Por Lincoln Penna

O trabalho é a essência da vida.

O dia 1º de Maio consagrado aos esforços empreendidos por homens e mulheres ao longo do tempo deve ser sempre comemorado em qualquer circunstância, porque evoca as grandes conquistas alcançadas, e com isso resgata a autoestima do povo trabalhador.

Nada se faz sem trabalho. Nada que desfrutamos existe senão pelo trabalho cujos resultados foram realizados pelo trabalho. As conquistas e o bem-estar que alcançamos foram produtos de trabalho de nossos semelhantes a nos proporcionar melhores condições de vida. É, portanto, do trabalho e com o trabalho que nos diferenciamos de muitas outras espécies animais. E essas diferenças ocorrem porque modificamos os meios pelos quais produzimos a nossa subsistência.

E esses meios no âmbito de nossa relação com a natureza criaram inúmeras possibilidades de atendimento às crescentes necessidades, só que as formas de apropriação desses mecanismos criados para nos dar satisfação foram apropriados e acarretaram concentrações de poder, e a exploração de muitos seres humanos submetidos a esses poderes. Em outras palavras, a divisão em classes sociais submeteu a grande maioria e tornou o trabalho cruel.

Surgem, então, com as sociedades de classes, formas de associação do trabalho com exploração, que vai da escravidão, servidão e assalariamento que levaram à exclusão de parcelas numerosas de seres humanos das condições mínimas de vida. Em todas essas formas está presente a transformação do trabalho em proveito de interesses particulares, na mais odiosa manifestação de desprezo pelo esforço daqueles que se encontram subjugados pelos sistemas que produzem as injustiças sociais.

Não é por outra razão que os trabalhadores reunidos em grandes unidades de produção, sobretudo a partir da Revolução Industrial que consolidou mundialmente o Modo de Produção Capitalista, têm vinculado suas reivindicações ao combate às injustiças sociais. À maneira pela qual os patrões lançam mão das forças de trabalho para seu mais exclusivo usufruto através da esplêndida observação de Karl Marx segundo a qual eles, patrões, extraem a mais-valia de seus trabalhadores, isto é, o tempo de trabalho não pago.

Hoje em dia ocorre a forma mais sofisticada de acumulação de riqueza, sempre extraída do trabalho.

Trata-se das operações de aplicação de capital que tem ampliado a renda de bilionários em troca de miúdas rentabilidades aos pequenos aplicadores no sistema bancário. Com isso proporciona a ilusão de ganho à classe média em busca de melhoria de seu padrão de vida. O mercado hoje é a fonte de concentração de renda substituindo com vantagem as indústrias e desempregando em massa num mundo do trabalho cada vez mais precarizado.

Se o Dia do Trabalhador é dia de luta, mesmo que contida em face dos tempos de pandemia em que vivemos, é também e deve ser dia de reflexão para a simples realidade a apontar que sem o esforço do ser humano não há vida capaz de nos satisfazer. É um truísmo, sem dúvida, mas por vezes a imensa ignorância que nos ronda permite que dele façamos uso para enxergarmos o que é óbvio.

A greve mundial que um dia lideranças anarquistas cogitaram nos seus sonhos deslumbrantes de construção de uma sociedade libertária foi um grito de vida. Sem dignidade para todos, os seres humanos são incapazes de viver em condições de proporcionar vida plena a todos. Esse grito foi combatido por muitas tendências no mundo do trabalho em razão de sua difícil realização, em um mundo à época cuja integração em todos os níveis era precária a impedir a articulação e mobilizações necessárias das massas trabalhadoras em busca de seus legítimos direitos.

Experimentar formas audaciosas com resultados pouco prováveis pode não ser realmente o caminho, mas permanecer na mera constatação da existência da exploração também nada acrescenta senão o aumento da indignação. É preciso que se aja com sabedoria, inteligência e determinação, para que construamos o caminho da emancipação verdadeira do trabalho, como bem da humanidade e realização de todos os que criam as riquezas como patrimônio de nossa história.

Mas não deixemos de criar os sonhos a acalentar cenários futuros de modo que o Dia dos Trabalhadores seja festejado como o momento de congraçamento da fraternidade universal. Aos céticos, a lembrança de como fomos capazes de enfrentar e vencer tantos desafios que pareciam irremovíveis. E aos que não abandonam a luta, a certeza de que a única luta que se perde é aquela que se abandona.


LINCOLN DE ABREU PENNA – Doutor em História Social pela Universidade de São Paulo (USP); Conferencista Honorário do Real Gabinete Português de Leitura; Professor Aposentado da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ); Presidente do Movimento em Defesa da Economia Nacional (Modecon); Colunista e Membro do Conselho Consultivo do jornal Tribuna da Imprensa Livre.