Por Wladmir Coelho 

1 – Anuncio publicado nos maiores jornais do Brasil assinado por um grupo denominado “médicos pela vida” assumiu a defesa dos vermífugos e medicamentos para o tratamento da malária como forma de prevenir ou amenizar os efeitos da Covid-19. Confesso não fiquei surpreso, afinal conheço bem os métodos e práticas das classes dominantes do nosso auriverde torrão e sua obstinação em manter a ordem (econômica, política) resultando esta prática, historicamente, na defesa da escravidão, na eliminação violenta de qualquer ato de resistência do povo, em ataques sistemáticos a qualquer iniciativa de rompimento com a  dominação imperialista recorrendo as  sinhazinhas e sinhozinhos das classes dominantes, além da repressão física, ao uso e abuso da arrogância bacharelesca fundamentando esta as teorias racistas, economicistas pseudocientíficas a justificar a condição colonial brasileira sempre ocultando a vantagem desta para os poderosos.

2 –  Vejamos: o bacharelismo colonizado deitou e rolou utilizando o discurso da ciência burguesa, veja bem burguesa, a favor da manutenção da escravidão associando este ao determinismo presente no pensamento economicista liberal, a saber, a espera paciente do caminhar, sempre pela via da subserviência, da condição colonial agrária em  independente, industrializado respeitando assim a ordem natural. Existiram, é verdade, dentre os sinhozinhos aqueles defensores da extinção da escravidão, contudo esta humanização senhorial não implica em aceitação imediata do trabalho assalariado e superação da prática colonial passando os latifúndios exportadores destes, também daqueles, a aplicar diferentes métodos de exploração servil do trabalho as vezes até pagando algum salário.

3 – Os médicos, os advogados, os engenheiros nacionais eram recrutados principalmente entre os filhos das classes dominantes recebendo nas poucas faculdades existentes uma formação importada da Europa – depois dos Estados Unidos – aprimorando os vícios e preconceitos locais acrescidos do pensamento burguês imperialista dito científico.  Esta importação permitiu, por exemplo, classificar como fanáticos e inimigos da civilização cristã ocidental os revoltosos do campo entendidos como inferiores em função da condição dita racial, do analfabetismo associado a incapacidade intelectual. Incomodava aos poderosos a religiosidade popular, sincrética apresentando esta os fundamentos da justiça, do direito à vida distantes e destoantes da burocracia da religião associada aos interesses dominantes. Em meados do século 20 os filhos e netos destes “fanáticos” camponeses desalojados de suas posses em nome da modernização  continuaram classificados – inclusive nos órgãos de repressão –  como ameaça a civilização apresentando as classes dominantes, desta vez, uma adequação dos motivos; assim a alfabetização, a escolarização e a organização em bases políticas, em substituição a religiosa popular, passam a ser considerados uma forma de infiltração comunista entendido esta em sua condição de ameaça à ordem natural solidamente associada a santificação da propriedade privada incluindo neste caso a mão de obra alheia.

4 – Esta submissão ao imperialismo chegou ao ponto mais elevado quando transformado em regime político primeiro no formato de uma ditadura militar, depois em democracia tutelada acompanhada ou tutelada pelos defensores armados. Em crise este acompanhamento vai retomando a sua condição anterior ocupando aqueles senhores a naturalização do processo de espera de tempos melhores sempre com o sacrifício dos trabalhadores. O que tem isso com aquele anúncio dos médicos em defesa do vermífugo como forma de combater uma terrível pneumonia lá do início do texto?

5 – Respondo: a ciência não está livre das intervenções de ordem ideológica e não foi sem motivo a ocupação militar deste setor seja em sua representação no tratamento e prevenção das diferentes enfermidades ou na pesquisa sem falar na educação. Somos um pais submetido aos interesses do imperialismo apresentando esta prática uma estrutura  dita científica mantida com o uso da força a partir de  uma estrutura repressiva fundada na alucinação da guerra total na qual o princípio da defesa interna é executado de modo a atender a manutenção de um modelo responsável pelo atraso, a fome, a miséria a doença. Ao fantasiar, ao prometer falsas curas pretendem os segmentos dominantes manter a continuidade de uma organização moribunda em nome do menor gasto possível, sempre priorizando o discurso moralista do rigor fiscal garantindo deste modo o pagamento religioso dos banqueiros e a felicidade dos sinhozinhos e sinhazinhas de sempre a ganhar, e muito, em Wall Street tenham seus recursos origem no campo ou na cidade.

6 – As mortes que presenciamos e vamos presenciar ao longo da pandemia, considerando a crendice da guerra total, assumem a condição de baixas decorrentes de uma batalha pela manutenção da marcha rumo a plenitude cujo sucesso encontra-se associado a continuidade da total submissão ao imperialismo este, conforme a visão deturpada das classes dominantes do Brasil, representando a forma de salvação da civilização ocidental dita cristã.  A distribuição de placebos como forma de economizar recursos preciosos para os banqueiros, a retomada das aulas presenciais, a negativa de auxílio financeiro aos milhões de desempregados, a retirada dos direitos dos trabalhadores, a destruição dos direitos sociais, assumem neste contexto a forma de sacrifício exigida para manter a estratégia de uma guerra.

Assim estão a governar o Brasil as classes dominantes. 


WLADMIR COELHO – Professor do Instituto de Educação de Minas Gerais – IEMG; Superintendente de Juventude da SEE-MG; Editor do blog Política Econômica do Petróleo e Colunista do jornal Tribuna da Imprensa Livre. Em função das boas práticas profissionais recebeu em 2018 o Prêmio em Defesa da Liberdade de Imprensa, Movimento Sindical e Terceiro Setor, parceria do jornal Tribuna da Imprensa Livre com a OAB-RJ.