Por Lincoln Penna –
A história não se repete, mas às vezes rima.
(Mark Twain)
Lendo o livro dos mais oportunos de Noam Chomsky, intitulado “Internacionalismo ou Extinção. Reflexões sobre as grandes ameaças à existência humana” reforço a minha convicção de que será neste século que está reservada a grande mudança qualitativa que os mais desamparados estão a esperar. Essa leitura me reacende tal esperança, que só agora tem ganho alguma notoriedade junto à opinião pública, o que se tornou, por isso mesmo, uma referência obrigatória.
Assim, retomo à questão das mais variadas formas de resistência aos males causados pelo capitalismo em sua etapa de acumulação ampliada. E o que parece não chamar a atenção dos analistas, econômicos ou não, é a referencia constante ao chamado mercado, como se este funcionasse como um ser à parte e no qual todos devem sd render aos seus ditames.
Chomsky faz alusão a esse fato. E acrescenta em sua lúcida análise que há algum tempo o capitalismo tornou-se uma internacional a movimentar todas ou quase todas as economias do mundo gerenciando-as e impondo as suas receitas acolhidas como soluções diante de eventuais cataclismas que frequentemente assolam as diversas sociedades nacionais fruto de seu próprio sistema ou modo de produção. Tal fato igualmente é omitido pelos meios que veiculam as informações tanto nas áreas econômicas quanto nas esferas políticas.
É ainda Chomsky que ao responder a um sem-número de questões em face do conteúdo instigante e ao mesmo tempo de forte chamamento à consciência dos povos no que se refere à escalada infernal do aquecimento da Terra e seus efeitos na vida da humanidade, que indica como forma de resistência ao desleixo dos operadores do capital a necessidade de se organizarem também mundialmente.
Para isso, Chomsky propõe entre tantas outras iniciativas de cunho localizada, regionalizada ou de amplitude maior, simultaneamente, e que se retome a ideia de uma internacional não capitalista à partir da cidadania oriunda dos povos como contraponto à atual ordem mundial sob a batuta do grande capital internacionalizado que impõe uma lógica a nortear os negócios, de maneira à submeter todas as transações comerciais aos caprichos desses condutores do sistema de trocas internacionais.
Por falar nisso, as internacionais socialista e comunista surgidas entre os fins do século XIX, no caso da Socialista, e no primeiro quarto do século XX, a Comunista; representaram formas de manifestação orgânicas contra a expansão desenfreada do capitalismo cujas contradições resultaram na Grande Guerra de 1914 a 1918, com implicações de ordem econômica e financeira, política e institucional, e um vasto legado de natureza social, que a rigor se arrasta até os nossos dias, dados os desdobramentos que proporcionou nas relações internacionais e nas diversas sociedades nacionais.
De lá para cá muita coisa mudou, não que esta mudança tenha equacionado os problemas que provocaram o conflito e seus efeitos nocivos, dentre os quais a aparição do fascismo, como resultante da crise agônica do capitalismo, principal protagonista que doravante tem marcado todas as tensões que temos registrado. Na verdade, o que mudou foi a forma pela qual tem-se dado um novo tipo de enfrentamento entre os povos, porém derivado da incapacidade desse protagonista, que é o interesse do capital em solucionar as suas crises crônicas de modo a resultar no emprego de formas extralegais, como o fascismo para socorrer a sua permanente instabilidade ultimamente.
Pena que esse processo que tem levado a tantas crises e instabilidades seja ignorado por amplas camadas da sociedade mundial. A propósito, o historiador Peter Burke lançou um livro já traduzido em 2021 para o português pela editora Vestígio ao qual deu o nome de “Ignorância: Uma história global”. Neste livro, Burke elenca uma séria de representações dessa ignorância passeando por áreas de conhecimento e por diversas situações, e nos chama a atenção para algo que pode surpreender a muitos, quando diz que tanto o conhecimento quanto a ignorância se abastecem mutuamente e são reproduzidas na mídia atualmente de modo a confundir mais do que a distinguir o que cada um tem a nos dizer. É a era das fake news.
Esses dois intelectuais militantes, cada qual em sua seara, nos têm fornecido suficientes subsídios para que entendamos a importância da força da mobilização popular, desde que alcance um mais elevado grau de conscientização de nossos problemas mundiais, portanto comuns a todos os povos, que se organizam desde os mais remotos nichos e recantos e, finalmente atuem mobilizadamente em articulações com todas as demais iniciativas que possam prosperar para que se constitua verdadeiramente uma alternativa à atual ordem mundial, mediante a formação de um poder popular.
Atualmente, a revolução social concebida por Marx e Engels, lá em meados do século XIX terá inevitavelmente de se juntar à revolução ambiental, sem o que, como assinalam os mais competentes estudiosos da matéria, a humanidade pode acabar. Já não basta a quantidade de artefatos nucleares nos arsenais das grandes potências que os detém e podem usá-los diante de situações extremas. Por enquanto, o fazem como formas de dissuasão, mas nada garante que venham a usá-las objetivamente. O tamanho dessas tensões não se anula com encontros periódicos como os G7 ou 8, o G 20 e tantos outros fóruns a reunir potências ou países que não podem ou não admitem mudanças profundas nas relações internacionais. E os que admitem mas não têm forças para a adoção de medidas que garantam a paz e a cooperação entre os povos.
Essa internacional dos povos, uma vez constituída sabe lá quando, precisa lançar a bandeira do desarmamento, da paz permanente e de uma política global que atenda aos povos mais vulneráveis à fome, cuja emergência já bateu à porta faz tempo.
Logo, só a justiça social nos levará ao caminho da confraternização, e ela só é possível com a remoção do principal entrave, o capitalismo e sua sanha avassaladora que nos conduz à barbárie.
LINCOLN DE ABREU PENNA – Doutor em História Social pela Universidade de São Paulo (USP); Conferencista Honorário do Real Gabinete Português de Leitura; Professor Aposentado da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ); Presidente do Movimento em Defesa da Economia Nacional (MODECON); Vice-presidente do IBEP (Instituto Brasileiro de Estudos Políticos); Colunista e Membro do Conselho Consultivo do jornal Tribuna da Imprensa Livre.
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