Por Lincoln Penna

A relação dessas três palavras resume a existência da humanidade desde os tempos modernos. Karl Marx dizia em O Capital que o trabalho é o pai da riqueza material, em apoio ao que dissera William Petty, e a terra é a mãe. Concepção perfeita para explicar a história do ser humano.

Quanto ao capital, mais adiante ainda em sua obra mestre Marx dirá que o comércio e o mercado mundiais inauguram a história moderna do capital, isto a partir do século XVI, quando se exaure o feudalismo ou a chamada baixa Idade Média. Posto isso, examinemos o que se passa em nossas vidas nesse primeiro quinto do século XXI, tendo como foco o Brasil nessa trágica atualidade.

O trabalho como fonte, instrumento e energia produtiva, responsável pelo patrimônio criado em todos os campos pelo ser humano, encontra-se progressivamente submetido aos caprichos do capital. Afinal é este quem comanda os destinos de todos nós, desgraçadamente. O trabalho e seus direitos têm sido atingidos pela usura acumulativa dos que detêm os recursos de capital. Num país de fortíssima presença escravocrata, cujos vestígios são inúmeros, os esforços passados para dar dignidade à força de trabalho se encontram em fase de continuada degradação.

As políticas que têm levado à pauperização dos trabalhadores, o crescente desemprego com o fim de muitos ofícios, a perda por isso mesmo dos postos de trabalho, e os resultados das crises periódicas do capitalismo a atingir plenamente a massa de assalariados jogando-os ao desemprego, são resultados promovidos com requintes de uma perversa crueldade, no qual os valores dos investimentos falam mais alto do que o apoio a quem necessita de apoio, os que verdadeiramente criam riquezas.

Em paralelo com a desgraça de fazer crescer o contingente de desocupados a engrossar a população vulnerável sem trabalho e renda e entregues à própria sorte, a questão da terra e do acesso à moradia nos grandes centros urbanos confirmam a sensação de que estamos ingressando num mundo de desvarios sem fim. Mexe com o bom senso, agride a sensibilidade de quem ainda a tem, estimula com ardor a indignação prima irmã da revolta que com o tempo de maturação se transforma em ações contrárias à ordem que oprime o ser humano e faz pensar como é possível conviver por tanto tempo com essa situação.

A terra mãe, da qual se retira a subsistência de todos nós tem engordado os fartos meios de acumulação de capital. A reforma agrária que ao longo da história das lutas sociais no campo se buscava alcançar foi atravessada pelo apetite dos detentores de amplas glebas e pelos investidores de capital, se é que podemos considerar o agronegócio como reforma agrária, senão como a fomentar e internalizar o capitalismo no campo. Com isso se deu a ampliação de seus negócios e a produzir o nosso maior escândalo que é a fome de nosso povo sem terra. Cresceu o comércio das commodities agrícolas, vale dizer, a carne que o brasileiro não pode consumir de modo a dar satisfação aos investidores de capital nas bolsas de valores. Na mais completa realização do processo de financeirização da economia mundial.

Sem trabalho, sem terra, e com um governo que atua para manter viva essa dura realidade, não basta a indignação constante que tem se manifestado à boca pequena. Não se pode deixar explorar e sacrificar uma nação constituída por várias nações que vivem num território tão generoso sem que reajamos com inteligência, mas com determinação.

É preciso combater o mal tendo a clareza de que ele tem um responsável a conduzir uma política deliberada para manter intacta essa triste realidade. Seu nome é por demais conhecido e ele se encontra na presidência da República a cumprir um projeto que atende aos interesses de quem usufrui de toda a miserabilidade que o país desfruta nesse momento. Realidade a contrastar com o imenso potencial de uma terra capaz de permitir a mais linda e feliz civilização da face da terra, como insistia em dizer Darcy Ribeiro, o menestrel da brasilidade e o maior representante da tribo dos indignados, como gostava de ser visto.

Unamos o trabalho fértil, digno e criativo, com a terra a amparar como mãe que é e formemos uma sociedade justa, porquanto igualitária, generosa e que tenha na formação de uma cidadania voltada para a coletividade o objetivo constante de viver. Ou como disse o poeta Mário Quintana: “a arte de viver é simplesmente a arte de conviver.” É isso. Sem o outro nada somos.


LINCOLN DE ABREU PENNA – Doutor em História Social pela Universidade de São Paulo (USP); Conferencista Honorário do Real Gabinete Português de Leitura; Professor Aposentado da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ); Presidente do Movimento em Defesa da Economia Nacional (Modecon); Colunista e Membro do Conselho Consultivo do jornal Tribuna da Imprensa Livre.