Por Ricardo Cravo Albin –
“Os alimentos jogados ao lixo são roubados dos pobres. Tanto quanto a natureza destruída. A ecologia humana e a ecologia ambiental são inseparáveis.” (Papa Francisco)
Não bastassem todas as ações contraditórias, ou melhor, contraproducentes do Ministério do Meio Ambiente em relação à preservação do meio ambiente no Brasil, fatalidade que teve início desde o começo do governo Bolsonaro, a Câmara dos Deputados acabou de aprovar o projeto da Lei Geral de Licenciamento Ambiental. O nome pomposo esconde a pior das intenções, má-fé e enganação sob o argumento caviloso de “desburocratizar” o andamento dos pedidos de licenciamento e dar “segurança jurídica” aos investidores. O que acaba de ser aprovado foi um “liberou geral” na destruição do meio ambiente, cujas vítimas imediatas são os mais pobres e já desassistidos, como em especial as populações indígenas. Além, é claríssimo, a própria União, cujas terras são usurpadas desde sempre. As suspeições e inquietações, todos vemos agora, têm um cordão umbilical de compreensão facílima. Foi exatamente o Presidente da Câmara, escolhido a dedo por Bolsonaro, Dep. Artur Lira (PP-AL), que conferiu urgência à tramitação da proposta. Mas, em meio ao horror da nação e da cidadania ultrajada, nada menos que nove ex-ministros do Meio Ambiente lançaram veemente protesto contra ao que os ambientalistas chamam de “mãe de todas as boiadas” do Ministro Salles, que ainda é mantido no cargo, apesar de protestos nacionais e até internacionais pela reincidência de suspeições sem fim. Vale citar, neste abissal desalento, os nomes dos antigos ministros que não se calaram: Carlos Minc, Edson Duarte, Gustavo Krause, Izabella Teixeira, Jose Carlos Carvalho, José Goldemberg, José Sarney Filho, Marina Silva e Rubens Ricupero.
O texto aprovado, agora a caminho do Senado, aonde a luta da consciência cívica será acirrada ao que todos aguardamos, representa de fato uma tragédia, feitinha para a felicidade completa do errático Salles.
Chamo a atenção para as boiadas óbvias: o projeto acaba com a exigência de análise do impacto ambiental de empreendimentos, pondo em risco áreas de conservação e a biodiversidade. Entre os serviços dispensados, para obtenção de lucros absolutos (como no pior capitalismo selvagem do século XIX quando nações e empresários ambiciosos se lixavam com a defesa do bem comum), estão estações de tratamento de água e esgoto, melhoramento em instalações existentes, além de atividades rurais (destruição de florestas), como pecuária e cultivo agrícola. Ocorreu-me agorinha mesmo evocar frase de Mário Quintana, revestida de extrema verdade poética, “Nesses tempos de céus de cinzas e chumbos, nós precisamos de árvores desesperadamente verdes”.
O malsinado projeto tem a petulância de prever uma “licença auto declaratória”, chamada perfidamente de Licença por Adesão e Compromisso (LAC), com renovação automática, acreditem, pela internet. A princípio, a famigerada LAC seria destinada a projetos de baixo impacto e pequeno porte, mas é tudo muito vago, além de permeável à má-fé quase certeira dos empreendimentos. Até porque tudo poderá ser feito com óbvio desprezo a desmatamento e grilagem. A boiada também permite ampliar hidrelétricas sem os cuidados ambientais, como ocorreu em Balbina, Santo Antônio e Belo Monte.
E a boiada é engordada a cada capítulo do projeto-catástrofe, ao permitir a estados e municípios regras próprias de licenciamento, paráfrase da pulverização definitiva da legislação federal, laboriosamente aperfeiçoada ao longo de décadas a fio de lutas e idealismo, desde os tempos heroicos de Candido Rondon. Há um artigo, mais enfático que os demais, que incentiva disputa entre governadores e prefeitos para atrair investimentos e abrir portas para a judicialização, isentando-os até de tributações existentes.
Todos os ambientalistas, todas as pessoas que têm um mínimo de atenção ao honrado, ao certo, todas as pessoas que sabem até onde a má-fé campeia na grilagem, nas terras e nas florestas desde Pedro Álvares Cabral, estamos certos de que o resultado previsível será a degradação ambiental.
Cem entre cem defensores do meio ambiente ouvidos no Brasil e até na ONU consideram sem meias palavras que esta mãe de todas as boiadas prejudicará a economia e até a política brasileiras ante aos olhos e à solidariedade mundial.
A quem recorrer? Será que vale gritar por socorro ao Presidente da República como era usual antigamente? De fato, só ao Capitão cabe defenestrar o enviesado Ministro do Meio Ambiente.
Mas sem nos esquecermos de que o cerco ao Senado passa a ser motivo de salvação dos recursos naturais de país agredidos pela Câmara com tal nível de desprezo ao futuro do próprio país.
“O bom relacionamento entre a Terra e os Homens foi quebrado. A Igreja deve agora introduzir o pecado contra o meio ambiente, o pecado ecológico”. (Papa Francisco).
RICARDO CRAVO ALBIN – Jornalista, Escritor, Radialista, Pesquisador, Musicólogo, Historiador de MPB, Presidente do PEN Clube do Brasil, Presidente do Instituto Cultural Cravo Albin, Colunista e Membro do Conselho Consultivo do jornal Tribuna da Imprensa Livre.
MAZOLA
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