Por Sérgio Cabral Filho –
Foi Dia da Parada Gay em São Paulo, na Avenida Paulista, coração e marca da cidade.
As calçadas e ruas da Avenida Paulista são plurais. Elas recebem manifestações de vários matizes ideológicos, comportamentais e crenças de fé são ali também realizadas. Somos uma democracia!
Mas nossa democracia vive sendo ameaçada de várias formas: nas redes sociais, com mentiras divulgadas sem pudor, informações históricas distorcidas, apego a carimbar como “comunista” qualquer pessoa que defenda os pobres, a diversidade, o meio ambiente, os direitos humanos etc. “Deus, Pátria e Família”, clamam os extremistas de direita. Lema esse totalmente distorcido por quem o brada.
Vejamos! Jesus, vendo a turba agredir Madalena, tratou de convidar somente os que não pecaram a atirar pedras. Ninguém atirou a primeira pedra. Madalena não só se torna uma fiel cristã, como é sinônimo do Cristo que ama a todas e a todos, sem distinção. A Pátria foi ameaçada por ações frequentes de ataques ao Judiciário e ao Congresso de 2019 a 2022. Sendo que, no dia 8 de janeiro de 2023, inconformada com o resultado legítimo das urnas, a boçalidade não fez distinção: invadiu os Três Poderes.
Família. Família é a base de tudo. Mas quem ousa definir o que é uma família? Família é onde você encontra acolhimento, amor, paz, solidariedade, lealdade e companheirismo. Onde pais e mães biológicos e não biológicos constroem suas famílias na base do amor e da amizade. Família respeita seus familiares, mesmo que tenham eles optado por caminhos e concepções de mundo diferentes dos seus. Filho e filha precisam de pais amáveis, que acreditem num mundo plural, que não distorçam a sexualidade, sendo homofóbicos e preconceituosos. Que não marginalizem seus filhos gays. Que os vejam como seres humanos, que serão acolhidos da mesma maneira que os entes heterossexuais. O que forja um ser humano é o seu caráter, capacidade, honestidade, resiliência, humanismo e disciplina, entre outras virtudes, não é sua opção sexual!
A população LGBTQIA+ tem sido vítima de ataques pavorosos todos os dias. Todos os dias tem alguma pessoa da comunidade assassinada no Brasil. Alguma não! Muitas! Hitler e Mussolini perseguiram a comunidade LGBTQIA+, assassinaram em massa milhões de pessoas que não fossem, na concepção psicopata, a raça pura. “Morte aos judeus, aos gays, aos ciganos, aos PCDs…” Nunca esqueçamos do prenúncio do mal, tão bem descrito pelo cineasta sueco Ingmar Bergman em seu extraordinário filme “O Ovo da Serpente”, que se passa na Alemanha pré-Hitler, com a “República de Weimar” sendo esfarelada e a democracia indo para o ralo.
Aqui nas terras brasillis, fomos os últimos a encerrar o ciclo desumano, cruel, covarde e sinistro da era escravagista nas Américas. Um ano depois do fim da escravatura, uma república nasce fruto de conchavos entre as elites militar e política do país, sem a participação popular. Elite essa irritada e inconformada com o fim da escravidão.
No Brasil, a direita extremista sempre esteve presente entre nós. Getúlio namorou o nazi-fascismo até nossos navios mercantis serem afundados pelos nazis em 42, e já com os EUA na guerra pós-Pearl Harbor. Mas, de 37 a 42, fez barbáries sob o comando do famigerado Filinto Müller, que, entre outros crimes, enviou a judia Olga Benário Prestes, grávida, para as mãos do monstruoso Hitler, onde foi assassinada. Não fosse o grande desempenho de Oswaldo Aranha, chanceler pró-Aliados, e, sobretudo, as massas que foram para as ruas pressionar Getúlio para se juntar aos Aliados, Getúlio nos levaria para o fascismo. Era fascinado por Mussolini.
Plínio Salgado e seus seguidores “camisas verdes” eram fascistas declarados e tinham uma saudação “Anauê”. Plínio era um pseudo-intelectual da direita extrema que inventou uma raça pura brasileira. Doido de pedra. Mas com quem Getúlio fez aliança por anos. Até não servir mais quando da entrada do governo brasileiro na guerra ao lado dos Aliados e os benefícios arrancados dos EUA, como a construção da CSN, em Volta Redonda, primeira siderúrgica brasileira.
A mulher foi votar somente em 1945 para presidente da república. Que, aliás, foi a primeira eleição de verdade no país desde 1500. Mas em 1964, veio o golpe. Somente em 1988, tivemos a primeira “Constituição Cidadã”, sob o comando de Ulisses Guimarães. De lá pra cá, aos trancos e solavancos, nossa democracia tem vencido todas as batalhas.
Deus não pode ser utilizado, em qualquer religião ou pregação, para segregar e discriminar. Ele é o antônimo dessas barbaridades. Ele é Amor.
Não deixemos que a nossa Pátria seja a da segregação, do preconceito, da intolerância. Que não volte a Pátria que o belíssimo poema de Vinícius de Moraes, “Pátria Minha”, desolado no exílio, descreve com ternura e tristeza. O poetinha era diplomata e foi cassado pelo golpe.
Família é a base. Essa frase, lugar comum, é verdadeira. Família é a base! Mas que família? Importa os gêneros? As escolhas sexuais de cada membro da família? Ou o que importa é ter uma família de verdade? Amiga, solidária, presente, amorosa. Que viva em paz e que dê suporte aos seus entes queridos.
Francamente, fico chocado com a apropriação pelos fanáticos do lema “Deus Pátria e Família”. Em 64, houve manifestações pujantes como a “Marcha com Deus pela Família”.
Deu no que deu…
SÉRGIO CABRAL FILHO – Jornalista e Consultor Político da Tribuna da Imprensa Livre.
Instagram @sergiocabral_filho
Envie seu texto para mazola@tribunadaimprensalivre.com ou siro.darlan@tribunadaimprensalivre.com
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