Por José Carlos de Assis

A desoneração da folha de pagamentos é uma traição ao povo brasileiro e uma dádiva líquida ao capital. Trabalhadores  que se colocaram favoráveis a ela não sabem o que estão fazendo. Tudo está mergulhado num mar de interesses e de ideologia, num contexto em que o Governo lava as mãos e entrega a decisão do projeto a parlamentares que se deixam levar por puro desconhecimento. Com isso, o Congresso arranja uma desculpa “social” para premiar os setores industriais  com um inacreditável favorecimento pela retirada do imposto.

Os impostos que oneram a folha não são impostos quaisquer. São impostos vinculados ao financiamento da Previdência Social. A desoneração significa sangrar a Previdência de seu imposto mais eficaz em favor dos maganos do setor empresarial, como diria Elio Gaspari. Isso significa que o sistema previdenciário será desmontado financeiramente, sendo entregue à livre vontade do Tesouro Nacional, que destinará à Previdência o que bem quiser, e não aquilo que, de direito, ela teria, por conta da vinculação da receita.

Dirão que o Tesouro, pelo Governo federal, cobrirá os gastos da Previdência com recursos tributários correntes. Canalhas, canalhas, canalhas. Isso só acontecerá se o Governo quiser, manipulando o orçamento. Na antropofagia orçamentária em que vivemos, Paulo Gudes vai alegar, mais uma vez, que o Governo quebrou, e portanto não há dinheiro suficiente para cobrir os gastos da Previdência. Isso se tornará ainda mais premente, do ponto de vista neoliberal, se for mantida a emenda 95, que congela os gastos orçamentários globais.

E qual é a justificação que o capital, com total cobertura do Parlamento, dá para esse ataque direto aos direitos históricos dos trabalhadores, na ativa e aposentados? É a cínica alegação de que, sem a desoneração, o país perderá 6 milhões de empregos. Hipócritas. Ninguém apresentou essa conta com fidelidade. Isso é um jogo de faz de conta. É como se as empresas, para funcionarem, precisem de estrangular financeiramente os trabalhadores, sugando a mais valia que produzem até a última gota.

O fato é que as empresas que estão pedindo desoneração são as empresas que estão funcionando hoje. Elas, naturalmente, estão ganhando dinheiro. O que pedem é um excesso de lucro, aproveitando a ideologia política da pandemia.  Para atendê-las, o Governo está desestruturando um sistema previdenciário montado desde Getúlio Vargas, aprofundado por Geisel e aperfeiçoado pela Constituinte. É muita construção política que acabará  sendo destruída por uma penada por parlamentares despreparados, ou desonestos.


JOSÉ CARLOS DE ASSIS – Jornalista, economista, escritor, professor de Economia Política e doutor em Engenharia de Produção pela Coppe/UFRJ, autor de mais de 25 livros sobre Economia Política. Colunista do jornal Tribuna da Imprensa Livre. Foi professor de Economia Internacional na Universidade Estadual da Paraíba (UEPB), é pioneiro no jornalismo investigativo brasileiro no período da ditadura militar de 1964. Autor do livro “A Chave do Tesouro, anatomia dos escândalos financeiros no Brasil: 1974/1983”, onde se revela diversos casos de corrupção. Caso Halles, Caso BUC (Banco União Comercial), Caso Econômico, Caso Eletrobrás, Caso UEB/Rio-Sul, Caso Lume, Caso Ipiranga, Caso Aurea, Caso Lutfalla (família de Paulo Maluf, marido de Sylvia Lutfalla Maluf), Caso Abdalla, Caso Atalla, Caso Delfin (Ronald Levinsohn), Caso TAA. Cada caso é um capítulo do livro. Em 1983 o Prêmio Esso de Jornalismo contemplou as reportagens sobre o caso Delfin (BNH favorece a Delfin), do jornalista José Carlos de Assis, na categoria Reportagem, e sobre a Agropecuária Capemi (O Escândalo da Capemi), do jornalista Ayrton Baffa, na categoria Informação Econômica.