Por Siro Darlan –
Causou indignação para algumas pessoas a declaração do ex-ministro Flavio Dino, agora Ministro do STF, sobre a aplicação de penas alternativas para delitos menores, como furto, crime no trânsito e contra o patrimônio.
Ora, o Ministro não disse nada diferente do que já está na legislação penal. Toda pena inferior a 4 anos, deve o juiz substituir por penas alternativas ou prisão aberta. Não se trata de impunidade, já que há pena aplicada. O fato é que grande parte dos juízes, com revés punitivista, não cumpre a lei e deixa de substituir as penas de privação de liberdade pelas alternativas. Enfatiza o ministro a inutilidade prática e econômica dessa escolha pela privação de liberdade seja por não ser uma medida eficaz, cada dia é maior o número de delitos, apesar das ameaças de penalização cada dia maior, seja pelo aspecto econômico, já que as penas alternativas resultam em promoção de serviços em prol da sociedade, enquanto a privação da liberdade representa um custo alto e inútil.
Essa indignação não tem qualquer justificativa, uma vez que o Brasil já é o terceiro país que mais prende no planeta e essa receita não tem reduzido em nada a violência. Violência não se combate com mais violência e sim como investimentos no resgate da dignidade da pessoa humana, que é tudo que falta no sistema penitenciário nacional. Quanto mais se prende, mais se gasta, e menos eficácia se alcança no combate à violência. As penas alternativas, além de reduzir os custos trazem benefícios para a coletividade. É muito mais saudável punir aplicando ao apenado uma prestação de serviços à comunidade que simplesmente recolher numa masmorra e alimentar com hotelaria um condenado. É muito mais eficaz obrigar o apenado a reparar o dano feito contra a vítima do que dar uma “satisfação de vingança” à vítima do delito.
Punir os delitos de trânsito, de dívidas alimentícias e contra o patrimônio em nada modifica a situação dos vitimados por esses delitos, enquanto a reparação seja pecuniária, seja por obrigação de participar de cursos de aprendizagem e cidadania, podem ser capazes de modificar o agressor e fazer dele um cidadão digno da convivência social. Ainda que sob o ponto de vista do capitalismo que visa apenas obter lucro, a pena de privação de liberdade tem-se mostrado um poço sem fundos, onde quanto mais se investe, menos resultados (lucros) são obtidos. Enquanto não combatermos o crime nas suas origens, ou seja, na desigualdade social, na falta de dignidade na habitação, na falta de investimentos na educação integral e obrigatória para todos, perderemos muito tempo e dinheiro sem resultados eficazes.
Um dos maiores juristas que o Brasil já teve, e que foi Ministro do STF Evandro Lins e Silva, já afirmava que: “A cadeia é uma jaula reprodutora de criminosos. Ela degrada, avilta, deforma o sujeito. E estigmatiza: ninguém mais dá emprego ao ex-presidiário e ele volta a se marginalizar para sobreviver.” Alguma possibilidade de que a prisão exerça um papel reabilitador? “A experiência universal é que ninguém sai da cadeia melhor do que quando entrou”, afirma o ex-professor de História do Direito Penal e Ciência Penitenciária. Para a reabilitação do criminoso, Lins e Silva prescreve trabalho, e remunerado, como havia quando ele começou a advogar, nos anos 30.
E reforçava seus argumentos, acrescentando: “Hoje a cadeia é um depósito de presos. Além de tudo, as penitenciárias são caras para o Estado. Cada preso custa aos cofres públicos de três a sete salários mínimos. Se esse dinheiro lhe fosse dado para sobreviver, ele não iria roubar.” Faz tempo que custava o que afirmou o Mestre do Direito Penal, hoje nas prisões do Rio de Janeiro, o custo por preso não fica menos que R$3.500 e nas prisões federais de RDD o custo alcança R$35 mil por cada preso. Quantas vagas nas escolas poderiam ser custeadas por esses investimentos?
Olhar par o outro com empatia exige um exercício de humanidade e humildade que pode resultar na convivência melhor entre os humanos. Creio ter sido essa a direção da manifestação do Ministro Dino, que agora pontificará como membro da Suprema Corte, que tem sido um exemplo de aplicação dos princípios constitucionais de legalidade, igualdade e garantia dos direitos fundamentais.
SIRO DARLAN – Advogado e Jornalista; Editor e Diretor do Jornal Tribuna da imprensa Livre; Ex-juiz de Segundo Grau do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ); Especialista em Direito Penal Contemporâneo e Sistema Penitenciário pela ENFAM – Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados; Mestre em Saúde Pública, Justiça e Direitos Humanos na ENSP; Pós-graduado em Direito da Comunicação Social na Universidade de Coimbra (FDUC), Portugal; Coordenador Rio da Associação Juízes para a Democracia; Conselheiro Efetivo da Associação Brasileira de Imprensa; Conselheiro Benemérito do Clube de Regatas do Flamengo; Membro da Comissão da Verdade sobre a Escravidão da OAB-RJ; Membro da Comissão de Criminologia do IAB. Em função das boas práticas profissionais recebeu em 2019 o Prêmio em Defesa da Liberdade de Imprensa, Movimento Sindical e Terceiro Setor, parceria do Jornal Tribuna da Imprensa Livre com a OAB-RJ.
Envie seu texto para mazola@tribunadaimprensalivre.com ou siro.darlan@tribunadaimprensalivre.com
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