Redação

O Brasil está em terceiro lugar no ranking mundial de maior número de pessoas encarceradas, com mais de 755 mil pessoas presas. Dessas, mais de 51% não concluiu o ensino fundamental e 15% não têm o ensino médio completo. Apesar da baixa escolaridade, somente 10,6% do total de pessoas encarceradas participam de atividades educacionais. Desses, 9,6% estavam envolvidos em atividades de educação formal e 1%, em atividades educacionais complementares, como leitura, esportes e cultura.

É o que mostra o estudo inédito Diagnóstico de práticas de educação não formal no sistema prisional do Brasil”elaborada pelo Grupo Educação nas Prisões, com objetivo de entender quais os entraves na promoção da educação em prisões.

Com a alteração da Lei de Execução Penal, foi estabelecida a redução de pena por estudo à proporção de 1 dia para cada 12 horas de estudo. Até então, apenas o trabalho poderia ser utilizado para a remição da pena. Mesmo assim, segundo a pesquisa, a atividade da leitura, nos últimos três anos, continua a representar apenas 1% dos dias remidos — o trabalho gera mais de 80% dos dias remidos e a educação formal, 17%.

A pesquisa revelou que existem diversos motivos que dificultam o reconhecimento e a promoção de atividades de leitura. Para chegar aos resultados, entre 16 de dezembro de 2020 e 14 de março de 2021, o grupo promoveu um questionário online para identificar os problemas enfrentados pelos projetos que atuam com leitura no sistema prisional.

Situação grave apontada pelas entidades foi quanto à censura de alguns livros, quando são os profissionais das unidades prisionais que determinam o acervo destinado às atividades de leitura que serão desenvolvidas. No estado de São Paulo, por exemplo, em 2020, o governo estadual vetou uma lista de livros selecionados por um projeto de remição pela leitura.

Outro problema do modelo atual revelada foi que a resenha escrita do livro é o único critério para conseguir remição por leitura. Alguns projetos consideraram esse critério inadequado, e 27,3% defendem que a participação nas rodas/clubes de leitura deveria contar para atestar compreensão e experimentação da obra e, na mesma proporção, os projetos disseram que a resenha não poderia ser o único instrumento para medir a compreensão da leitura.

Quanto à escolha dos participantes das atividades propostas pelas entidades que desempenham os projetos, em 76,9% dos casos a seleção é feita pelas unidades prisionais. Apenas 15,4% dos projetos estavam abertos para todos os interessados. Os movimentos apontam que a unidade prisional tende a selecionar pessoas com maior escolaridade ou bom comportamento. A maioria das respostas indicou que não havia participação de pessoas não alfabetizadas ou com dificuldades de leitura (28,6%), gerando a exclusão desse grupo do direito à educação nos presídios.

Na maioria dos casos, também não há políticas de inclusão de imigrantes, segundo 35,7% das respostas. Há poucos livros em outros idiomas, e mesmo quando esses estão disponíveis é difícil que sejam aceitas resenhas não escritas em português.

Resolução do CNJ
Tendo como base o diagnóstico elaborado pelo Grupo Educação nas Prisões, o Conselho Nacional de Justiça aprovou a Resolução 391, de 10 de maio de 2021, que estabelece procedimentos e diretrizes a serem observados pelo Poder Judiciário para o reconhecimento do direito à remição de pena por meio de práticas sociais educativas em unidades de privação de liberdade.

Com tal resolução, a remição por meio de atividades de educação não-formal deixa de ser uma recomendação e passa a ser um marco legal que deve ser seguido pelos 27 estados da federação e pela União.

A normativa determina a promoção de projetos de fomento e qualificação da leitura pelas unidades prisionais com ampla divulgação para as pessoas presas. Além disso, dá liberdade para que projetos de leitura e os alunos presos escolham as obras que serão tratadas nos clubes de leitura, evitando a censura. As equipes dos projetos também poderão definir os critérios de escolha das pessoas presas participantes.

As prisões devem se adequar a oferta de projetos para os diferentes níveis de letramento, alfabetização e escolarização e o Judiciário deve possibilitar que no lugar da resenha sejam aceitas outras formas de expressão, que podem atestar compreensão e experimentação da obra, e as regras de correção não devem ser rígidas.

A nova resolução define critérios em comum para concessão da remição que valem para todo Judiciário. As unidades prisionais devem ser mais transparentes quanto a destinação da atividade de leitura para fins de remição.

Assim, a regulamentação aprovada pelo CNJ avança na garantia do direito à educação com fins de remição da pena, ampliando esse direito para o campo da educação não-formal como leitura, esporte e cultura. Agora, o grupo passará a monitorar os estados para que se adequem à nova normativa.


Fonte: ConJur