Por Maria de Fátima Siliansky –
Epidemia de COVID_19: situação sanitária e retorno presencial.
A pandemia de COVID-19 está sendo um desafio para o povo brasileiro. Além das ameaças impostas pela própria doença, o governo militar de Bolsonaro, ao não tomar as medidas necessárias para combater a pandemia, pratica um genocídio planejado. A maior parte da população sofre perdas econômicas imensas e o apoio governamental não atenua nem de longe o problema. Por outro lado, o aprendizado sobre como manejar a doença, minimizando mortes e doenças graves, tem ocorrido pari-passu ao seu desenrolar. Muitas surpresas ela tem revelado. Isso é dado da realidade, não é possível negar.
A estratégia do isolamento social como uma das medidas a serem tomadas para redução do contágio e o negacionismo da eficácia desta medida por parte da extrema-direita capitaneada por Bolsonaro, preocupada em não atingir os negócios, acabou criando em muitos setores intelectuais um certo imobilismo. Este imobilismo, na prática, colocou nas mãos dos genocidas a responsabilidade por traçar as medidas necessárias ao enfrentamento da pandemia, coisa que facilitou o próprio genocídio. Não podemos deixar que Bolsonaro e seus generais ditem a pauta do que se fazer! Neste sentido, os vigorosos movimentos de trabalhadores de saúde por condições de segurança no trabalho mostram o que se deve e pode fazer ao não aceitarem as condições de trabalho impostas pelos governos.
A Universidade, enquanto um todo, perdeu nesse período, principalmente os discentes e entre eles, os mais prejudicados têm sido aqueles de maior dificuldade de conectar-se à Internet, em geral, os de situação financeira mais precária. Mesmo o que se fez de apoio em informática não tem se revelado suficiente. Presenciamos um alto nível de abandono das disciplinas e um precário aproveitamento acadêmico. Os alunos não estão tendo acesso a livros necessários a seu aprendizado. Aulas práticas não estão sendo dadas. O acesso a computadores atualizados não é universal.
A situação presente é diferente daquela do início da pandemia e depois disso, da chamada segunda onda, quando a suspensão completa de atividades presenciais se fez justificada por um certo período. No Rio de Janeiro, similar ao Brasil, está se dando a primeira dose das vacinas anti-COVID para adolescentes. Pode-se com isso se estimar que em novembro/21, ao se iniciar o segundo semestre na UFRJ e em muitas outras universidades, teremos a maior parte da comunidade universitária vacinada com as duas doses, seja discente, docente, técnico-administrativa ou terceirizada e grande cobertura vacinal da população. Para fazer frente a redução da eficácia das vacinas com respeito a variantes virias, principalmente o Delta, planeja-se uma terceira dose de reforço.
Uma comissão da UFRJ estabeleceu apropriadamente normas de convivência presencial que devem ser seguidas quando do retorno, como limpeza e desinfecção dos espaços de aula, dos banheiros, distanciamento, máscaras, revezamento de turmas para sua redução, testagem e isolamento de casos e contactantes. Além disso, podemos incluir exigência das duas doses de vacinação. Brasil afora, isto também ocorre.
Há um arsenal técnico disponível e até desenvolvido pelas Universidades para o enfrentamento da pandemia. Acreditamos neles ou o negamos? ‘Fica em casa’ não pode ser a única coisa que temos a dizer. Essas são argumentações sanitárias que permitem não identificar justificativas para não oferecermos o segundo semestre de 2021 em caráter presencial.
O não retorno presencial: isolamento político e imobilismo em face aos cortes orçamentários para impor medidas higiênicas O isolamento que está sendo imposto a comunidade universitária, hoje, não é só sanitário. É principalmente político. Nos anos de 2020 e 2021 ataques tremendos a educação pública se tornam constantes. Em 2021, o corte do orçamento do MEC foi de 21% relativamente a 2020 num processo que já vinha de desaceleração a partir de 2014. Neste ano, os gastos federais com Educação chegavam a 130 bilhões. Em 2021 o orçamento foi de 95 bilhões.
Na cauda dos cortes, parte da comunidade universitária, inclusive Reitorias, se sentem confortáveis para impulsionar parcerias público-privadas e entrega dos hospitais universitários/HUs para empresas públicas passíveis de privatização.
Esta parte nunca acreditou na capacidade de luta popular ou concorda, desde sempre, com o papel que o Estado brasileiro progressivamente apresenta para as Universidades, de serem apoios a mercantilização do ensino, da pesquisa e da saúde. Isso está ocorrendo na UFRJ com o Projeto “Viva UFRJ,” que prevê a especulação imobiliária do campus da Praia Vermelha e outros, concedendo o espaço a iniciativa privada, e com o retorno da contratualização com a EBSERH na gestão dos HUs. Fora da Universidade, mas incidindo contra ela, reformas estão sendo feitas pelo Congresso em conluio com o governo Bolsonaro/generais. Direitos dos servidores foram retirados nas reformas trabalhista, previdenciária e, agora, na reforma administrativa. Muito cômodo para os senhores privatistas encontrarem a Universidade fechada com pouquíssimos espaços de interação entre seus componentes.
Não bastasse todas estas agressões aos direitos do povo de estudar, o distanciamento político a que a Universidade está sujeita é propício para passar “a boiada” do ensino a distância (EAD) e do ensino híbrido, políticas de rebaixamento do ensino e de barateamento de custos para os cofres públicos. Numa situação de restrição do governo federal para a contratação de novos professores, são soluções para manterem salas de aula virtuais numerosas juntando turmas e mantendo o contingente reduzido de professores.
Não é justificável e é perigoso esse distanciamento político. O povo brasileiro que está desde sempre, na sua maioria trabalhando e se expondo em transportes públicos lotados, nos desafia a ajudá-lo a enfrentar a pandemia e suas consequências sociais e políticas. Que papel temos como intelectuais, virar de costas para o povo ou nos ombrearmos com ele? Colocar nossos conhecimentos e disposição de luta, principalmente para com seus filhos, que recebemos para que se tornem profissionais indispensáveis a luta pela independência nacional da ciência e da tecnologia e para sua utilização servindo aos interesses da população? O fechamento das escolas e universidades cumpre importante papel na dispersão e desmobilização de um dos contingentes populacionais tradicionalmente cumpridores de um papel progressista na sociedade.
Sabemos trabalhar com risco e com manejo fino para ir tomando medidas convenientes a dinâmica sanitária, essa é a praia dos nossos cientistas. Se houver necessidade de isolamento social mais duro, este deve ser para todos e não somente para as universidades. Não estamos dizendo que o risco é zero. Estamos tomando a atitude correta de não deixar os nossos destinos nas mãos de Bolsonaro de seus generais, da mídia monopolista, de todos os reacionários que estão no poder e dos setores universitários recalcitrantes. É mudar a nossa forma de encarar o problema, nos tornando proativos das soluções. É deixar de lado uma postura passiva diante da realidade, do tipo, já que as condições que a universidade pública oferece não enfrentam adequadamente os riscos de contágio, fico em casa. Temos que pensar de outra forma: é preciso que a Universidade retome suas atividades presenciais, é preciso acordar coletivamente as condições deste retorno, exigir das reitorias e do MEC as condições adequadas. Não vamos compactuar com eles, restringindo de imediato nossas reivindicações em termos das garantias sanitárias que minimizem o risco pois temos conhecimento das dificuldades orçamentárias das universidades. Enfrentemos vigorosamente este problema, não nos adaptemos a ele. Avaliemos nossos ambientes de trabalho para garantir que as melhores medidas sejam implantadas de retorno, que seja gradual, conforme as especificidades locais.
O transporte público está lotado porque os estados e prefeituras deixaram os empresários gananciosos reduzirem as frotas de ônibus, trens e aumentarem o distanciamento entre os vagões do metrô? Todos os trabalhadores estão vivendo o problema. Juntemo-nos a esses para exigirmos mais transporte público circulante.
A Universidade deve estar aberta para permitir que a resistência a seu desmonte se organize. Fechar as Universidades sempre foi pauta da direita reacionária no país. Fechar as universidades públicas, de todo esses privatistas operadores de interesses do mercado empoleirados no Estado brasileiro. Que forças faz o MEC para reabrir as Universidades como tem feito o governo Bolsonaro/generais para reabrir os negócios? Nenhuma, o MEC quer implantar o ensino a distância redutor de custos.
É a sobrevivência da Universidade pública está em jogo. O MEC faz o passível para intervir na autonomia universitária. Estamos em guerra e não é virtual.
● Pelo retorno presencial das atividades didáticas no próximo semestre letivo (em geral,
novembro de 2021).
● Pela abertura imediata de espaços universitários sem aglomeração e com cuidados
higiênicos como as bibliotecas e laboratórios de Informática.
● Enfrentemos juntos os problemas decorrentes da pandemia, coloquemos a ciência a
serviço do povo e sua luta pela independência nacional e pelas liberdades democráticas. Mobilizemo-nos para exigir das Reitorias e do MEC todas as condições sanitárias necessárias para minimizar os riscos de contágio.
● Ocupar a Universidade para não entregar.
MARIA DE FÁTIMA SILIANSKY DE ANDREAZZI é professora associada, UFRJ.
Envie seu texto para mazola@tribunadaimprensalivre.com ou siro.darlan@tribunadaimprensalivre.com
MAZOLA
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