Por Miranda Sá

“Está comigo, está perdido comigo o teu nome, em alguma gaveta” (Ferreira Gullar)

Encontrei outro dia uma historieta interessante que ilustra a música popular brasileira, fora dos padrões impostos pela meia dúzia de três ou quatro que assumiu o seu domínio em favor dos mesmos de sempre. Passou-se com o excelente compositor e letrista Pedro Caetano, ainda na memória dos que gostam da boa música.

Conta-se que ele estava numa festa quando uma garota lhe pediu que fizesse um samba para ela. Encantado pelo sorriso e a graça do brotinho perguntou-lhe pelo seu nome, que era Maria Madalena de Assunção Pereira.

Sou tão musical e perfeitamente metrificado, que ele pegou o violão e iniciou os primeiros versos: – “Maria Madalena de Assunção Pereira / teu beijo tem aroma de botões de laranjeira”… O cantor Cyro Monteiro ouvindo, pediu para gravar o samba e no sábado seguinte lançou-o no Programa de César Ladeira, na Rádio Mayrink Veiga, com retumbante sucesso.

Quando foram gravar o disco, a censura proibiu-o alegando que o nome completo feria a privacidade da pessoa. Então Pedro Caetano e Cyro Monteiro ouviram a sugestão de César Ladeira substituindo o nome por Maria Madalena “dos Anzóis” Pereira…

Assim um nome arranjado entrou no folclore para designar pessoa desconhecida ou que não se quer nominar.

No suceder das gerações vê-se como os nomes próprios pessoais saem e voltam à moda. Eu sou um exemplo disto: Com sessenta anos, caminhava pela Praia de Ponta Negra, em Natal, ouvi uma voz gritando “Henrique! ”; era uma jovem mãe chamando o filho pelo meu nome de infância e juventude, que para mim ele tinha ficado fora de uso.

Nunca mais ouvi os nomes das meninas dos meus tempos de colégio, Alice, Bernadete, Dejanira, Leda, Margarida, Marli… Nem dos meus colegas Ademar, Bento, Hipólito, Honório, Sebastião, Ubirajara.

Há uma lenda em torno do nome Cristóvão, esquecida. Ele era um jovem desobediente às regras sociais, andante sem destino, que foi castigado a transladar pessoas de uma margem para outra num rio. Descansava um dia, quando ouviu uma voz infantil pedindo-lhe ajuda para atravessar a corrente. Era um menino franzino que lhe deu pena e levou-o sobre os ombros para o outro lado.

Estranhou que a criança pesasse demasiado, inusitadamente, quando ouviu dela: – “Pelo teu nome, transportastes sobre as águas Aquele que pelo sacrifício livrou-te dos pecados”. Foi assim que Cristóvão ficou sabendo que o seu nome quer dizer “portador do Cristo”.

Houve uma época em que eu, nacionalista extremado, estranhava que a política brasileira fosse dominada por pessoas de sobrenome estrangeiro, italianos, na sua maioria, havendo também muitos libaneses, sírios, turcos, espanhóis, judeus e japoneses. Apareceram depois, cheios de letras dobradas, dáblios, ipsilones, russos e até búlgaros…

Eu devia ter aprendido com Oscar Wilde que “a experiência é o nome que damos aos nossos erros”. Errei por pura besteira na xenofobia patronímica, porque nenhum dos descendentes dos emigrantes que ajudaram a levantar o Brasil é melhor ou pior do que os Barros, os Calheiro, os Carvalho, os Costa, os Queiroz, os Rego, os Ribamar e os Silva…

Apesar do nepotismo surfar nas ondas do favoritismo e dos privilégios, não é o nome que faz o político, como fez com São Cristóvão, o protetor dos condutores e motoristas, santo venerado por católicos romanos, ortodoxos e como Xangô, um poderoso orixá da Umbanda.

Faz bem o judaísmo que não reconhece e evita falar o nome de Deus. Os que não sabem, dizem que é Jeová, mas este nome, entretanto, é usado somente por algumas denominações evangélicas.