Redação

Em Portugal, onde teve um encontro com o presidente Marcelo Rebelo de Sousa e com o primeiro-ministro António Costa, o presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva concedeu uma entrevista e falou pela primeira vez sobre a polêmica do uso do jatinho do empresário José Seripieri Júnior para se deslocar até a cidade de Sharm El Sheick, no Egito, onde aconteceu a Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas, a COP27. Ao justificar o uso do jatinho, que gerou críticas, Lula atacou o presidente Jair Bolsonaro. “Ele não ofereceu da FAB”, respondeu Lula, referindo-se à frota da Força Aérea Brasileira.

Sem a possibilidade de usar uma aeronave do governo, e diante das dificuldades que teria para ir em voo comercial e sem recursos para ele mesmo bancar o aluguel de um avião particular, Lula disse que, então, aceitou a carona de Seripieri. “Ele queria ir na COP, tinha um avião e eu fui com ele”, respondeu Lula.

Seripieri é fundador da Qualicorp e dono da QSaúde. Chegou a ser investigado na Operação Lava Jato e fez um acordo de delação no qual admitiu crime de caixa dois na campanha ao Senado de José Serra, do PSDB de São Paulo. Seripieri é amigo de Lula e doou mais de R$ 1 milhão para a sua campanha. A carona de Lula para o Egito, por assa razão, gerou questionamentos. O deputado Ubiratan Sanderson (PL-RS) chegou a pedir à Procuradoria Geral da República que abrisse uma investigação.

“Sobre a minha viagem. Eu sinceramente sabia que essa pergunta iria vir e eu queria, bem humorado, responder. Primeiro: eu fui convidado pelo governador do Amazonas [Wilson Lima] para ir à COP27. E os estados não poderiam arcar com as minhas despesas”, respondeu. Os governadores da Amazônia Legal entregaram a Lula uma carta durante a conferência. “Segundo, eu fui convidado pelo presidente do Egito [Abdul Fatah Khalil Al-Sisi. Eu fiquei muito orgulhoso, mas ele também não pagava as minhas despesas”. O Egito foi o país anfitrião da COP. “Eu tinha um amigo que queria ir na COP, ele tinha um avião, e eu fui com ele”.

Questões de segurança

Para Lula, questões de segurança, relacionadas ao ambiente após as eleições, no qual bolsonaristas ainda protestam e têm agredido aliados de Lula (nesta sexta-feira, houve um episódio em aeroporto envolvendo o senador Randolfe Rodrigues, da Rede), o impediriam em ir em voo comercial. Na mesma linha de ataques de bolsonaristas, Lula citou os episódios envolvendo ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) que participavam esta semana de um evento em Nova York, nos Estados Unidos. “Eu não posso achar que isso faz parte da democracia”, criticou.

“Segurança é uma coisa séria, e quem tem que ter responsabilidade de cuidar somos nós”, argumentou. “Se o Estado brasileiro fosse democrático, se nós tivéssemos um presidente responsável, quem sabe ele tivesse oferecido um avião da FAB para me levar. Mas não ofereceu, paciência. Eu sou grato ao meu amigo, que foi comigo e me emprestou o avião”.

Lula disse ainda desejar que Seripieri esteja disposto a lhe emprestar novamente a aeronave para outras viagens antes da posse em 1º de janeiro. “Eu vou agradecer”. O avião de Seripieri é um jato Gulfstream, com capacidade para levar 12 pessoas e autonomia para voar direto do Brasil até o Egito.



O Brazil Hub foi criado como reação à desatenção do governo Bolsonaro à COP. (Divulgação)

Com o “Brasil de volta”, como disse Lula, Brazil Hub despede-se da COP

Em 2023, como anunciou o presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva, o Brasil voltará a ter um espaço único na Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP), maior evento mundial na discussão do clima, abrigando representação oficial e a sociedade civil. Desde 2019, com o desprezo do governo de Jair Bolsonaro à agenda do clima, esta unidade não ocorre. Foi o que levou à criação do Brazil Climate Action Hub, o espaço das organizações brasileiras nas COPs, que encerrou nesta sexta-feira (18/11) sua última edição depois de garantir, por três anos, um espaço democrático aos diversos atores engajados na agenda climática.

O Instituto Clima e Sociedade (iCS), o Instituto Climainfo e o Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (IPAM), coordenadores do Brazil Hub, consideraram acima das expectativas a participação e repercussão do espaço nesta COP27, no Egito. Foram 52 eventos entre os dias 8 e 18 de novembro, com presença multisetorial e debate plural, reunindo sociedade civil, juventude, movimento negro, quilombolas, povos indígenas, parlamentares, governadores, representantes do governo de transição, setor privado, comunidade internacional.

Os painéis – assistidos presencialmente e transmitidos ao vivo – abordaram questões fundamentais para a agenda climática brasileira. A procura foi tão grande que muitas vezes o público lotou até os corredores próximos ao Hub para ouvir os debates.

Presença de Lula

Além das discussões de alto nível, as entidades apresentaram propostas concretas de governo para o presidente eleito e a equipe de transição, representada por lideranças como as ex-ministras Marina Silva e IzabellaTeixeira. O próprio Lula foi convidado especial do Brazil Hub. Este foi um dos pontos altos do Brazil Hub este ano, na avaliação da assessora de Relações Internacionais do iCS e coordenadora do espaço nas três edições, Cintya Feitosa.

“Propostas construídas ao longo desses anos amadureceram e foram entregues para a construção da agenda de clima do próximo governo. Muitas delas surgiram no Hub, que também se tornou o espaço onde as organizações queriam fazer o lançamento de suas iniciativas”, contou Cyntia. “É um sinal de que quem construiu estratégias para superarmos o desmonte ambiental e climático dos últimos anos enxergou no Hub a possibilidade do reconhecimento dos brasileiros e da comunidade internacional”.

No encontro organizado pelo Brazil Hub com Lula e sua comitiva, a sociedade civil teve a oportunidade de mostrar ao novo governo e à comunidade internacional os esforços que empreendeu para manter em alta a pauta climática mesmo diante da inação do atual governo federal. “E não foi só uma resistência, mas um espaço de debates, de pensar em caminhos e soluções concretas”, afirmou a coordenadora do Hub.