Redação –
Entidades e especialistas da saúde se dividem sobre a nomeação do oncologista e empresário Nelson Teich para o Ministério da Saúde no lugar de Luiz Henrique Mandetta. Infectologistas e especialistas em pandemia veem com desconfiança “alinhamento total” do novo ministro com Bolsonaro, enquanto apoiadores defendem as habilidades de negociação do oncologista.
Cláudio Maierovitch, médico sanitarista da Fundação Oswaldo Cruz e ex-diretor da Anvisa e Ministério da Saúde, trabalhou com Teich na Secretaria de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos (SCTIE) do Ministério. Por quatro meses, o novo ministro assessorou a pasta em questões sobre tecnologias aplicadas à saúde.
ALINHAMENTO COMPLETO – Apesar de destacar a experiência e conhecimento técnico de Teich, Maierovitch e seus colegas demonstram preocupação com o autoproclamado “alinhamento completo” de Teich a Bolsonaro, que possui discurso notadamente contrário a medidas de isolamento para deter a pandemia.
— O ministro chega para cumprir um roteiro que já está pré-definido. A postura do presidente tem sido o oposto do que esperamos num momento de tanta preocupação e tristeza. O governo não tolerou conviver com a orientação técnica sobre a pandemia durante a gestão de Mandetta. Sua saída é um sinal claro do governo de que uma mensagem diferente daquela dada pelo Presidente não é considerada aceitável — avalia.
A expectativa do especialista em medicina preventiva e epidemiologia é de enfraquecimento da atuação do Ministério nas próximas semanas.
CONVENCER BOLSONARO? — “Espera-se um enfraquecimento da tomada de medidas baseadas no conhecimento científico. Essa não é a perspectiva do presidente, e por isso é pouco provável que prevaleça — afirma o médico — Mas a esperança é que, dado que é uma pessoa preparada e que tem longa experiência, ainda que não seja na área de saúde pública, o ministro vá insistir na importância da ciência e consiga convencer o próprio presidente a se inclinar para esse lado. Estamos ainda no começo do problema – diz Maierovitch.
Além de infectologistas, enfermeiros paulistas, representados pelo Conselho Regional de Enfermagem de São Paulo (Coren-SP), também manifestaram-se contra a transição. Em nota, a entidade “avalia como negativa a demissão do Ministro da Saúde Luiz Henrique Mandetta, por considerar que a mudança no comando da pasta pode gerar instabilidade em um momento de pandemia, que exige foco e união de esforços. Além disso, é fundamental que o Ministério da Saúde seja um incentivador das políticas de isolamento social”.
DESMONTE DO SUS – Estudantes de medicina, representados pelo Direção Executiva Nacional dos Estudantes de Medicina (Denem), relacionam a entrada do novo gestor com um “desmonte do SUS intensificado durante o governo de Bolsonaro”:
— Ainda que tenha momentaneamente se afastado da empresa a que era vinculado, Teich é empresário da saúde e tem, obviamente, interesse no avanço do capital privado na área da saúde, através do fortalecimento do setor suplementar. Além de não ter experiência com saúde pública — critica a diretora nacional da Denem, Eduarda Matoso.
BARRADOS NA POSSE – Nesta sexta-feira, representantes do Conselho Nacional de Secretários de Saúde (CONASS) e Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde (CONASEMS) foram barrados na entrada da cerimônia de posse de Nelson Teich como o novo ministro da Saúde. A situação gerou mal-estar entre o novo ministro e as entidades.
O presidente do CONASS, Alberto Beltrame, divulgou nota avaliando como “grave” a ausência das duas entidades na cerimônia. Beltrame, que está com Covid-19, mandou um representante para a cerimônia. Segundo o Ministério, o convite para o presidente da entidade não era transferível para terceiros.
“O Ministro Teich apresentou formalmente pedido de desculpas ao Conass pelo ocorrido”, divulgou Beltrame em nota, à tarde, após ligação oficial do novo titular da pasta.
APOIO DE ONCOLOGISTAS – Nelson Teich, no entanto, recebeu manifestações de apoio da Sociedade Brasileira de Oncologia Clínica (SBOC), a principal entidade da área médica em que Teich é especialista.
A entidade, que defende a manutenção do isolamento, espera que o ministro siga as diretrizes técnicas que vinham pautando a gestão de seu antecessor.
— Apesar de tudo ainda estar muito embrionário, ele deixou claro que não haverá uma ruptura brusca com a política de isolamento horizontal, o que nos dá conforto. Também traz a perspectiva de trabalharmos com mais informação, que será fundamental na hora de começarmos a retomar as atividades da sociedade — conclui Nogueira.
Fonte: O Globo
MAZOLA
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