Redação –
O Senado aprovou nesta 5ª feira (17.jun.2021) o texto-base da MP (medida provisória) da capitalização da Eletrobras. Foram 42 votos a favor e 37 contra. Os 2 destaques apresentados, trechos votados separadamente, foram rejeitados e o texto agora segue para a Câmara dos Deputados. A proposta perde validade em 22 de junho.
O relator no Senado, Marcos Rogério (DEM-RO), fez acréscimos à proposta já aprovada pela Câmara. Seu 1º relatório foi protocolado às 17h50 de 4ª feira (16.jun).
A Eletrobras divulgou nota após votação da matéria com a manifestação do presidente da empresa, Rodrigo Limp, em que afirma que “a capitalização é fundamental para que a empresa volte a ter capacidade de investir”. Eis a íntegra (139KB)
Muitos senadores protestaram contra o pouco tempo que tiveram para analisar o texto proposto caso a votação fosse mantida para o mesmo dia. Pelo atraso, o parecer foi lido e a sessão suspensa.
Na manhã desta 5ª feira, Rogério apresentou uma nova versão de seu parecer sobre a MP. Já durante a sessão, o relator fez mais alterações oralmente.
Às 12h39, os senadores começaram a discutir a proposta. Ao longo da tarde, 38 congressistas usaram cerca de 5 minutos cada um para defender suas opiniões sobre o tema.
A medida desagradou tanto senadores tradicionalmente de oposição, quanto outros mais liberais na economia, que são normalmente favoráveis a privatizações.
O 1º a falar foi o líder do MDB, Eduardo Braga (MDB-AM), que defendeu as mudanças feitas pela Câmara e aprimoramentos feitos pelo relator do Senado. Ainda assim, ele deixou claro que a bancada emedebista, a maior da Casa, divergia e que os integrantes seriam liberados para votarem como quisessem.
“Não sou bolsonarista, não sou radical de direita, todos sabem disso, mas, presidente, é preciso dizer que este é o momento, sim, de nós podermos, finalmente, encontrar um caminho para gerar energia firme, confiável, recompor os nossos reservatórios, restabelecer investimentos no setor elétrico, voltar a gerar emprego e renda e poder dar competitividade a este país”, disse.
Já o senador Lasier Martins (Podemos-RS), que é tradicionalmente favorável à diminuição do Estado, foi contra a forma como foi feita a capitalização da Eletrobras. Vários congressistas questionaram a urgência do projeto para ser feito por uma MP, que tem força de lei, mas precisa do aval do Congresso em até 120 dias.
“Tem que ser retirada essa medida provisória. Ela está vindo para cá de afogadilho. A questão crucial se chama impactos. Quais são os impactos que essa desestatização vai causar? Isso precisa de um estudo aprofundado e nós não temos isso”, declarou Martins no plenário.
Senadores do Piauí e do Rio de Janeiro elogiaram as mudanças aceitas pelo relator do Senado, enquanto os da Bahia demonstraram ser opositores. Uma das críticas ao texto foi o excesso de adaptações feitas para contemplar necessidades locais.
Quem reclamou da MP também alertou para a falta de estudos sérios sobre os impactos tarifários das mudanças promovidas. Diversos senadores disseram que não eram contrários à capitalização em si, mas não concordavam com os trechos novos incluídos.
“Jabutis, que são nada mais do que reservas de mercado, criação de grupos de interesses, protegendo e sendo completamente opostos à sinalização, digamos, liberal ou privatizante, porque cada um criou o seu nicho, a sua reserva de mercado”, disse o líder da Minoria na Casa, Jean Paul Prates (PT-RN).
Às 16h45, a discussão foi encerrada e foram lidos os pedidos de destaques –votação em separado– apresentados. Três foram admitidos e serão votados depois da aprovação do texto-base. Na sequência os senadores aprovaram nominalmente os pressupostos constitucionais de uma medida provisória, como a urgência.
A oposição fez questão de pedir votação nominal, afirmando que não havia a urgência necessária para o tema ser votado como medida provisória. Os pressupostos constitucionais foram aprovados por 44 votos favoráveis a 35 contrários.
O Senador Cid Gomes (PDT-CE), ao avisar que gostaria da votação nominal, alertou que, se os pressupostos fossem aprovados, ele judicializaria a questão.
BANDEIRA DO GOVERNO
O que senadores criticaram em relação à pressa para aprovação da capitalização com tantas mudanças em relação ao texto enviado pelo Executivo é a necessidade de se mandar “um recado” ao mercado. Isso porque as privatizações são uma bandeira do governo de Jair Bolsonaro, mas até agora não deslancharam.
Bolsonaro disse na 4ª feira (16.jun) que, se a Eletrobras não for privatizada, poderá haver um “caos no sistema energético no Brasil”. Deu a declaração a um visitante do Palácio da Alvorada que pediu para o chefe do Executivo não apoiar a MP que capitaliza a empresa.
O governo entrou forte nas negociações na tarde desta 5ª feira, segundo apurou o Poder360. Ministros foram escalados para mudar a opinião de senadores contrários.
Os ministros da Casa Civil, Luiz Eduardo Ramos, da Secretaria de Governo, Flávia Arruda, e de Minas e Energia, Bento Albuquerque ligavam para os senadores para tentar convencê-los de que o projeto não traria prejuízos para os consumidores.
O texto estava longe de ter consenso e cada voto faria a diferença. Até o ex-presidente do Senado Davi Alcolumbre (DEM-AP) foi escalado para “virar votos” durante as discussões no plenário virtual.
Líderes contabilizavam uma vitória do governo por 2 votos às 16h30, com um placar favorável ao texto de 40 a 38 já considerando essa ofensiva governista em relação aos senadores contrários ou indecisos.
Cerca de um dia antes da votação, o Executivo ainda não tinha apoio suficiente para aprovar a proposta. Levantamento da BMJ Consultores Associados identificou 33 senadores contrários e 31 favoráveis à proposta. O posicionamento dos outros 17 permanecia indefinido.
A líder da bancada feminina no Senado, Simone Tebet (MDB-MS), disse em entrevista ao Poder360 que a MP desagradava a todos e que uma derrota do governo seria o começo do fim da administração Bolsonaro.
O secretário especial de Desestatização, Desinvestimento e Mercados do Ministério da Economia, Diogo Mac Cord, saiu em defesa do governo na 3ª feira (16.jun), dizendo que a “narrativa” de que a aprovação da MP da Eletrobras aumentará as tarifas de energia elétrica é “falsa”.
HISTÓRICO
A privatização da Eletrobras por meio de medida provisória já havia sido cogitada ainda no governo Temer, em 2017. À época, o governo estimava arrecadar R$ 7,7 bilhões com a venda da estatal. A MP, no entanto, não foi votada.
A privatização da Eletrobras por meio da MP ganhou sobrevida diante da dificuldade do governo Bolsonaro, em 2019, para conseguir apoio suficiente para aprovação do projeto de lei que trata do tema, o PL 5877/2019.
A MP 1031/2019 foi apresentada em 23 de fevereiro de 2021 e tinha em seu texto original 16 artigos que definiam como seria a capitalização da Eletrobras.
Em maio de 2021, entidades do setor elétrico afirmaram que o relatório estava desequilibrado. Isso porque o relator, Elmar Nascimento (DEM-BA), ameaçou propor que a Eletrobras deixasse de receber recursos de pagamento de indenização para transmissoras de energia elétrica, que seria uma contrapartida para a renovação antecipada de contratos feita em 2012. Eis a íntegra da nota das 40 entidades do setor elétrico.
O montante – da ordem de R$ 47 bilhões – seria repassado para a nova empresa a ser criada para gerir a Eletronuclear e a parte brasileira de Itaipu Binacional. Essa estatal seria responsável também pela construção de usinas térmicas que operam “na base” do sistema, ou seja, que quase nunca são desligadas e que serão abastecidas “preferencialmente” a gás natural.
Essa mudança no texto original, no entanto, não prosperou. O relator recuou e estabeleceu um acordo com as entidades para que o valor da dívida fosse direcionado à empresa privatizada (como desejava o mercado) e não mais para a parte que continuará estatal (como Itaipu e Eletronuclear).
O parecer de Elmar Nascimento também trouxe as seguintes alterações:
- descotização – em 10 anos será finalizado o sistema de cotas de produção e toda a geração da Eletrobras privatizada ficará independente;
- saldo de caixa de Itaipu – a hidrelétrica binacional tem uma sobra de até US$ 1 bilhão por ano. Esse dinheiro será dividido: 75% para a CDE (Conta de Desenvolvimento Energético) e 25% para programas sociais do governo;
- recuperação hidrológica – caberá ao Ministério do Desenvolvimento Regional, por meio de conselho gestor a ser criado, cuidar da aplicação de recursos para recuperar as bacias hidrográficas dos rios São Francisco e Parnaíba e dos reservatórios de Furnas;
- termelétricas a gás natural – o governo contratará 6.000 MW de energia da chamada reserva de capacidade diretamente de termelétricas movidas a gás natural (e não a óleo diesel). Essa entrega será realizada de 2026 a 2027. Essas usinas estarão localizadas nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste;
- gasodutos – a compra de energia de termelétricas a gás no interior implica no transporte desse insumo. Não há gasodutos. Mas o projeto permite incluir na tarifa dessa energia o custo da construção da infraestrutura necessária;
- Pequenas centrais hidrelétricas – o projeto garante a contratação de 2.000 MW de PCHs no período de 2021 a 2026;
- Demissões na Eletrobras – todos os trabalhadores demitidos até 1 ano depois da privatização terão o direito de converter o valor da sua rescisão em ações da nova empresa pelo valor equivalente ao de 5 dias antes da data da emissão da medida provisória.
As mudanças foram consideradas “jabutis” por deputados, senadores e associações defensoras da energia a óleo diesel. O principal argumento seria o aumento da tarifa de energia que as termelétricas a gás causariam. Seria necessário construir gasodutos. O valor seria pago pelos consumidores.
Após as acusações, setores defensores da termelétrica a gás e o Ministério de Minas e Energia apresentaram cálculos que mostram redução da tarifa de energia. Afirmam que o custo de produção é menor. Também dizem que o combustível é menos poluente.
As mudanças também reorganizam a divisão regional dos 6.000 MW que a União fica obrigada a contratar de termelétricas movidas a gás de 2026 a 2028.
MUDANÇAS DO SENADO
O relator no Senado, Marcos Rogério (DEM-RO), apresentou um novo parecer na manhã desta 5ª feira (17.jun), com mudanças pontuais que, segundo seu gabinete, visam fazer ajustes para não inviabilizar a capitalização da estatal. Uma das mudanças foram os volumes de energia do leilão de reserva de energia a serem entregues de 2026 a 2030:
- 1.000 MW para a Região Nordeste;
- 2.500 MW para a Região Norte;
- 2.500 MW para a Região Centro-Oeste;
- e 2.000 MW para a Região Sudeste.
As térmicas da região Nordeste deverão ser instaladas nas regiões metropolitanas dos Estados. Na região Norte, as térmicas deverão ser distribuídas nas capitais dos Estados ou região metropolitana em que seja viável a utilização das reservas provadas de gás natural nacional existentes na Região Amazônica. Já na região Centro-Oeste, as usinas deverão ser instaladas nas capitais dos Estados ou em regiões metropolitanas que não tenham ponto de suprimento de gás natural.
Dos 2.000 MW oferecidos ao Sudeste, 1.250 MW serão destinados aos Estados que têm ponto de suprimento de gás natural e 750 MW para Estados na área de influência da Sudene, sem ponto de suprimento de gás natural.
O novo parecer também garante a extensão do chamado “linhão” de Tucuruvi até Boa Vista, em Roraima. A mudança permite que o Estado faça parte do SIN (Sistema Interligado Nacional). A obra foi contratada por meio de leilão em 2011, com conclusão prevista em 2015, o que não ocorreu.
Diante do atraso da obra, a concessionária responsável pelo empreendimento acionou a Justiça, pedindo a rescisão do contrato. O linhão passa por terras do povo indígena Waimiri-Atroari, provocando discussões sobre os impactos ambientais da construção.
Fonte: Poder360
MAZOLA
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