Por Ricardo Cravo Albin –
A quem se queixar dos males que infestam o país? Ao bispo – uma tradição brasileira – já não tem mais sentido. Primeiro, porque os bispos já têm afazeres em demasia. Segundo, porque a palavra anda meio gasta por excesso de uso indevido, especialmente quando é fortemente usada pela igreja do “bispo” Macedo e seus auxiliares. E terceiro porque certos bispos católicos, ao menos alguns insensatos, não concordarão com a tese que passo a reclamar. Portanto, a advertência cairá mesmo no presidente Lula, nosso máximo dirigente.
A coisa é antiga, e todas as pessoas que pensam este país – um mínimo que seja – já se manifestaram.
Estou a me referir aos feriados. Impõe-se bem mais que uma simples reflexão. Impõe-se, na verdade, um estado de alerta geral – contra esse descalabro, que é a institucionalização do não-trabalho, ou seja, uma possível civilização da indolência. De fazer corar pensadores tão diferentes como Sérgio Buarque de Holanda e Gilberto Amado, vivos estivessem.
Por que a insistência obtusa de certos políticos em homenagear nossos heróis com a máxima “pernas pro ar que ninguém é de ferro”? Um país que se reconstrói a duras penas como o Brasil precisa adotar um comportamento mais severo no relacionamento com o trabalho. Agora, se o trabalho é mal remunerado – e o é em geral – isso nada deve ter a ver com o trabalhar menos. Até porque o axioma é de cruel fatalidade: quanto menos trabalho, mais pobreza, menos riqueza e menor salário.
Os feriados são muitos e– na talvez maioria – injustificáveis. Até porque está na hora exata de o Brasil se alçar a uma objetividade de comportamento, como em outros países civilizados.
Vamos, então, desfiar o nosso rosário de feriados e tentar equacioná-los.
Primeiro, as datas universais do mundo ocidental: dias 1o de janeiro (Dia Mundial da Paz), 1o de maio (Dia do Trabalho) e 25 de dezembro (Dia da Cristandade, nascimento de Jesus). A esses, o senso geral indica a permanência, pura e simples.
Quanto aos outros, é hora de mexer. Comecemos pelos religiosos. Alias, julgo-me isento, embora constrangido, porque sou devoto da Igreja Católica. São eles, se a memória não falha, a sexta-feira da Semana Santa (tem gente que enforca a semana inteira), o Dia de Corpus Christi, o Dia da Padroeira do Brasil (12 de outubro), os Dias de São João e São Pedro (feriados em muitos lugares), o Dia de Finados (2 de novembro – e que se estendo ao dia anterior, Dia de Todos os Santos), o Dia da Imaculada Conceição (8 de dezembro, feriado em muitos lugares do país) e o Dia da Véspera de Natal (é imoral o meio-feriado, quando tudo pára simplesmente porque é véspera, uma simples véspera). Os feriados religiosos estão na tradição dos brasileiros, por certo. Mas com a frouxidão dos costumes e dos tempos – o sentido verdadeiro da religiosidade ficou restrito aos fiéis, e só a eles. A Igreja Católica, ao meu ver, deveria celebrar seus dias reverenciais no recolhimento dos verdadeiros católicos. Os outros cultos – judaicos, protestantes, espíritas, muçulmanos e xintoístas – praticam suas datas sagradas, responsabilizando-se por elas. E nunca as impondo aos outros credos. Muito menos ao país, com a pecaminosa perda das riquezas para o povo que deixam de ser produzidas, como diria o filósofo católico Alceu de Amoroso Lima.
Quanto às chamadas datas nacionais, a tese da paralisação do trabalho também prolifera. Até duas, três décadas atrás, o carnaval começava no sábado à tarde e ia até a Quarta-feira de Cinzas. Só que a partir das 12 h. o trabalho era normal. E agora? Agora o sábado já é todo enforcado e a tradição já decretou: enforca-se toda a Quarta-feira de Cinzas e de lambuja também se vão a quinta e a sexta . Isto é, nove dias de paralisação. E isso poucas semanas depois do dezembro já quase todo paralisado pelas festetas intermináveis.
Seguem-se-lhe depois: o Dia da Cidade (1o de março), o Dia de Tiradentes ( 21 de abril), o Dia da Independência (7 de setembro), o Dia da Proclamação da República (15 de novembro), o Dia de Zumbi (20 de novembro). E – para cúmulo dos nossos pecados – os meios-feriados dos Dias do Funcionário Público (28 de outubro), do Comerciário (também outubro), do Professor (sei lá quando). Pretextos, todos eles invariavelmente, para que a última moda da esperteza nacional seja cumprida. E no que vem a ser o pior de tudo: enforca-se o dia anterior ou o dia posterior quando um feriado cai ou na terça ou na quinta-feira. Devemos, pois, admitir tais abusos? Absolutamente não. O único feriado que o bom senso deve preservar, além dos feriados universais, já citados, é o Dia Nacional do Brasil – o Sete de Setembro. E as homenagens devidas? Como homenagear nossos valores tão caros, nossos heróis tão amados? Trabalhando. Que nenhuma homenagem pode ser mais digna que o trabalho.
Tenho observado – e com muitíssimo pesar – que a vontade de trabalhar menos no Rio aumentou nesses cinco anos. Nesta crônica, refiro-me ao meio feriado da véspera de Natal, chamando-o de imoral, exatamente porque meio e porque véspera.
EM DEFESA DAS PRAIAS
Vez por outra, refiro-me aqui que o Brasil parece estar de pernas ao ar. Por conta de propostas malucas, quase sempre sugeridas por representantes do povo.
Agora mesmo, deparo-me com muitos artigos nos jornais a advertirem sobre a PEC para privatizar as praias, retirando-AS da União (Federal) para serem administradas pelos estados e/ou municípios. Mas não só praias como terrenos de marinha.
O relator da emenda constitucional, o senador Flavio Bolsonaro, parece não se dar conta dos estragos que as marés já vem provocando, exatamente pelos danos contra a natureza e contra o próprio mar.
A linda praia de Atafona ( no norte do Estado do Rio, um dos xodós da minha juventude) simplesmente não existe mais. Estamos sim, em período gravíssimo de mudanças climáticas. E uma de suas consequências, podem anotar, será a elevação do nível dos mares – para onde irão as dezenas de tonelada dos gelos dos polos, vitimas diretas do aquecimento global?
Nossos deputados e senadores ao invés de pensar em abrir espaço para especulação imobiliária privatizando praias, deveriam se esforçar ao máximo para ampliar as faixas de proteção aos oceanos, o que alguns países já começam a fazer, como a Dinamarca e a Austrália.
Só assim, salvamo-nos todos, as praias, os oceanos. Os mares e as marés…
RICARDO CRAVO ALBIN – Jornalista, Escritor, Radialista, Pesquisador, Musicólogo, Historiador de MPB, Presidente do PEN Clube do Brasil, Presidente do Instituto Cultural Cravo Albin e Membro do Conselho Consultivo do jornal Tribuna da Imprensa Livre. Em função das boas práticas profissionais recebeu em 2019 o Prêmio em Defesa da Liberdade de Imprensa, Movimento Sindical e Terceiro Setor, parceria do Jornal Tribuna da Imprensa Livre com a OAB-RJ.
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