Por Miranda Sá –
A minha visão do Socialismo é científica; vou ao laboratório e levo o prisma político e ideológico à mesa, com a luz da liberdade explodindo em cores…. Aí lembro 1864 e a fundação da AIT – Associação Internacional dos Trabalhadores, também conhecida como Internacional Socialista ou Primeira Internacional.
Abrindo as janelas, após uma tarde chuvosa, vejo uma cortina de poeira líquida também refletindo o arco-íris multicolorido do socialismo original pela convergência dos fundadores da AIT, representando diversas correntes ideológicas da Esquerda: anarquistas, blanquistas, comunistas, cooperativistas, democratas radicais, lassalianos, owenistas, sindicalistas revolucionários, socialistas agrários e reformistas.
Nada mais atraente para os jovens. Seis anos depois, em 1870, a organização possuía mais de 200 mil membros na Europa, verificando-se entre 1871 e 1872, 50 mil na Inglaterra, 35 mil na França e na Bélgica, 6 mil na Suíça, 30 mil na Espanha, 25 mil na Itália e 17 mil na Alemanha; atravessando o Atlântico, 4 mil nos Estados Unidos.
No interior da organização, com a crescente influência de Bakunin, ficaram explícitas as divergências entre seus partidários e os de Karl Marx. O anarquista foi veemente na defesa do individualismo contra o coletivismo proposto por Marx. O confronto atingiu o seu auge em 1872, após a realização do congresso de Haia, ocasionando a ruptura entre as duas correntes; os anarquistas continuaram na AIT e os marxistas, liderados pelo alter ego de Marx, Friedrich Engels, criaram a Segunda Internacional.
No correr dos anos, tanto a “Primeira” e a “Segunda” decaíram pela brutal reação dos governos e, internamente, pelas crises ideológicas e cisões organizativas. A decadência das duas entidades acabou o que havia de mais importante na época, a convivência para o debate entre as inúmeras tendências de esquerda.
E pior. Mais tarde, assistiu-se o fim do prisma ideológico sob as botas stalinistas contra a livre expressão do pensamento, fundou-se a Terceira Internacional. A partir de então imperou o chamado “centralismo democrático”, a voz de comando do PCUS para seus membros cativos, os partidos comunistas estipendiados por Stálin.
Aí, as correntes de opinião discordantes passaram a ser criticadas, os críticos foram chamados de “colaboradores do capitalismo” e execrados politicamente como “reformistas”. O mais destacado opositor do “pensamento único” foi Eduard Bernstein (1859/1932), um dos principais teóricos alemães. Revisionista do marxismo, foi o idealizador da social-democracia, e merece ter a suas teorias estudadas….
Os aprendizes das lições bernsteinianas adotaram a convergência do socialismo para o Centro Democrático, apoiando-se nos princípios pela paz entre os povos, a defesa do meio ambiente e por uma economia proporcionadora do bem-estar; com isto, traços tecnocoloridos e vigorosos pintaram o quadro da social-democracia no Norte Europeu.
Em contraposição, tristemente, ressuscitaram da putrefata ideologia stalinista, múmias vagueando mundo afora fazendo a cabeça dos Meninos Perdidos que não conseguiram sair da Terra do Nunca; metáfora para os que passaram dos 35 anos com o stalinismo na cabeça, em vez de assumir a vida adulta, pensante e realizadora.
O comportamento infantil dos herdeiros da “ditadura do proletariado” fechou-os numa bolha que descambou para a chula teoria “Woke”, nascida nos guetos afro-americanos de Nova Iorque significando “acordar, despertar”, usado contra o racismo sofrido dos encapuçados da progênie Ku-Klux-Klan….
A adoção de significados mais amplos do Woke pela boemia intelectual dos EUA, inspirou palavras-de-ordem de protesto contra “todas as injustiças”; e terminou se enredando nas causas das minorias, principalmente dos imigrantes ilegais, desempregados pontuais, LGBT+, descontentes em geral e peripatéticas sombras da contracultura. Deixaram para os pastores evangélicos a luta contra o racismo….
Assim, luta de classes e os princípios de liberdade, igualdade e fraternidade do ideal socialista mergulharam sob o tsunami wokeísta e a esquerda de fancaria dividiu-se como “direita” e “esquerda” por discordâncias eleitorais, mas semelhantes pela intolerância acreditando serem intelectualmente superiores aos demais.
Infelizmente é este restolho politiqueiro do populismo ianque que desembarcou no Brasil trazendo na bagagem toda sorte dos malefícios em que a esquerda se envolveu e, por cretinice da militância lulopetista, acrescentou-lhes a linguagem neutra e o politicamente correto….
Desta maneira, temos triste fim dos policarpos quaresmas socialistas, convivendo e contribuindo com a grotesca polarização dos populistas corruptos Bolsonaro e Lula; e os Meninos Perdidos das tornozeleiras eletrônicas do baixo QI, fanáticos seguidores da dupla, alimentam com a ração Woke a fraudulenta disputa dos dois.
MIRANDA SÁ – Jornalista profissional, blogueiro, colunista e diretor executivo do jornal Tribuna da Imprensa Livre; Trabalhou em alguns dos principais veículos de comunicação do país como a Editora Abril, as Organizações Globo e o Jornal Correio da Manhã; Recebeu dezenas de prêmios em função da sua atividade na imprensa, como o Esso e o Profissionais do Ano, da Rede Globo. mirandasa@uol.com.br
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