Redação

Jair Bolsonaro (PL), familiares e o seu governo acumulam uma série de casos de suspeita de corrupção, além de colecionarem ações no sentido de barrar investigações e esvaziar instituições de fiscalização e controle. Funcionários fantasmas e rachadinhas nos gabinetes da família foram casos denunciados antes de assumir o poder.

Há diversos relatos, investigações e documentos que levantam a suspeita de que Jair Bolsonaro e dois de seus filhos parlamentares, Flávio e Carlos, tenham mantido por anos funcionários fantasmas e esquema de “rachadinha” (apropriação de parte dos salários de servidores) em seus gabinetes.

RACHADINHAS E FANTASMAS – Em março, o Ministério Público do DF apresentou à Justiça uma ação pedindo a condenação do presidente por improbidade administrativa no caso Wal do Açaí, revelado em reportagem da Folha de 2018. Outras reportagens da Folha e de outros órgãos de comunicação como as revistas Época e Veja e o jornal O Globo também mostraram fortes indicativos de funcionários fantasmas e rachadinhas nos gabinetes da família.

Bolsonaro e os filhos sempre negaram irregularidades, mas nunca responderam de forma direta às evidências dos supostos esquemas. Flávio e a família trabalharam também para barrar as investigações sobre o esquema das rachadinhas.

O CASO QUEIROZ – Em dezembro de 2018, o Estadão revelou documento do Coaf apontando movimentação atípica de R$ 1,2 milhão na conta de Fabrício Queiroz, assessor de Flávio Bolsonaro na Assembleia do Rio, além do depósito de R$ 24 mil na conta da futura primeira-dama, Michelle Bolsonaro.

A família Bolsonaro e Queiroz sempre deram evasivas ou afirmações desencontradas para tentar explicar a história, cujas idas e vindas incluíram a prisão de Queiroz quando ele se escondia na casa do advogado dos Bolsonaros Frederick Wassef, além da versão de Queiroz de que o dinheiro era proveniente da compra e venda de carros.

Michelle nunca se manifestou sobre o caso. Bolsonaro disse que o cheque era parte do pagamento de uma dívida de R$ 40 mil com Queiroz, embora nunca tenha mostrado documentos ou extratos bancários comprovando isso. Quebra de sigilo revelada pela revista Crusoé mostrou que os depósitos de Queiroz na conta da primeira-dama somaram R$ 89 mil.

OUTROS CASOS – Em 2018, ainda na pré-campanha, a Folha mostrou que Bolsonaro e seus três filhos que têm mandato parlamentar apresentaram uma expressiva evolução patrimonial atuando quase que exclusivamente na política, com um total de 13 imóveis que somavam R$ 15 milhões em preço de mercado, a maioria em pontos altamente valorizados do Rio de Janeiro. Em 2021, Flávio comprou uma mansão em Brasília por R$ 6 milhões.

Além disso, o presidente manteve por quase dois anos em sua equipe o ministro Marcelo Álvaro Antônio (Turismo), que foi indiciado pela Polícia Federal e denunciado pelo Ministério Público em decorrência do caso de candidatos laranjas no PSL.

Outro caso foi o chefe da Secretaria de Comunicação Social receber dinheiro de emissoras e agências contratadas pelo governo, por meio de uma empresa da qual era sócio. A PF abriu inquérito em janeiro de 2020 após reportagem da Folha revelar o caso, mas não há notícia de conclusão. Pouco depois de o caso vir à tona, disse que Fábio Wajngarten não era criminoso e seguia firme no cargo. No mês seguinte, demitiu o chefe da Secom.

OBRAS SUSPEITAS – Reportagem do Jornal Nacional, da TV Globo, mostrou que militares tentaram fazer na Superintendência do Ministério da Saúde no Rio obras de reforma sem licitação, firmadas com empresas suspeitas. Usaram a pandemia como justificativa para a dispensa de licitação. A AGU barrou os contratos e o coronel da reserva George Divério perdeu o cargo de superintendente do Ministério no Rio.Bolsonaro não se manifestou

Outro caso: Ricardo Salles pediu demissão do Ministério do Meio Ambiente em junho de 2021, um mês após ser alvo de operação da Polícia Federal nas investigações sobre madeireiras suspeitas de contrabando no Pará.

Bolsonaro reagiu à operação da PF dizendo que Salles era um ministro excepcional e que era vítima de setores aparelhados do Ministério Público.

VACINA COVAXIN – Bolsonaro não adotou nenhuma providência comprovada após receber em março de 2020 relato do deputado federal Luis Miranda (União Brasil-DF) de corrupção envolvendo a importação da vacina indiana Covaxin. Inquérito policial foi instaurado mais de um ano depois, em meados de 2021, somente após as suspeitas virem à tona durante a CPI da Covid.

Em depoimento ao Ministério Público revelado pela Folha, o servidor da área técnica do Ministério da Saúde Luis Ricardo Miranda, irmão do deputado, relatou ter sofrido pressão atípica para tentar garantir a importação da vacina. O Ministério da Saúde suspendeu o contrato para obtenção de 20 milhões de doses da vacina, ao preço de R$ 1,61 bilhão.

Bolsonaro disse ter repassado a denúncia de Miranda ao ministério, mas nunca apresentou comprovação disso.

OUTRAS VACINAS – O caso: Houve vários episódios nebulosos no processo de aquisição, pelo governo brasileiro, de vacinas contra a Covid. Em caso revelado pela Folha, o cabo da PM e lobista Luiz Paulo Dominghetti acusou o então diretor de Logística do Ministério da Saúde Roberto Dias de cobrar US$ 1 de propina por dose da vacina AstraZeneca. Roberto Ferreira Dias foi exonerado no mesmo dia e hoje processa Dominghetti por crimes contra a honra.

Em outro episódio, também revelado pela Folha, o então ministro da Saúde Eduardo Pazuello prometeu a um grupo de intermediadores comprar 30 milhões de doses da vacina chinesa Coronavac oferecidas por quase o triplo do preço negociado pelo Instituto Butantan.

Em mais um caso, documento da área técnica do TCU (Tribunal de Contas da União) obtido pela Folha aponta “indícios robustos” de fraude em licitações por parte da empresa que forneceu ao Exército o insumo necessário à produção de cloroquina, em 26 licitações feitas entre 2018 e 2021. Bolsonaro sempre adotou o discurso de que não houve corrupção, porque as negociações sob suspeita não foram adiante.

BLINDAGEM NA CÂMARA – No poder, Bolsonaro se aliou ao Centrão, o que lhe permitiu se ver livre da ameaça dos mais de cem pedidos de impeachment que hoje estão na gaveta do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL). O Centrão avançou sobre ministérios e diversas áreas do governo, entre elas o FNDE (Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação) e a Codevasf, além de controlar a distribuição de R$ 16,5 bilhões das emendas de relator.

Bolsonaro mudou completamente o discurso sobre o centrão e, inclusive, se filiou ao PL de Valdemar Costa Neto, com quem agora divide o palanque eleitoral.

Surgiu o escândalos dos pastores lobistas. Sete dias após a Folha publicar áudio em que Milton Ribeiro disse que privilegiava pastor evangélico a pedido de Bolsonaro, o ministro da Educação perdeu o cargo. O balcão de negócios no MEC, cuja existência foi revelada inicialmente pelo Estadão, era operado por dois pastores evangélicos. Bolsonaro disse que botava a cara no fogo por seu ministro. Quatro dias depois, foi publicada a exoneração.

O KIT DE ROBÓTICA – Reportagem da Folha mostrou que o governo enviou verba a prefeituras para compra de kit de robótica para escolas com gravíssimos problemas de infraestrutura, como falta de sala de aula, de computadores, internet e até de água encanada.

A empresa que intermediou o negócio é de um aliado do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL) que controla a distribuição das verbas usadas na compra dos kits. Em nova reportagem, A Folha mostrou que os kits foram vendidos às prefeituras com ágio de 420%.

“Vai botar a culpa em mim? Não tenho nada a ver com isso”, disse Bolsonaro, apesar dos recursos serem do governo federal.

EMPRESA DE FACHADA – A Folha mostrou que a empreiteira Engefort, que lidera contratos recentes da estatal federal Codevasf para pavimentação, ganhou diferentes licitações nas quais participou sozinha ou na companhia de uma empresa de fachada registrada em nome do irmão de seus sócios. O governo já reservou cerca de R$ 620 milhões do orçamento para pagamentos à empresa, sendo que R$ 84,6 milhões já foram desembolsados. A gestão Bolsonaro passou ainda a usar em larga escala uma manobra licitatória —e m especial na Codevasf, sob controle do Centrão — para dar vazão aos recursos, deixando em segundo plano o planejamento, a qualidade e a fiscalização, e abrindo margem para serviços precários e corrupção.

O que Bolsonaro disse e fez? Não se manifestou

ÔNIBUS ESCOLARES – O Tribunal de Contas da União suspendeu a homologação de um pregão eletrônico para a compra de até 3.850 ônibus escolares para avaliar a suspeita de sobrepreço. Reportagem do Estadá informou que o processo ignorou alertas de superfaturamento de técnicos do FNDE (Fundo Nacional de Desenvolvimento de Educação) e da CGU (Controladoria-Geral da União).

O que Bolsonaro disse e fez? Cobrou a realização da licitação. “Veja o que vai acontecer, para ver o preço de cada ônibus. Esperar acontecer para a gente comentar sobre isso daí”

Outro caso: Polícia Federal apura suspeita de tráfico de influência e lavagem de dinheiro na doação de um carro elétrico avaliado em R$ 90 mil por empresas do Espírito Santo a um projeto parceiro da empresa de Jair Renan, a Bolsonaro Jr. Eventos e Mídia. O empresário que fez a doação ao filho “04” foi recebido por Bolsonaro no Palácio do Planalto. Bolsonaro disse que não sabe se o filho está certo ou errado nesse caso.

CIRO NOGUEIRA – A PF afirmou neste mês que o ministro da Casa Civil de Bolsonaro cometeu os crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro por ter recebido propina da JBS para que o PP apoiasse a reeleição de Dilma Rousseff (PT) em 2014. Bolsonaro não se manifestou.

Mais um caso: o governo autorizou o repasse de R$ 6,2 milhões a duas ONGs até então inativas e recém-assumidas pelo ex-jogador Emerson Sheik e por Daniel Alves, lateral-direito da seleção brasileira de futebol. Após a publicação da reportagem pela Folha, o Ministério da Cidadania disse que Sheik desistiu do convênio. O que Bolsonaro disse e fez? Não se manifestou. ​

E nunca esquecendo que o senador Flávio Bolsonaro acionou a estrutura do governo do pai para tentar reunir elementos que lhe permitissem barrar as investigações do caso das rachadinhas. Entre outros órgãos, a Folha mostrou que servidores da Receita Federal foram mobilizados por quatro meses para investigar colegas do órgão que, supostamente, teriam municiado investigadores com dados fiscais de Flávio e de familiares.

Fonte: Folha de SP


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