Por José Macedo

Recentemente, assisti um vídeo sobre gangsterismo, o que seria, hoje, o crime organizado. Como já conhecia a história do gângster Al Capone, gostei de seu enredo, significado e inclusão de vertentes sociais, econômicas, políticas e jurídicas.

Estive, por duas vezes, em frente da casa do Al Capone, em Chicago. A minha ida ao local foi motivada por curiosidade de um brasileiro, conhecedor de nossa história e da história do banditismo. O Brasil tem sido, ao longo de seus mais de 500 anos, um campo fértil para as organizações criminosas, nos diversos segmentos da existência dos brasileiros.
A história dos criminosos têm em comum: o extermínio do inimigo e o acesso, direto ou indireto, ao poder, seja por meio do dinheiro (corrupção), por vaidade, domínio político ou dominação de seus adversários. Todo bandido conta com a flexibilidade das leis e impunidade, a lentidão da Justiça, bem como, a facilidade e parceria com o poder político e comprovada promiscuidade. O tempo, o espaço, os personagens e a forma, mesmo sendo outros, as organizações criminosas são poderosas e perpetuam-se.

As décadas de “20” e “30”, do Al Capone, têm suas diferenças com relação aos tempos atuais, obviamente. No caso concreto, neste texto, exemplifico e dou ênfase ao Brasil e ao momento do governo Bolsonaro, com sua conhecida proteção às milícias, denúncias em face dos filhos, super faturamentos, caso Queiroz, entre outros supostos malfeitos.

Através da história mundial poderia descrever uma relação extensa de famosos gangsters, daqueles chamados de sociais, cruéis e mórbidos.

No Brasil, a figura do cangaceiro Lampião, classifico-o como um misto de social, que se fez de criminoso cruel, considerando os meios que utilizou para a prática do exercício arbitrário das próprias razões (praticar a justiça com as próprias mãos). Em sua época era possível o acesso à Justiça? Era possível obter uma prestação jurisdicional justa? Essas questões pedem nossa reflexão. Lampião, simplesmente, foi alimentado pelo ódio e vingança, considerando obstáculos de acesso e ausência de justiça. O tempo de Lampião, no Nordeste brasileiro, coincidiu com o tempo de Al Capone, cujas motivações para a prática do crime fora especificas, próprias de contumaz criminoso. Lampião distingue-se do bandido e gangster ítalo-americano. As motivações de Lampião são sociais, pessoais, ocorridas no Nordeste, uma Região abandonada e miserável, espaço fértil, prenhe de injustiças e ainda, teve a vingança como leit-motiv, pano de fundo e causas principais. Porém, Lampião teve suas características específicas, foi, antes de tudo, um cangaceiro, não um mero criminoso.

Permito-me indicar o livro “Banditismo”, do historiador, Eric Hobsbawm. Assim, é a história do homem ou parte dela: o ódio, a vingança, o enriquecimento sem causa, a impunidade, a luta pelo poder, facilidades pela corrupção, a eliminação do outro, seu inimigo.

Os métodos pela eliminação do outro mudam, sofisticam-se, no tempo e no espaço. Em 1931, deu-se a prisão de Al Capone, por sonegação fiscal, após, as autoridades constatarem seguidos crimes fiscais, gerando enriquecimento sem causa e ilícito. No Brasil, os desvios do dinheiro, praticados por agentes públicos e privados encontram campo favorável para a prática desses crimes e para enriquecimentos suspeitos, função do conluio político e das autoridades fiscais com quadrilhas ou organizações criminosas.

Esses sofisticados criminosos, de hoje, são favorecidos por benesses e flexibilidade do Ordenamento jurídico, terminam, ao final, com certificado de probos. Assim, pouco importa a indignação da opinião pública e sentimento de insegurança. O resultado, em decorrência do tempo e o amortecimento dos fatos, das provas e sumiço das testemunhas, geram a sensação de que o crime compensa. Esses crimes perdem-se, prescrevem pelo tempo, até porque, a lentidão da justiça beneficia o criminoso, cujas provas nada mais servem para sua condenação. O resultado alcança descrença e insegurança do Direito, sendo seu fracasso.

Posso afirmar, sem receio de erro, se nosso Ordenamento Jurídico e nossas leis fossem nos USA à época do Al Capone, o gangster jamais seria preso, estaria aposentado, muito menos estaria no rol dos condenados.

Então, as benesses legais do legislativo e do executivo favoráveis ao criminoso sonegador, terminam fazendo-o de probo, de honrado cidadão, cumpridor de suas obrigações tributárias e legais. Exemplo: desde criança, com naturalidade, víamos o jogo do bicho, nas praças e até, em frente às delegacias. Os senhores donos desses jogos, declarados ilegais, sempre, foram tratados com respeito e distinção, incluindo, pelos detentores e ocupantes de mandatos eletivos e por agentes da Lei. Os métodos modificam-se, os objetivos são os mesmos, ou seja, o enriquecimento sem causa, não importando se as práticas são criminosas.

Nos dias de hoje, quem não ouviu falar das chamadas “rachadinhas” e de outras falcatruas de políticos, envolvimento com agências de financiamentos públicos, autoridades fiscais e empresas privadas? Assim, desviar recursos públicos, burlar o fisco através de métodos sofisticados são práticas conhecidas e corriqueiras, que prosperam, porque encontram do lado das autoridades a necessária leniência para repetidas práticas. Só para fortalecer nosso texto: político, que ocupa ou ocupou elevado cargo na administração pública, depositar milhões em paraísos fiscais, sem declaração no Imposto de Renda, um deputado, em seu primeiro mandato na Câmara Federal, adquirir uma mansão por R$ 6.000.000,00 (seis milhões de Reais), sem que comprove a origem deste valor? Os recursos desse deputado originam-se dos rendimentos de deputado e de uma sociedade em uma loja de chocolate.

Para não cometermos injustiça, seu pai era um aposentado como tenente do exército, após a baixa, promovido a capitão. Ainda: é sabido, que esse deputado, pagou grande parte do preço dessa mansão em espécie e é proprietário de mais de uma dezena de imóveis. Com certeza, os fatos criminosos são uma constância na história do Brasil, basta ler. Nesse contexto, não consigo chamar Lampião de criminoso comum ou de gangster. Eu o absolveria. Assim, gravita a vida de todos nós nesse cipoal de crimes e de injustiças.

“Eremildo” (Élio Gaspari), o idiota, ingênuo e tolo, começa a ter desconfiança, mas insiste em acreditar no governo Bolsonaro e de que seus filhos não se enriquecem ilicitamente. Para não esquecer: estamos, no ano de 2021!


JOSÉ MACEDO – Advogado, economista, jornalista e colunista do jornal Tribuna da Imprensa Livre.