Por Felipe Quintas e Pedro Augusto Pinho –
O Brasil é um país rico, tem 350 bilhões de dólares estadunidenses (USD) em reservas que nada rendem (juros zero), duas das pessoas mais ricas do mundo e os bancos mais rentáveis do Planeta. Mas fica discutindo e postergando pagar 120 dólares USD para as pessoas que foram incentivadas, por campanha estatal, e na prática obrigadas, devido ao monetarismo e ao judicialismo fanáticos que destruíram grande parte dos empregos formais, a serem empreendedores, empresários individuais e hoje estão sem emprego e receita. Ou seja, deixando de ter a garantia dos salários e benefícios sociais para batalhar pelo próprio alimento diário.
O Brasil continua sendo um país colônia e escravagista. Um país subdesenvolvido, sem soberania de qualquer ordem e, portanto, incapaz de decidir seus próprios rumos e seu destino. E esta é nossa tragédia. E a grande corrupção nem são as comissões de políticos e empresários, mas a venda do país, de suas riquezas, por gorjetas aos ricos brasileiros, muitos residindo no exterior, que nem impostos aqui pagam.
Nosso artigo trata da cultura do Brasil, que o neoliberalismo aceleradamente destrói.
Mas o ponto a que nos levaram 45 anos de governos neoliberais, apenas parcialmente desenvolvimentistas nos governos do Partido dos Trabalhadores (PT), fica evidenciado com a crise do sistema de saúde na epidemia do coronavírus.
É indispensável que o caro leitor entenda que administrar é ação sistêmica. Se não há indústria, faltarão máquinas e equipamentos cruciais para saúde. Sem petroquímica, não se fabricarão fármacos, e assim por diante.
As corruptas, escandalosas, irresponsáveis privatizações, unicamente resultantes de uma ideologia, a neoliberal, sem qualquer pé na realidade brasileira, são a base dos desabastecimentos, agora no setor saúde, e que, com um mínimo de aumento do consumo da população, explodirão pelo país.
Mas estes fatos são evidentes aos olhos não toldados por preconceitos, ou comprometidos com pensamentos e ideologias importadas. Porém nosso artigo trata de outro tema. Vamos cuidar da alma, da cultura do Brasil que o neoliberalismo aceleradamente desconstrói e destrói.
Todas as colonizações abalam muito mais e de modo perverso e duradouro a cultura nativa, embora sejam quase sempre estudadas e analisadas sob a ótica econômica e da política.
Neste aspecto a Inglaterra, que dominou o mundo desde 1815 até 1914, foi o maior e mais nefasto cataclismo. Mesmo quem não acompanhe a história sabe a devastação cultural que a Europa produziu na África, na Ásia e nas Américas, a começar pelos idiomas.
É suficiente observar que apenas a Tanzânia manteve o suaíli, como idioma oficial, e Evo Morales, na reforma constitucional, colocou todas as línguas nacionais como oficiais no Estado Plurinacional da Bolívia. Por todo o mundo ocidental, os idiomas nacionais são os europeus. Este é o primeiro entrave para a soberania cultural.
Pois a soberania não se reduz às bombas atômicas, à independência energética, à capacitação tecnológica e ao pujante parque industrial. Soberania é também uma questão de consciência, de emoção, é parte da formação da cidadania. Soberania é saber-se nacional e sentir-se como tal, seja qual for seu país. Soberania é se organizar de acordo com os padrões próprios, das relações entre as pessoas, suas expectativas e seus modos de agir.
A autonomia econômica e militar, desejáveis por si mesmas, não podem ser sustentadas e levadas adiante sem o sentimento dos governantes e da população estarem enraizados na Pátria, sem as elites e o povo entenderem que o seu mundo é o seu país e que cumpre cuidá-lo e protegê-lo para que todos possam prosperar em paz.
Desde a chegada dos europeus ao nosso território, o Brasil só foi soberano na Era Vargas, no Governo Geisel e, em alguns aspectos, nos governos Juscelino e Jango. E a cultura teve relevo e projeção nestes momentos históricos.
Lembremos das palavras de Getúlio Vargas: “Impulsionar e difundir, o mais largamente possível, a cultura é obra de sadia brasilidade”, em 12 de maio de 1940. Em 16 de junho de 1934, no discurso proferido na sessão solene no Gabinete Português de Leitura, assim se expressava Vargas:
“No Brasil, o índice da civilização transcende o tipo de Estado europeu. Pela vastidão do solo, pela variedade das condições mesológicas e do clima, temos quase uma projeção continental. Por isso mesmo, dispondo de fatores próprios, não podemos procurar paralelo no tipo clássico do Estado europeu. As peculiaridades da nossa vida exigem métodos e processos originais.”
De 1934 a 1945, o Ministério da Educação (nas designações que teve) foi conduzido pelo mineiro Gustavo Capanema (1900-1985). Em nenhum outro período da administração brasileira juntou-se no Ministério da Educação e Cultura (MEC), nas diferentes estruturações organizacional pelas quais passou, a plêiade de intelectuais e cientistas agrupada na Era Vargas. Além de Carlos Drummond de Andrade, amigo e verdadeiro contraponto ao conservadorismo de Capanema, por lá deixaram suas marcas: Portinari, Lúcio Costa, Oscar Niemeyer, Mário de Andrade e Heitor Villa Lobos.
Neste período Vargas (1932), foi lançado o Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova, com as assinaturas mais expressivas da pedagogia e do pensamento nacional: Afrânio Peixoto, Anísio Teixeira, Cecília Meireles, Delgado de Carvalho, Fernando de Azevedo, Hermes Lima, Lourenço Filho e Roquete Pinto.
E na Constituição de 1934 já encontramos, pela primeira vez em nossas leis (artigo 149), que a educação é direito de todos e deve ser ministrada pela família e pelos poderes públicos de modo que desenvolva um espírito brasileiro na consciência da solidariedade humana.
Devemos também a Getúlio a criação do Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Sphan), o Serviço Nacional de Teatro, o Serviço de Radiodifusão Educativa, o Instituto Nacional do Livro (responsável, por exemplo, pela publicação o grandioso Dicionário do Folclore Brasileiro, do Luís da Câmara Cascudo), o Museu Nacional de Belas Artes, o Museu Imperial de Petrópolis e o Museu da Inconfidência, em Ouro Preto.
Este espírito de vigorosa brasilidade perdurou da Era Vargas até a Funarte, criada por Ernesto Geisel. Depois, o vírus do neoliberalismo se infiltra nas instituições, na política e na sociedade nacional, com recursos abundantes e permanentes. Por onde começa? Emblemática e lamentável foi a propaganda que os governantes pós Geisel colocaram contra o Estado Brasileiro nas redes de televisão, em transmissão por todo país: um elefante na loja de louça. E conclui garantindo a necessidade de minimizar, quando não eliminar o Estado.
E quem irá proteger nossa população do coronavírus? Resguardá-la, tratá-la, mantê-la? O Itaú? O BTG Pactual? Bradesco? Safra? Mas estes bancos não receberam R$ 1,2 trilhão do Banco Central? Para que, se a prioridade deve ser a vida dos brasileiros?
Ora, para continuarem pagando a propaganda que faz nossos compatriotas preferirem ouvir o que nenhum estadunidense aguentaria, mas que as estações de rádio no Brasil lhes enchem os ouvidos. Para nossa gente pensar que o Estado é um elefante e tudo mais quanto interesse à eliminação de seu nacionalismo, de lhe tirar o prazer de ouvir, ver e ler as magníficas produções de geniais artistas nacionais, rotulados como oportunistas aproveitadores da lei de incentivo à cultura. Teriam sido mesmo ou seria mais uma acusação infundada para afastá-lo, você caro leitor, da produção brasileira?
*Felipe Quintas – Doutorando em Ciência Política na Universidade Federal Fluminense.
*Pedro Augusto Pinho – Administrador aposentado.
MAZOLA
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