeiro. Nesse dia, conheci o histórico, líder político, Luiz Carlos Prestes, que me abraçou, gentilmente, apesar de parecer seu olhar distante, Naquele dia, certamente, era a maior Concentração, que tínhamos conhecimento da história do Brasil. Claro, orgulhei-me por está ali, no meio daquela massa, gritando por liberdade e democracia O Centro do Rio e as ruas adjacentes ficaram muito cheias, o povo afluía com com esperança inebriante, regozijo e entusiasmo, era uma festa de conquista da democracia e dos direitos humanos, sentimento de puro ufanismo e brasilidade. A bandeira brasileira e o Hino Nacional ainda pertenciam ao povo, apesar da ditadura, ali, em leito de morte e desacreditada, em virtude das crueldades praticadas e morbidez, praticadas, por mais de 20 anos. Nesse dia, através de meu ilustre professor de economia, Jairo Simões, da UFBA, conheci Waldir Pires, que foi ministro do Jango Goulart e futuro governador da Bahia, o Professor Rômulo de Almeida, a profa. Maria da Conceição Tavares e o jornalista Paulo Amorim. No dia seguinte, o professor Jairo Simões convidou-me para o almoço, todos estavam presentes, no restaurante “La Mole”, no Leblon. Obviamente, apenas os observei, se falei, foi, em momentos, quando, por curiosidade, queriam saber quem era o jovem intruso e desconhecido. É meu aluno do curso de economia da UFBA, respondeu o professor Jairo Simões. Esses foram momentos ditosos e inesquecíveis, que rondam e modelam minha memória politica.

Tenho convicção de que, se não procedesse dessa forma, prevenindo-me, acautelando-me, com certeza, não estaria, aqui, escrevendo essas reminiscências. Retornei lentamente, à participação política de modo efetivo e direto, após alguns anos, apesar das dificuldades para superar traumas e medo, lembranças indesejáveis, dos amigos próximos assassinados, torturados, presos ou, compulsoriamente, exilados. Esses medos eram originados de perseguição, desde minha militância na política estudantil, prisão e expulsão da UFBA (UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA). Esses traumas assustavam-se e permaneceram em mim, diminuindo, no ano de 1975, ano em que retornei de uma bolsa de estudos concedida pela AID (ONU). Foram anos seguidos, que me atemorizaram e não me abandonaram, ao contrário perseguem-ne, na verdade, até hoje. Não há motivos para continuar falando de mim, desculpem-me por essa digressão. O que me entristece, nos dias atuais, é o de assistir a uma destruição dos valores construídos com a vida e o sangue de tantos brasileiros. A luta está sendo difícil, quando, quase 58 milhões de brasileiros elegeram um genocida, um autoritário e destruidor para governar esse País. Não basta gritar DITADURA, NUNCA MAIS! O pior: não vislumbramos o que virá, para os próximos anos. Enquanto isso, somos humilhados e submissos ao governo americano, perdemos nossa soberania de nação, cedemos nosso território, nossa casa para perseguir outro país, nosso vizinho. Nossas relações internacionais só nos envergonham. Assim, já visualizo um País destruído, uma terra arrasada, em sua economia e em seus valores.

Hoje, dia 22 de setembro de 2020, o discurso de Bolsonaro na ONU, embora virtual (ainda bem), revela para o resto do mundo, que somos país habitado por beócios, mentirosos e, de fato, governado por um palhaço, mas genocida, que brinca com a vida, banalizando-a e terá de ser detido. Não estará distante, para o resto do mundo tomar essa iniciativa: a de detê-lo! BRIZOLA VIVE!


JOSÉ MACEDO – Advogado, economista, jornalista e colunista do jornal Tribuna da Imprensa Livre.