Por Siro Darlan –
Os jornais estamparam nesses últimos dias mais um episódio que demonstra os malefícios da opção preferencial pelo punitivismo de grande parte do judiciário brasileiro.
Promotores e juízes incorporaram o espírito de vingança coletiva, e por falta de total conexão com a realidade social aplicam penas cruéis e sofrimento como se estivessem distribuindo bala em dia de Cosme e Damião. Totalmente fora da realidade, em seus castelos de isolamento social, vimos uma juíza trabalhista aos gritos determinar que uma testemunha assustada com o distanciamento que lhe obrigavam as circunstâncias, chamasse de “Vossa Excelência”.
No mesmo espaço de tempo um juiz do interior da Paraíba condenou três pessoas por terem sua conta bancária utilizada por criminosos, no tão conhecido golpe do telefone ou WhatsApp. Uma das condenadas tinha uma homônima trabalhando como professora numa Escola Pública do Rio de Janeiro. Expedido o mandado de prisão pelo juiz paraibano, tão rápido e irresponsável, como se executa uma sentença, o juiz fluminense executou o mandado de prisão prendendo a jovem professora dentro da sala de aula, na frente de seus alunos, enjaulando-a numa prisão comum, onde ficou presa por sete dias.
Apurou-se que a referida professora, uma jovem do interior do Rio de Janeiro, que conseguira furar a bolha da desigualdade social e realizar o seu sonho de ser professora, teria apenas dez anos na época em que foram realizados os atos criminosos na Paraíba, onde ela nunca esteve. Ademais, alertada para o erro judiciário cometido a justiça do Rio que fora tão célere para prender demorou sete dias para soltar a inocente professora.
Dirão alguns que acidentes acontecem! Mas não com a frequência com que grande parte do judiciário pratica o punitivismo como regra. Não se trata de cumprir a lei, pura e simplesmente, para isso bastaria substituir o homem juiz pelo juiz robotizado, mas de não ser fiel ao juramento de posse de “Cumprir e fazer cumprir a Constituição e as leis do país”. A Constituição estabeleceu a presunção de inocência e o judiciário brasileiro a contraria quando deixam presos 45% (quarenta e cinco por cento) da população carcerária, que ainda não tendo sido julgados têm a seu favor dita presunção.
A despeito do custo operacional da inútil pena de privação da liberdade, que na realidade é privação da dignidade da pessoa humana, a opção preferencial da pena de muitos magistrados tem sido pela aplicação da dor e do sofrimento, da tortura e da humilhação a despeito de todos os compromissos assumidos pelo Brasil com os tratados internacionais de direitos humanos.
Até quando a sociedade aplaudirá esses Pelourinhos promovidos impunemente por grande parte do judiciário brasileiro?
SIRO DARLAN – Advogado e Jornalista; Editor e Diretor do Jornal Tribuna da imprensa Livre; Ex-juiz de Segundo Grau do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ); Especialista em Direito Penal Contemporâneo e Sistema Penitenciário pela ENFAM – Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados; Mestre em Saúde Pública, Justiça e Direitos Humanos na ENSP; Pós-graduado em Direito da Comunicação Social na Universidade de Coimbra (FDUC), Portugal; Coordenador Rio da Associação Juízes para a Democracia; Conselheiro Efetivo da Associação Brasileira de Imprensa; Conselheiro Benemérito do Clube de Regatas do Flamengo; Membro da Comissão da Verdade sobre a Escravidão da OAB-RJ; Membro da Comissão de Criminologia do IAB. Em função das boas práticas profissionais recebeu em 2019 o Prêmio em Defesa da Liberdade de Imprensa, Movimento Sindical e Terceiro Setor, parceria do Jornal Tribuna da Imprensa Livre com a OAB-RJ.
Envie seu texto para mazola@tribunadaimprensalivre.com ou siro.darlan@tribunadaimprensalivre.com
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