Por João Batista Damasceno

Reducionismo é uma tendência consistente em abreviar fenômenos complexos, analisando-os e explicando-os exclusivamente por um dos seus componentes mais simples. As insatisfações manifestadas quando das Jornadas de Junho de 2013 foram interpretadas por muitos como oposição ao aumento das passagens do transporte público em vinte centavos. Revogados os aumentos e mantidos os protestos imputaram-lhes qualidade de manifestações orquestradas contra governantes específicos. Desconsideram-se as reais razões do descontentamento e abriram-se as portas para os que prometiam soluções simples para os problemas complexos.

O moralismo absorveu o discurso institucional e político e a difusão de fake news serviu de escada para a ascensão da ignorância audaciosa. A internacionalização da Economia e a crise globalizada tem propiciado redução da qualidade e expectativa de vida, difundindo mal-estar. O capital internacional que entrou no país e prognosticou determinada taxa de rentabilidade não aceita receber menos que o programado.

Daí a redução dos postos de emprego, achatamento de salários, precarização do processo produtivo e outros meios para manter o lucro esperado, ampliando a desigualdade social, desconsiderando o princípio da dignidade da pessoa humana e impedindo a realização dos direitos fundamentais e sociais, esculpidos na Constituição, dentre os quais Educação, Saúde, alimentação, trabalho, moradia, transporte, lazer, segurança, previdência social, proteção à maternidade e à infância e assistência aos desamparados.

A democracia é a força política do número. E se propositadamente parcela da população é afastada do direito à Educação fica sujeita à incompreensão dos valores que permeiam as relações sociais e que são marcos de civilidade, convertendo-se em presa fácil para o oportunismo. Num cenário de insatisfação, incompreensão e conflito o campo se torna fértil para os propagadores de soluções simplistas a exemplo do que o mundo experimentou na primeira metade do século XX na Itália fascista e Alemanha nazista.

As instituições foram criadas para dar referência de ordem, e não para impô-la, e reduzir as incertezas do futuro. Dos chefes dos poderes do Estado exige-se tenham paixão pela causa pública, sentimento de responsabilidade e senso de proporção na tomada de decisões. Imbróglios institucionais, por vezes decorrem de excessiva paixão no exercício do poder e ausência de sentimento de responsabilidade, acarretando falta de proporcionalidade nas decisões estatais.

Dispõe a Constituição que os deputados e senadores são invioláveis, civil e penalmente, por quaisquer de suas opiniões, palavras e votos.

A imunidade, no entanto, se destina ao fiel exercício do mandato, visando a realizar os objetivos fundamentais da República, quais seja, construir uma sociedade livre, justa e solidária; garantir o desenvolvimento nacional; erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais, bem como promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.

A imunidade parlamentar não pode ser utilizada contra tais objetivos. E, se for tentada a violação, cabe aos demais poderes o exercício do controle. Dispõe também a Constituição que compete privativamente ao Presidente da República conceder indulto e comutar penas, com audiência, se necessário, dos órgãos instituídos em lei.

O juízo sobre a necessidade ou não de consulta aos órgãos instituídos por lei é uma faculdade do presidente da República. Mas, seja mediante prévia consulta ou dispensando-a, deve o chefe do poder político – no exercício de suas funções – subordinar-se aos interesses da sociedade e aos princípios que norteiam os atos da Administração Pública, dentre os quais, legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência. A conduta dos administradores públicos ou chefes de poder visando a caprichos ou atendimentos de interesses pessoais de aliados ou correligionários torna o ato praticado inválido.

Monteiro Lobato disse que “uma nação se faz com homens e livros”. O autor chamava a atenção para a importância da leitura na construção de uma identidade social e desenvolvimento de um país. Mas já tivemos na elite política brasileira quem acreditasse que “livros têm muita coisa escrita”, denotando o desprezo pela Ciência, pelo conhecimento e pela Cultura, indispensáveis ao processo de socialização.

O resultado não poderia ter sido outro que não o rodeamento por quem igualmente não tinha apreço pelos valores fundamentais à sociedade e que eram capazes de atos vis, tais como pequenos falseamentos e vilipêndio a memória de vítima de assassinato. A pequena falsificação, por vezes, apenas demonstra a estatura de quem a pratica, de quem a ordena, tolera ou dela tira proveito.

Maquiavel, no seu livro O Príncipe, dedicou um capítulo aos auxiliares dos governantes e disse que “a primeira opinião que formamos de um príncipe e da sua inteligência estriba-se na qualidade dos homens que o circundam”. É isso!

JOÃO BATISTA DAMASCENO é Doutor em Ciência Política (UFF), Professor adjunto da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ); Desembargador do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ); Membro do Conselho Consultivo do Jornal Tribuna da Imprensa Livre; Colunista do Jornal O Dia; Membro e ex-coordenador da Associação Juízes para a Democracia; Jornalista com registro profissional no MTPS n.º 0037453/RJ, Sócio honorário do Instituto dos Advogados Brasileiros/IAB, Conselheiro efetivo da ABI.

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