Por Ricardo Cravo Albin

“Adoro esse Cristo turista/De braços abertos/Que procura equilíbrio/Na montanha brasileira. /Os homens de fé têm esperança n’ Ele/Porque Ele é ligeiro, porque Ele é ubíquo, /Porque Ele é imutável. /Ele acompanha o homem de cimento armado/Através de todas as substancias, /Através de todas as perspectivas, /Através de todas as distancias.” (Jorge de Lima – 1949).

A mesma Arquidiocese do Rio que inaugurou a estátua do Cristo Redentor em 1931 (há exatos 90 anos), a mesma que a construiu pela coragem do Cardeal Sebastião Leme ao lançar a Semana do Monumento em 1923, que arrecadou 2.500 contos de réis, o equivalente a R$ 9,5 milhões, a mesma Arquidiocese acolheu a iniciação da aplicação das aguardadíssimas primeiras vacinações há poucas horas aplicadas na cidade de São Sebastião.

Como disse o grande poeta católico Jorge de Lima na epígrafe que encima esta crônica, porque este Cristo Redentor é ligeiro, oblíquo e imutável. E acompanha o homem de cimento armado, através de todas as substâncias.

A placidez da beleza dos versos do poeta alagoano me faz agradecer ao nosso atento Cardeal Arcebispo Dom Orani João Tempesta, acolitado pelo reitor do monumento, o padre Omar Raposo, o acolhimento da cerimônia embaixo dos braços abertos do Cristo, postos em forma do símbolo da cruz.

A bela iniciativa de Dom Orani evoca que o Cardeal Sebastião Leme também criaria a PUC Rio e a Instituição acadêmica da Igreja Católica e de seus pensadores, o Centro Dom Vital, este a cumprir centenário virtuoso em 2022, erguido pela fé de escritores e filósofos do porte de Jackson de Figueiredo, Alceu de Amoroso Lima, Sobral Pinto, entre dezenas de católicos e pensadores reconhecidos no Brasil e no mundo, em especial no Vaticano.

Infelizmente esses traços acima de virtudes louvadas e de evocações justas, expressas em momento de rara alegria, não podem ficar restritos a seus contrastes solitários. E não podem por motivo muito simples e contundente. Não há como perdoar a tragédia de Manaus, quando a falta de tudo, a começar pela falta de vergonha na cara dos administradores regionais, estaduais e federais levaram pessoas como eu e você a assistir como em filme de terror à dezenas de mortes de doentes por falta de oxigênio – e de leitos, e de remédios. De mínima organização, de gestão, de tudo, enfim.

É claro que a tragédia repercutiu em todo o mundo, já horrorizado com os desacertos do governo Bolsonaro em quase todos os setores, como a gestão ambiental (Amazonas, Pantanal e etc etc), a questão diplomática (as gafes umas em sequência de outras do Chanceler -Pigmeu), que conseguiu o impossível, afastar os dois – OS DOIS – principais parceiros econômicos do país, a China e os Estados Unidos, no pico da crise econômica mais devastadora das últimas décadas.

Não à toa, os insumos para a fabricação das quase 400 milhões de vacinas de que o Brasil carece estão nas mãos dos chineses.

A incompetência que até faz parecer sabotagem do Chanceler-Anão sequer tem respaldo em países do bloco de emergentes, o BRICS, como Rússia e China. Que ao que se deduz das declarações tatibitates do Ministro da Saúde sequer atenderam aos apelos do Brasil para enviar de imediato suas vacinas nacionais. E por que? Porque a chancelaria brasileira é um desastre. Acompanhada passo a passo pelo não menos previdente Ministério da Saúde, que dormia e roncava há meses, tempo em que países menores e sem maiores recursos se precaviam, encomendando com certeira antecipação a imunização para seus povos.

Mas por que cargas d´água isso desabou em nossas cabeças, logo nós, com mais de 200 milhões de almas? Pelo negacionismo alvar do Presidente da República, muito mais preocupado em sua própria reeleição que em salvar seus hoje insatisfeitos (talvez possíveis) eleitores.

O desprezo pela pandemia, a atenção só agora despertada por ela, fizeram Bolsonaro acreditar que o Brasil tiraria de letra a logística da vacinação. Que logística, meu Deus? Ele fez corpo mole e ainda deu um cala boca público no General da Saúde.

No entanto, o desgoverno me parece de tal ordem, o ministro é de tal maneira frágil e dúbio em suas sempre confusas explicações, que minha animação pelas primeiras vacinações abrigadas pelos braços em cruz do Cristo Redentor começa a se esmaecer qual fumaça, a desvanecer-se qual nuvens no céu.

Meu irmão que torce muito pelo Bolsonaro não se conforma com minhas cobranças constantes. Retruco-lhe sempre com uma verdade – se você acha que isso me dá prazer, asseguro-lhe que só me faz sangrar. E torcer para que tudo se ajeite, entre nos eixos devidos. Mas por onde começar, tal o tamanho e a constância dos erros sistemáticos? Como brasileiro e católico, ninguém pode torcer tanto por meu país, meu povo. E pelo líder maior da nação, seu Presidente.

Saiba, meu caro mano, que rezo pelos três: país, povo, presidente. Mas atenção, nessa exata ordem decrescente. E de olho bem vigilante no último.


RICARDO CRAVO ALBIN – Jornalista, Escritor, Radialista, Pesquisador, Musicólogo, Historiador de MPB, Presidente do PEN Clube do Brasil, Presidente do Instituto Cultural Cravo Albin,  Colunista e Membro do Conselho Consultivo do jornal Tribuna da Imprensa Livre.